O problema do uso sistemático de termos técnicos da filosofia fora da conotação apropriada dos seus sistemas originários é que eles perdem o seu espírito.
Sabe quando você está diante de uma pequena grande conquista, aquelas que só são importantes para nós mesmos e que podem ser corriqueiras para qualquer outro? E alguém vai lá e passa na sua frente fazendo aquilo por ti ou te impedindo de alcançar? É mais ou menos isso que acontece com o espírito dos termos. Quando usado no contexto que foram criados, são enormes, carregam toda a história que o antecede.
São verdadeiras conquistas semânticas que carregam grande e gritante tradição. Quando usadas levianamente, ou até quando são mera repetição e não estão dotadas de sentido interno, são pequenas em si mesmo. Quando Hoppe fala autopropriedade se refere a maior conquista humana já imaginada. Ao futuro efetivo do mundo.
O reconhecimento metafísico pleno do sujeito levado às últimas consequências normativas, a extensão total dos fins do sujeito no próprio sujeito. Essa expressão carrega em si mesmo um mundo. Um mundo que eu preciso proteger.
Quando Hoppe fala de ética argumentativa, ele está dizendo que o sujeito é normativamente através do discurso. O SUJEITO É NORMATIVAMENTE ATRAVÉS DO DISCURSO. Isso é tão belo, tão singelo, somos obrigação moral implícita, todos carregamos implícitos na nossa vontade algo que ao ser reconhecido no discurso se traduz como EU SOU DONO DOS MEUS FINS.
É uma proposição normativa originária e eu demorei anos para perceber isso, e esses anos acabam de me ajudar a perceber uma reviravolta interessantíssima na guerra intelectual contra os irrealistas.
Existem proposições normativas que advém da própria consideração ontológica. Até mesmo antes da configuração propositiva, até mesmo da intuição referencial e inferencial, há a necessidade da estipulação primeira em relação ao ente que enuncia a proposição.
Suas características PRECISAM ser enxergadas porque qualquer caráter de veracidade de uma afirmação qualquer será obrigatoriamente instituída utilizando um aparato de correspondência das premissas para com o objeto a que fazem referência, mas também para o interprete necessário.
Isso se dá devido ao caráter fortemente relativista das análises, mesmo em uma meta-estrutura a lá Tarski, não temos como sair do fato que a verdade das premissas corresponde a um conjunto de crenças que a interpreta e que elas apenas serão verdadeiras em relação a esse conjunto ou ao conjunto de conjuntos de crenças, em última análise.
Para que o conjunto de ferramentas lógicas básicas seja compreensível ao sujeito, compartilhamos necessariamente alguns PODERES, esses poderes se referem a capacidade de raciocínio, mas também a capacidade de abstração.
São também os elementos que tornam a própria lógica cognoscível. Ao reconhecer que a própria lógica irá compartilhar desses pressupostos, ao reconhecer que a própria capacidade de consenso de linguagem irá girar em torno de acordos de sentido que precisam ter elementos comuns.
Ao reconhecer que para sequer nos concebermos racionalmente, como presença, temos que antes de tudo nos reconhecermos como possíveis, eis que elementos reais da realidade, e que essa possibilidade se traduz na mais simples afirmação conceitual: ser, temos que o verdadeiro lugar ontológico é como afirmação normativa originária necessária.
Precisamos afirmar desde o início que pertencemos a alguma classe ontológica, ainda que essa classe fosse ter apenas um indivíduo. Minha tese aqui é a seguinte: o discurso nada mais faz do que confirmar a existência de seres de mesma classe ontológica.
E o faz através da única afirmação ontológica verificável, a de que somos entes ativos diferentes de seres passivos, e essa atividade se dá pela capacidade da consciência de autodenominar-se (ou de instituir um eu interior como diria Lavelle).
A característica comum de todas as proposições morais é então a de compartilhar as valorações ontológicas denominadas necessárias. Elas não possuem características inatas e nem poderiam possuir, pelo seu caráter de validade estar fortemente atrelado a veracidade da proposição normativa originária.
Sendo assim, aquilo que viu Mackie foi apenas o ponto externo de um processo que aconteceu dentro de si e para o qual ele foi parte necessária.
Não estou a adicionar nem mais uma palavra em Hoppe aqui, estou afirmando de forma solitária; o que Hoppe percebeu foi que o exercício de consideração ontológica se dá a todo momento nas discussões normativas, mas não considerou que a própria consideração ontológica existia independente dessa formulação e que é apenas verificada pelos agentes na argumentação.
Sendo assim, a consideração de uma proposição normativa originária dentro da própria capacidade cognoscível do sujeito, o escapou, embora a tenha capturado com brilhantismo quando se manifesta materialmente no discurso. A essa consideração ontológica necessária que dá origem a proposição normativa originária eu chamarei de Espírito Humano.
E eu ainda não sei as consequências disso, mas a autopropriedade passa a ser então ainda mais do que a afirmação de que eu sou dono dos meus próprios fins e passa a ser maior. Passa a ser a afirmação de que Eu sou Humano e sou aquele a determinar meus próprios Fins. Eu não tenho grandes intenções para com essa afirmação, mas esse é o primeiro grande ataque aos irrealistas.
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