Este texto é parte do livro O Alvorecer da Liberdade, disponibilizado para download gratuitamente neste link.
TEORIA JURÍDICA
No que tange a justiça em uma sociedade livre, esta seria tratada como qualquer outro serviço, fornecida pelo mercado, estando sempre submetida à lei de propriedade privada, tendo como função manutenção dos contratos e resguardar a propriedade privada.
DEVIDO PROCESSO LEGAL
O devido processo legal trata de uma série de normas a serem seguidas, punir qualquer indivíduo sem seguir todos os critérios é uma ação ilegítima. Em um sistema de estado, o devido processo legal prevê que ninguém pode ser punido antes de seu julgamento, em alguns casos indo além, como por exemplo somente depois de dois ou três julgamentos… Obviamente ele exige que não se pode privar nenhuma das partes do seu direito de fala, e que sempre que uma parte apresentar um argumento, a outra deve poder retrucá-lo.
Outro critério apresentado é de que a decisão nunca pode ser monopolizada somente por um juiz, sendo assim, o indivíduo julgado sempre deve poder recorrer a 2° instância, além de nenhuma das partes poderem escolher o juiz que fará qualquer um dos julgamentos. O leitor atento deve notar que, excluindo o último ponto, que garante que nenhuma das partes possam escolher o juiz, o sistema de justiça privada pode atender todos os requisitos, isso mostra mais uma vez como o estado sequer é necessário para executar as questões mais basilares de uma sociedade.
A grande diferença de um sistema de justiça privada dentro da questão do devido processo legal é seu último critério, pois em um sistema libertário, ambas as partes teriam de entrar em acordo sobre qual juiz deveria julgar o caso em questão.
O ESTOPPEL
Escrito por Stephan Kinsella, e que pode ser considerado uma complementação da Ética Argumentativa escrita por Hans Hermann-Hoppe, ambas derivadas jusracionalmente, tem como base a common law, e é semelhante a Lei de Talião, mas verdadeiramente fundamentada. A Lei de Talião consiste basicamente na reciprocidade da relação com crime e pena, a lei diz que o criminoso deveria ser punido em mesma ou semelhante medida ao dano causado pelo mesmo, e que o executor da punição deveria ser a vítima, a parte lesada. A lei é popularmente conhecida pela famosa expressão popular: “olho por olho, dente por dente”, o objetivo da lei era balancear juridicamente as ações dentro de uma sociedade.
Com o fim de balancear juridicamente as ações dentro de uma sociedade, evitando violência descontrolada e possivelmente seu próprio fim, tal lei, embora tenha cumprido bem seu papel em um contexto primitivo, é incompleta. Podemos observar isso na seguinte situação:
Imagine que uma mulher pouco dotada de beleza quebre uma garrafa de vidro, e então ataque uma jovem modelo a início de carreira. Veja, a modelo depende de sua boa aparência para seguir sua profissão, já a agressora, se meramente tiver seu rosto cortado, sofrerá muito menos prejuízo, logo não seria justo simplesmente “dar o troco na mesma moeda”, pois além de não representar qualquer “equidade”, de nada beneficiaria, senão momentaneamente a satisfação um sentimento de vingança a vítima, que continuaria tendo que lidar com todos os problemas causados pela injusta agressão.
Abordamos agora de forma mais precisa a teoria jurídica propriamente dita, o estoppel. Como afirma Kinsella no início de seu artigo formulando sua tese:
Sem dúvida a pena serve a muitos propósitos. Ela tem o poder de coibir o crime e pode prevenir que o criminoso cometa outros crimes. A pena pode até reabilitar certos criminosos, se não for capital. Pode satisfazer a sede de vingança da vítima, ou o de seus familiares. A pena também pode ser usada como uma alavanca para obter restituição, uma compensação por parte do dano causado pelo crime.
O autor, de início, explica o propósito da pena, abordando logo depois sobre o que seria uma punição, além do próprio conceito da aplicação da mesma, como descreve a seguir:
A pena, portanto, compreende a violência física praticada contra o corpo de uma pessoa ou contra qualquer outra propriedade que esta pessoa possua legitimamente, ou contra quaisquer direitos que essa pessoa tenha. A pena é em razão de, ou em resposta a, uma ação, inação, aspecto, ou status da pessoa punida; se fosse de outra forma, ela seria simplesmente a prática aleatória de violência, que geralmente não é classificada como pena.
