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As criptomoedas são complicadas demais para o grande público?

Tempo de Leitura: 5 minutos

Criptomoedas. Hoje em dia é difícil estar numa festa que alguém não saiba o que são. Em verdade, em algumas empresas e em alguns ramos de negócio, não as conhecer é ficar muito atrás de sua concorrência. 

Holding, smart contracts, de-fi, game-fi, farming, inúmeras são as suas aplicações e os ecossistemas que guardam essas inovações são ecossistemas bilionários.

Ainda assim, uma crítica comum realizada até mesmo por seus usuários e principais defensores é sobre a ausência de usabilidade geral. 

O argumento é algo como:

“Se uma ferramenta X exige o conhecimento específico Y para ser usado, não é possível a A que não conhece Y que use X

Fulano não conhece Y portanto não pode usar X 

Fulano é um indivíduo médio, seus conhecimentos são conhecimentos médios portanto é razoável dizer que a média das pessoas não poderá usar X. 

A média das pessoas é a melhor representação da maioria. 

Se a maioria das pessoas não souber Y, a maioria das pessoas não usará X. 

Se a maioria das pessoas não usar X, a adoção de X não será bem sucedida.

As criptomoedas exigem um conhecimento específico Y para serem usadas. 

Os indivíduos médios não possuem o conhecimento Y. 

A média é a melhor representação da maioria. 

Se a maioria das pessoas não souber Y, a maioria das pessoas não usará criptomoedas. 

Se a maioria das pessoas não usar criptomoedas, a adoção de criptomoedas não será bem sucedida.”

Esse argumento tem uma falha estrutural importante. Essa falha está centrada numa ampliação necessária para a compreensão real do que significa “saber usar X”. Enquanto é verdade que a média das pessoas não tem o conhecimento Y para usar X, é verdade que a média das pessoas não tem o conhecimento necessário para usar (em ao menos alguns sentidos) diversas coisas que de fato vem a usar.

Pense no seu banco pessoal, já refletiu quanta programação é necessária para fazer uma simples transação? Ou viu o quão manual é o sistema bancário visto sob a perspectiva de um bancário? 

Isso acontece porque com o desenvolvimento do Design UX nós passamos a conseguir utilizar, ao menos do ponto de vista do usuário final, uma interface em que o conhecimento Y é substituído graficamente pelo conhecimento Y’. 

É assim que conseguimos fazer transações bancárias com facilidade hoje, um mundo de gente está preocupado em ter o conhecimento Y1, Y2 e Y3 para possibilitar que o usuário final possa conhecer tão somente Y’ e ainda assim alcançar o mesmo resultado. 

E Y’ é tal qual qualquer outro conhecimento acessível ao indivíduo médio. Afinal, todo conceito pode ser reduzido a expressões menores, como um carro que pode ser reduzido nas suas rodas e na sua carroceria e nas rodas e na carroceria que podem ser reduzidos a formas geométricas e matéria prima. É sempre possível regredir o conhecimento até as partes dele que são acessíveis a todos. 

Mas, quais são os incentivos que fazem com que alguém queira criar o conhecimento Y’? 

O Papel da Elite e o Papel do Miserável

Se por um lado é verdade que a elite a qualquer momento possui acesso a um mundo diverso tão significativamente expressivo que se diz que para viajar no tempo é só viajar de um país de primeiro mundo para um país de terceiro, por outro é verdade que o mundo da elite é um mundo de teste.Teste? Sim, teste. 

Tome a ideia da Pirâmide de Maslow, ela descreve a existência de uma progressão racional entre as necessidades, avançamos das necessidades imediatas, cotidianas e constantes como as necessidades fisiológicas (comer, ir ao banheiro, dormir) para as necessidades mais amplas como as necessidades sociais. 

