Universidade Libertária

O Que É Conservadorismo

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Por Taiane Copello

Neste texto pretendo tratar do conceito da ideia que se intitula como conservadorismo bem como expor o ponto de vista de três autores adeptos desta tendência filosófica como Russell Kirk, Roger Scruton e Hans-Hermann Hoppe. A ideia de conservadorismo ainda é muito confundida na atualidade tendo em vista que o nome se popularizou na política nos últimos anos. É comum você ouvir alguém que conhece se intitulando como conservador e talvez você mesmo se considere tal coisa. Mas será que conhecemos o suficiente sobre esse tema?
Em primeiro lugar, gostaria de ressaltar que o conservadorismo é, de um modo geral, a conservação das instituições. Isto é, são valores morais que se debruçam em preservar aquilo que é próprio do gosto social. As instituições são nada mais, e nada menos, do que regras aceitas socialmente. Existem diversas abordagens do conservadorismo enquanto filosofia. Como toda tendência filosófica, os conservadores também discordam entre si.
A primeira abordagem que irei tratar será a de Russell Kirk em seu texto “Dez princípios conservadores”. Ele explica que conservadores não defendem uma ideologia ou até mesmo uma religião. Não existe um Das Kapital ou uma Bíblia Sagrada com bases, critérios e regras a serem seguidos num determinado magnum opus, mas um conjunto de valores observados ao longo do tempo e adotados quando são vistos como algo que faz bem aos indivíduos. Conservadores acreditam que a ordem social está baseada em uma moralidade. Como acrescenta o próprio autor:

“Uma sociedade onde homens e mulheres são governados pela crença em uma ordem moral duradoura, por um forte sentido de certo e errado, por convicções pessoais sobre a justiça e a honra, será uma boa sociedade – não importa que mecanismo político se possa usar; enquanto se uma sociedade for composta de homens e mulheres moralmente à deriva, ignorantes das normas, e voltados primariamente para a gratificação de seus apetites, ela será sempre uma má sociedade – não importa o número de seus eleitores e não importa o quanto seja progressista sua constituição formal.” (KIRK, Russell, Dez Princípios Conservadores, p. 2)

Ele também explica que o conservador não quer promover ruptura social, mas isso não quer dizer que ele não queria melhorar a sociedade. O conservador assume que devem ser adotados os costumes, as convenções e a continuidade, como descreve o filósofo: “Os conservadores são defensores do costume, da convenção e da continuidade porque preferem o diabo conhecido ao diabo que não conhecem” (KIRK, Russell, Dez Princípios Conservadores). Por exemplo, a instituição do casamento, tema muito comum abordado por conservadores, é uma das regras que leva as pessoas a pensarem na sua própria sobrevivência pois já é um costume seguido por séculos na sociedade.
Hans-Hermann Hoppe em “Democracia o Deus que falhou” adota essa abordagem explicando que a formação da família leva a sobrevivência da sociedade por que nossos filhos são nosso capital intergeracional. Quando ficarmos mais velho, nosso investimento feito de antemão de importante valor pra grande parte das famílias, que são a prole, retribuirá de volta cuidando dos pais. Porém, o Estado acabou com isso quando criou a previdência social porque passa a ser o Estado quem cuida do cidadão quando este for mais velho [1]. Contudo, para além disso, Hoppe define seu conservadorismo da seguinte maneira:

“O termo “conser­vador” […] se refere a alguém que acredita na existência de uma ordem natural, de um estado de coisas natural, que corresponde à natureza das coisas; que se harmoniza com a natureza e o homem.” (HOPPE, Hans-Hermann, 2014, p. 223)

Ele descarta o sentido de conservadorismo como a conservação das leis pois afirma que esse sentido é vazio já que somente apontaria que o conservador pretende seguir as leis e quer que todos sigam uma ordem existente – qualquer que seja ela.
Hoppe também defende que há coerência entre ser conservador e ser libertário. Uma vez que o libertarianismo é uma teoria ética, isto é, Hoppe define a ética como um sistema normativo de certo e errado enquanto que a moral seria o que se considera por bem ou mal. Libertários defendem uma ética objetiva onde a propriedade privada do indivíduo deva ser respeitada, enquanto que os conservadores apoiam que a propriedade e a liberdade estejam diretamente relacionadas. Kirk concorda nesse ponto com Hoppe afirmando:

“Separe a propriedade do domínio privado e Leviatã se tornará o mestre de tudo. Sobre o fundamento da propriedade privada, construíram-se grandes civilizações. Quanto mais se espalhar o domínio da propriedade privada, tanto mais a nação será estável e produtiva. Os conservadores defendem que o nivelamento econômico não é progresso econômico. Aquisição e gasto não são as finalidades principais da existência humana; mas deve-se desejar uma sólida base econômica para a pessoa, a família e o estado.” (KIRK, Russell. Dez Princípios Conservadores, p. 4)