De forma resumida, o autor explica o porquê de um agressor ser estopped de contestar sua punição no seguinte trecho:
O diálogo é uma atividade que procura a verdade, os participantes são impedidos de fazer afirmações explicitamente contraditórias, já que elas subvertem o objetivo da busca da verdade por serem necessariamente falsas. Pela mesma razão, um argumentador é impedido de afirmar algo que contradiga outra coisa que ele necessariamente sustenta ser verdadeira, ou que contradiga algo que é necessariamente verdadeiro porque é uma pressuposição do debate ou, de fato, se é necessariamente verdadeiro enquanto aspecto inegável da realidade. Ninguém pode discordar destas conclusões gerais sem contradizer-se, dado que qualquer um que discorde de qualquer coisa é um participante de um debate, e portanto necessariamente valoriza a busca da verdade e, logo, a consistência.
Além disso, Kinsella faz questão de introduzir o coração por trás da ideia de um impedimento legal contido na ideia de consistência de pensamento, ele explica:
O insight básico por trás desta teoria dos direitos é que uma pessoa não pode contestar consistentemente sua punição se ela mesma deu início ao uso da força. Ela é (dialogicamente) “impedida” de afirmar a impropriedade do uso da força para puni-la, por conta de seu próprio comportamento coercivo. Esta teoria também estabelece a validade da concepção libertária dos direitos enquanto direitos estritamente negativos contra a agressão, a iniciação de força.
É necessário explicar como acontece a punição para o que ele chama de “comportamento agressivo”, e nesse ponto, resumidamente o autor afirma:
No que segue eu assumirei que a própria vítima (B), ou seu agente, C, tenta punir um suposto condenado A. A identidade ou natureza específica do agente C não é relevante para nossos propósitos aqui. Suponha que A mate B, e o agente C de B condena e prenda A. Agora, se A contestar sua pena, ele estará alegando que C não deve tratá-lo dessa forma. Se feito de qualquer outra maneira, ele falhará em apresentar sua objeção. O dever aqui é bem “estrito”, já que A alega que C não deve puni-lo. Mediante este palavreado normativo, A alega que ele tem um direito a não ser punido. Para “contestar” sua pena, A deve pelo menos necessariamente alegar que o uso da força é errado (para que C deva portanto não punir A). Contudo, esta alegação é flagrantemente inconsistente com o que deve ser sua outra posição: como ele matara B, o que é claramente um ato de agressão, suas ações indicaram que ele (também) sustenta a opinião de que a agressão não é errada.
O leitor atento deve ter ideia de como Kinsella discorre sua derivação dessa tese que viria a ser a teoria jurídica libertária. Tratado como ocorre a punição para o comportamento agressivo, acredito que seja necessário tratar de argumentos, obviamente inválidos, que um agressor poderia usar em sua defesa.
Sobre isso, o autor alega primeiramente:
Primeiramente, A poderia alegar que é inválida nossa classificação das ações entre agressivas ou não agressivas. Nós poderíamos estar infiltrando uma norma ou um juízo de valor ao descrever o homicídio como “agressivo”, em vez de simplesmente descrever o homicídio sem estes sobressaltos valorativos. Esta norma infiltrada poderia ser o que aparentemente justifica a legitimidade de punir A, deixando então a justificação circular e, portanto, falha.
Após isso, Kinsella demonstra outro argumento, também falho que um agressor poderia utilizar em sua defesa:
A universalização é então uma pressuposição do debate normativo, e qualquer argumentador que violar o princípio da universalidade está sustentando posições inconsistentes (de que a universalização é necessária e de que não é necessária), e é então impedido [estopped] de fazê-lo. Somente proposições normativas universalizáveis são consistentes com o princípio de universalização que é necessariamente pressuposto pelo argumentador ao entrar no debate.
Agora, Kinsella aponta um fator extremamente importante para a derivação de sua teoria, o tempo, ao contrário dos marxistas, os austríacos levam em conta esse fator. Sobre isso, o autor demonstra resumidamente, mas de forma mais longa que as anteriores o seguinte:
A poderia igualmente tentar refutar esta aplicação do estoppel alegando que ele, de fato, sustenta atualmente que a agressão é inadequada; que ele mudou de ideia desde que matara B. Então não há inconsistência, nem contradição, porque ele não sustenta simultaneamente ambas as ideias contraditórias, e não é impedido de contestar seu aprisionamento.