Um sujeito que esteja sem dormir por muito tempo não conseguirá satisfazer necessidades sociais, essa necessidade é de um grau de urgência bem mais afastado do que dormir. Mas, conforme vamos ajeitando as necessidades mais básicas, conforme vamos comprando os itens mais simples, conforme vamos avançando na pirâmide, conseguimos conceber necessidades mais específicas e nessas necessidades é que encontramos coisas como as criptomoedas. 

Veja que eu não estou dizendo que o dinheiro é uma necessidade de segunda ordem, mas afirmando que, do ponto de vista do sujeito simples, se precisamos lidar com o superar da incerteza alimentar, da incerteza de se teremos um prato de comida na próxima refeição, não parece que teremos muitas reflexões sobre o status atual do nosso patrimônio.

Veja que é óbvio que isso pode mudar e em dado conjunto de lugares termos uma situação econômica tão complexa que os indivíduos sintam que se não saírem da moeda local irão padecer de fome, mas parece que a maior parte dos países e a maior parte das condições objetivas de riqueza estão inseridos em países onde a população ainda possui um certo grau de qualidade de vida, ao menos o suficiente pra não fugir do sistema como um todo, mas insuficiente para garantir a possibilidade de “assumir os riscos” de usar as criptomoedas. 

Parece claro que dois são os grupos centrais que usarão as criptomoedas em seu primeiro momento, os que não dependem dela de forma alguma e os que suas próprias vidas dependem delas. O meio termo, a maioria, o homem médio, não usará isso no primeiro momento. Mas, enquanto isso é verdade, os grupos que estão propensos a usar as moedas nesses primeiros momentos são grupos que estão dispostos a adquirir o conhecimento Y, mesmo que o custo para tal seja alto, seja por terem uma rede de estudos prévios maiores, como é o caso da elite, ou por terem uma necessidade de vida e morte de aprenderem, como é o caso dos que precisam desesperadamente fugir do sistema. 

O usuário do meio precisará ser alcançado em algum momento, mas como? Existem duas formas disso acontecer. A primeira é por meio da expansão da miséria. Se a miséria se expande tanto que a sociedade como um todo precisa do conhecimento Y, a sociedade irá atrás de adquirir o conhecimento Y e pessoas vendo na possibilidade de ensinar Y uma forma de lucro irão incentivar e propagar o conhecimento de Y, 

A segunda é por meio do copiar da elite. Muitas vezes nós enxergamos experimentos realizados pelas elites nas suas próprias casas e esses experimentos são considerados socialmente proveitosos, pelo próprio propagar da linguagem até que isso chegue até a sociedade como um todo. É assim que produtos que começam com as elites se consolidam, pelo relato oral e pela expansão de escala da produção desse produto. 

Para ilustrar, pense numa Air Fryer que apenas alguns anos atrás era caríssima e dificílima de comprar e hoje se tornou algo corriqueiro e vendido a preços muito mais próximos do grande público. Da mesma forma, na medida em que as fortunas relacionadas a criptomoedas se expandem, se expande também a curiosidade sobre as criptomoedas, criando um reforço positivo para a adesão em massa. 

Os facilitadores 

Seja lá qual seja a forma que a sociedade tome, pela adoção através da expansão da riqueza ou pela expansão da miséria, existem incentivos fortes para que indivíduos, empresas e comunidades inteiras se levantem para instruir, apoiar e incentivar o uso das criptomoedas. 

Nesses indivíduos, podemos ter uma de duas características, as duas extremamente importantes na sociedade: a compaixão com a miséria e a ambição típica das inovações. Aqueles que, imbuídos dessas virtudes, intercedem nesse processo criam as pontes necessárias para conectar a média da população a um mundo financeiramente mais livre.

Essa ideia é simples, extremamente simples. Mas, possui uma harmonia única com a necessidade da adesão. Se indivíduos o suficiente estiverem inseridos na blockchain, consegue-se expandir o mundo de testes que traz conforto aos ricos e o mundo de fuga que traz conforto aos sobreviventes para um mundo comum, onde os indivíduos reconhecem no seu cotidiano os benefícios dos grupos que forçosamente aprenderam Y.

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