Com isso, Hoppe também explica que é necessário compreender que, quando não se adotam determinados costumes, a civilização é levada ao declínio e não ao progresso [2]. Em “Uma breve história do homem” Hoppe responde ao argumento do filósofo Friedrich Engels que defende a ideia de “amor livre”. O argumento de Engels é de que a primeira divisão do trabalho foi entre homem e mulher e que faria bem para a sociedade que os filhos fossem criados por uma comunidade e não mais pela mãe e pelo pai, responsabilidade recaída sobre a mãe [3]. Porém, Hoppe explica que, com o amor livre, a procriação também poderia aumentar consideravelmente tendo em vista que a responsabilidade da criação é terceirizada a outrem. E mais uma vez ele mostra como o conservadorismo é um conjunto de valores que busca preservar o que deu certo na sociedade como a insituição da família.
Não distante do pensamento destes outros dois pensadores, Roger Scruton reafirma o conservadorismo como preservação da ordem natural. A ordem natural é a preservação das coisas admiráveis, das convenções e da partilha do sentimento em comum entre a sociedade. Mas como somos ameaçados pelas ideologias por conta das eleições abertas e da educação nas escolas e universidades por vezes adotadas por ideologias que buscam romper com o tecido social, como o progressismo, Scruton defende o conservadorismo como resposta racional à esta ameaça [4].
Scruton também é crítico de ideologias ou sistemas políticos como o nacionalismo, o socialismo, o capitalismo e o multiculturalismo. Ele explica que como estamos vivendo num tempo de disputas entre essas ideologias, todas elas são perigosas pra ordem natural em alguma medida. O nacionalismo pode deixar alguém cego com o sentimento da sua nação [5], o socialismo desrespeita a propriedade privada tão cara à uma sociedade originada do respeito à mesma para a cooperação dos indivíduos [6], o capitalismo pode dar brecha às liberdades como a liberdade sexual para vender seu serviço ao passo que a sociedade perde o controle de seus desejos sexuais que precisam ser contidos [7], o multiculturalismo permite a entrada de diversas culturas distintas no mesmo lugar o que pode ocasionar em conflitos quando não há convenção [8]. Pode se dizer que Scruton é adepto de um ceticismo político, um dos pontos do conservadorismo.

“O conservadorismo advém de um sentimento que toda pessoa madura compartilha com facilidade: a consciência de que as coisas admiráveis são facilmente destruídas, mas não são facilmente criadas. Isso é verdade, sobretudo, em relação às boas coisas que nos chegam como bens coletivos: paz, liberdade, lei, civilidade, espírito público, a segurança da propriedade e da vida familiar, tudo o que depende da cooperação com os demais, visto que não há meios de obtê-las isoladamente.” (SCRUTON, Roger, 2019, p. 9)

Por fim, chegamos a conclusão de que o conservadorismo é um conjunto de regras morais aceitas pela sociedade em função do bem estar geral. Essa filosofia não pode ser uma ideologia porque fala sobre a ordem social já existente, ela não é um ideal. Acrescento também que eu espero que o autor tenha, até aqui, entendido brevemente o conceito de conservadorismo e esteja apto para distinguí-lo de outras correntes filosóficas.

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[1] Para entender mais sobre este assunto, ver “Democracia, o Deus que falhou” de Hans-Hermann Hoppe.
[2] Conservadores não se opõem ao progresso, mas ao progressismo, ideologia marcada pela busca na ruptura do tecido social mudando o costume, a cultura e a política.
[3] Para entender mais sobre este assunto, ver “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” de Friedrich Engels.
[4] Nos Estados Unidos 70% dos intelectuais se denominam “à esquerda”.
[5] Para entender mais sobre este assunto, ver capítulo 3 de “Como ser um conservador” de Roger Scruton.
[6] Para entender mais sobre este assunto, ver capítulo 4 de “Como ser um conservador” de Roger Scruton.
[7] Para entender mais sobre este assunto, ver capítulo 5 de “Como ser um conservador” de Roger Scruton.
[8] Para entender mais sobre este assunto, ver capítulo 7 de “Como ser um conservador” de Roger Scruton.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KIRK, Russell. Dez Princípios Conservadores. Disponível em: http://www.kirkcenter.org/kirk/ten-principles.html

HOPPE, Hans-Hermann. Democracia: O Deus Que falhou. Tradução de Marcelo Werlang de Assis. São Paulo, Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2014.

HOPPE, H. H. Uma Breve História do Homem: Progresso e Declínio. Traduzido por Paulo Polzonoff – São Paulo: Instituto Ludwig Von Mises Brasil.

SCRUTON, Roger. Como Ser Um Conservador. Revisão de Bruno Garschagen. Revisão técnica de Márcia Xavier de Brito. 10º Ed. Rio de Janeiro, 2019.

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