Se tal requisito absurdo de simultaneidade é operante, a cada momento consecutivo do ato da punição, qualquer objeção ou ação defensiva de A é direcionada a ações no passado (imediato), e então torna-se imediatamente irrelevante e voltada ao passado. Logo, a irrelevância da simples passagem do tempo não pode ser negada por A. Dado que, para efetivamente contestar ser punido, ele deve presumir que a passagem do tempo não faz diferença para imputar aos indivíduos ações que lhes sujeitam à responsabilidade.
A NATUREZA DA MEDIAÇÃO
Sendo os conflitos entre indivíduos algo inevitável em uma sociedade que precisa lidar com a escassez de recursos, resolvê-los é essencial para que a boa convivência se mantenha pacífica e produtiva.
De fato, a teoria legal libertária, dirá qual o direito básico de cada um, como racionalmente pensar a proporcionalidade e as punições, que se deve seguir o devido processo legal para se minimizar os erros de um julgamento. Mas acaba aí, não existe perícia libertária, não existe método investigativo libertário, ou qualquer coisa do tipo, os fatores materiais e “práticos” por assim dizer, já não estão mais nos limites teóricos e cabíveis a deduções puramente lógicas. Para servir de ponte entre o que deve ser e como faremos, estamos acostumados a recorrer a um intermediário, que será isento e imparcial, mas veja, uma sociedade pode ser composta por apenas dois indivíduos, e se for o caso, não existe a possibilidade de um terceiro ser o árbitro. Então isso significa que o conflito não pode ser resolvido? Lógico que não.
É plenamente possível duas pessoas entrarem em acordo, e usando da inteligência, chegar a uma resolução ética nos direitos de cada um. O inconveniente aqui, é que isso é extremamente complicado de se fazer, pois em uma disputa entre partes, ambos acreditam estar certos, e mais do que isso, QUEREM estar certos, o que dificulta ainda mais permanecer comprometido com a razão, já que é do interesse de ambos, atingirem seus fins, o que leva a outro incômodo plausível entre as partes… Por que confiar na palavra do outro? Ele pode mentir, fraudar ou agir de má-fé, não há garantias do contrário, e talvez ele teria motivos para isso.
Mas agora imaginamos o seguinte, um terceiro sujeito aparece no cenário. Problema resolvido, certo? Bom, isso significa que ele automaticamente seria o mediador? Ele poderia ser obrigado pelas partes a servir como juiz caso não queira? Ou ao contrário, ele pode se declarar mediador mesmo que as partes não o queiram? E se uma das partes aceitar, mas a outro não, deve necessariamente obrigar o discordante a se submeter? No ato de se recusar, cria-se um conflito dois contra um, teríamos que esperar uma quarta pessoa na para resolver o problema? A única resposta justa e racional possível para todas essas perguntas é um “não”. Por isso, segue-se uma das conclusões mais importantes para compreender a justiça em uma sociedade livre: Mediação não é direito, nem uma prescrição obrigatória no convívio, mas em fato, é uma conveniência, extremamente básica e muito útil, mais ainda assim, somente um serviço. Para afirmar o contrário, seria necessário demonstrar que esse fator não é contingente, e por tudo que já foi dito, fica claro que ele é.
OS TRIBUNAIS PRIVADOS
Formalizar serviços é uma ótima maneira para se conseguir produtividade e visibilidade. Nós começamos com vendinhas em tendas, e logo passamos para grandes centros comerciais até chegar a transações em escala mundial, essa evolução se deu justamente pela sofisticação das tecnologias disponíveis em cada época, mas mais do que tudo, pela nossa própria demanda por eficiência. Se esse desenvolvimento é próprio de todos os serviços, sair do arcaico, onde leis são talhadas em pedras e executadas por líderes locais, e a versão moderna disso, onde compilados de normas são criadas por políticos despóticos e aplicadas por juízes ineptos, é inevitável. Se é nos mecanismos de mercado que são satisfeitas as necessidades das pessoas, será por ele que os litígios serão resolvidos também. Mas como de fato será isso?
Em um ambiente de competição, a disponibilidade de informação acaba por ser uma tendência muito forte, uma vez que, tudo aquilo que fizer um tribunal se tornar menos confiável aos olhos dos clientes, gerará prejuízo e oportunidade para a concorrência. Selos de qualidade, auditorias públicas e registros avaliativos, são demandas que representam então, a verdadeira supervisão, com seu valor atrelado credibilidade de seus realizadores. Portanto, a não existência de um estado, não significará a ausência de inspeção, ao contrário, por si só qualquer fiscalização ou regulamentação feitas pelo governo geram inúmeros incentivos à corrupção e negligência, pois esse não dá as pessoas a oportunidade de contestar seu valor, cujo a inspeção será compulsoriamente dada como válida e obrigatória, independente de sua qualidade ou aceitação.
O cenário anarcocapitalista é tão mais promissor que, caso você não se sinta confortável com as avaliações fornecidas pode sem intermédio, realizar as próprias investigações, e se a empresa responsável pelo tribunal ou pela auditoria, não quiser liberar as informações que satisfaçam as tuas preocupações, ou que cumpram os teus critérios escolhidos, basta buscar uma que o faça, ou até mesmo começar seu próprio negócio, atendendo a quem tiver as mesmas demandas que você, afinal de contas, empreender é uma escolha válida e louvável.
Talvez uma das últimas preocupações do leitor até aqui, sejam os custos financeiros da justiça privada, afinal, a estatal é sustentada por impostos, e no anarcocapitalismo, cada um teria que bancar a si mesmo. Então como um mendigo, ou alguém muito pobre teria acesso?
Fornecer serviços de baixo custo, investindo no barateamento o processo, mantendo a qualidade do serviço, é uma das coisas mais lucrativas que existem, já que a alta somatória de pessoas pagando pouco, gera uma alta quantidade de dinheiro, não falta incentivos para que sejam abundantes os tribunais especializados a atender pessoas muito humildes. Ademais, pleitos encerrados tem seu custo jogados a parte perdedora, então aqueles com causas justas, não ficariam no prejuízo, muito pelo contrário, seriam indenizados no final, valendo a pena até mesmo solicitar um empréstimo para abrir uma disputa, ou assinar algum tipo de “plano de seguro”, com alguma empresa ou diretamente com o tribunal.
Outra solução extremamente criativa, é a venda de causas. Suponhamos que sujeito A tenha seus direitos violados por sujeito B, A entretanto, não possui meios para iniciar um ação, então ele recorre a sujeito C, que aceita pagar a abertura do processo em troca de alguma porcentagem do que vier a ser a indenização paga por B.
Pode-se pensar, “e se a causa de A for pouco atraente na perspectiva de lucro, ou não possuir evidências muito convincentes”, bom, nada que empresas especializadas em pequenas causas e investigações não resolvam. “E se C resolver se aproveitar da situação e exigir um valor muito alto da indenização” bom, basta que A recuse o contrato, e faça a mesma proposta para outras pessoas, até achar a melhor oferta disponível.
Ainda que em apresentação simplificada, podemos a imaginar a potencialidade dos desdobramentos que essa possibilidade nos dá, ao transformar o que até os dias de hoje é dinheiro de tributo, em investimento.
AMBIENTES DE LEIS PRIVADAS
O mercado não pode esperar a burocracia do estado, tempo é dinheiro, boas e más decisões podem arruinar um negócio, e ninguém quer depender de fatores assim. Não é atoa que é relativamente comum a existência de serviços de arbitragem privada no meio empresarial. Alguns exemplos de associações com fins de mediação bem sucedidas, que atuam inclusive a nível internacional são, a Associação Americana de Arbitragem — AAA (American Arbitration Association) fundada em 1926, e Câmara Internacional do Comércio — CCI (International Chamber of Commerce) fundada em 1919.
Entretanto alguém pode pensar, “mas essas instituições, como tudo, estão submetidas ao governo não é? O que garante que sem ele as mesmas não deixariam de funcionar”. Bom, para tornar as coisas mais interessantes, demonstrarei a seguir, ambientes que funcionam “livres” de uma autoridade central.
A INTERNET
Um dos exemplos mais acessíveis e contemporâneos a serem citados é da internet. Sendo de certa forma, grande e dinâmica demais para ser regulamentada em sua totalidade, a rede mundial de computadores, opera majoritariamente por meio de leis privadas. Inúmeras comunidades, fóruns, sites e afins impõem suas próprias regras, e até tribunais, que a propósito, nem sempre estão de acordo com a legislação do país a qual o usuário as acessam, mas funcionam bem por atender os anseios de seus frequentadores. Nesses locais, a punição para quem quebra essas regras é em geral, o boicote, por meio de banimento e ostracismo, dependendo do caso, até mesmo a exposição pública de informação, punições essas que por si só, já são suficientes para manter a ordem nesses ambientes.
Outra coisa, é que não são as leis do governo que mantém a internet um local “amigável” a quem usa. É bem verdade que existem regulamentações, e até serviços policiais especificamente designados a punir crimes virtuais, mas veja, o real fator de civilização virtual é o próprio interesse dos criadores de conteúdo em ter seu material visualizado e divulgado.
Pense comigo, o que motiva o Google a não permitir certos conteúdos em suas plataformas? Será que sem o estado para proibir pornografia infantil, vídeos de estupro, sites mal intencionados e criminosos entre outros, a empresa simplesmente iria os ignorar? É evidente que não, uma empresa precisa zelar por boa reputação para atrair mercado, assim como, na maioria do tempo, não é o governo que faz o Facebook e Twitter deletarem postagens, até porque, muito do que é excluído sequer é ilegal, mas vai contra os interesses do que os donos entendem ser a vontade dos clientes para qual a plataforma é direcionada.
É a nossa própria evolução de decência que dita os padrões sociais aceitáveis, tanto para empresas, quanto para o estado, que ao contrário do que se pensa, não é assegurador da moral, mas assim como qualquer instituição que preze pela própria sobrevivência, precisa se adequar a tal, para não ser massivamente rejeitada. Prova disso, é que os maiores responsáveis por combater materiais sórdidos e criminosos, nas partes mais descentralizadas e anônimas da internet, são especialistas independentes ou de alguma célula ativista. Não há porque pensar que em um ambiente de livre mercado, estes, não continuariam a ser incentivados a prestar o mesmo serviço, talvez até recebendo pagamento para expandi-lo, já que é da própria sociedade, a vontade de se preservar.
AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
É até bem estranho, mas você já parou pra pensar que não existe um “estado mundial”? A ONU é só uma de várias associações, qualquer país pode entrar e sair dela a hora que quiser, e nem mesmo precisa acatar a todas as suas resoluções. Pois é, uma nação se relaciona com as outras na exata mesma condição a qual os anarcocapitalistas entendem que os indivíduos de uma sociedade livre o farão, ou seja, através de acordos voluntários e reciprocidade.
Veja essa pequena “anedota” para entender melhor:
O Sr. Brasil a algum tempo, que mora no bairro América Latina, teve um desentendimento com a Sra. Inglaterra em decorrência de certo prejuízo que a mesma acabou tendo ao transitar pela calçada do sujeito. O Sr. Brasil, por sua vez, não acreditava ser responsável e não estava disposto a pagar qualquer indenização solicitada pela Sra. Inglaterra, que ficou extremamente furiosa, chegando a ameaçar do uso da força contra o Sr. Brasil, o Sr. Brasil, também levantou a voz e disse que se ela quiser partir pra violência, ele também vai. A situação ficou tensa, até que o Sr. Brasil resolveu pedir ao Sr. Belga, que morava no mesmo bairro que a Sra. Inglaterra, Europa, para mediar a situação. O Sr. Belga avaliou a situação e disse:
– Bom, Sr. Brasil, era sua responsabilidade cuidar da situação da calçada da sua casa, então você precisa pagar os danos a Sra. Inglaterra, mas de fato ela foi muito deselegante e não deveria ter te ameaçado, então o mínimo que ela precisa fazer é te pedir desculpas.E como toda boa história, o final é feliz, Sr. Brasil pagou para a Sra, Inglaterra o que devia e ela pediu desculpas por ter se excedido, voltando a se relacionar normalmente. Claramente, isso só é só uma analogia, tentando se aproximar, para fins didáticos em um episódio real, conhecido na história diplomática brasileira, como questão Christie. Mas vamos pensar em alguns cenários possíveis que poderiam ter acontecido. Veja, na época, a marinha real chegou a enviar um navio de guerra para a costa brasileira, e o nosso Imperador na época, Dom Pedro II estava disposto a responder a mesma altura, não seria muito difícil essa situação escalonar para um conflito armado, só que, que bem isso faria para ambos? Nenhum, o Brasil perderia um importante parceiro comercial, assim como a Inglaterra, um bom cliente e fornecedor, sem falar nos prejuízos com o conflito.
Mais do que isso, a Bélgica não tinha meios para obrigar militarmente qualquer um a seguir a decisão tomada, e se essa fosse de alguma forma absurda, não só seria rejeitada pelas partes, como sua execução seria vista como ilegítima pelo resto da comunidade internacional, comprometendo seriamente a reputação do Rei Belga, o juiz e de quem a aceitasse. Da mesma forma, como a deliberação foi nitidamente razoável, mesmo qualquer lado podendo simplesmente se recusar a fazer o que lhe foi solicitado, seria de quem agisse desse modo, o prejuízo à reputação, que acumularia aos próprios infortúnios de se manter o conflito sem resolução.
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