Publicado originalmente pelo Instituto Rothbard.
Texto de Autoria de Fernando Chiocca
Que bom que o dia das eleições está chegando, pois ninguém aguenta mais. Há vários relatos de que as manifestações de apoio, ou contrárias, a um ou outro candidato geraram discórdias e brigas entre várias pessoas que até então eram amigas de longa data. É lamentável ver amizades sendo rompidas por algo tão putrefato quanto a política.
As divergências políticas geram discussões, que geram ofensas e xingamentos, que causam o fim de amizades e um rancor contraproducente.
Mas por que esse clima de guerra? Afinal, a democracia não é o supremo sistema que os brasileiros se orgulham de ter alcançado? Não deveria estar tudo correndo pacificamente na plenitude democrática?
Muito pelo contrário: essas brigas que estamos testemunhando é uma consequência direta e inexorável da democracia. Dado que o estado é um inerente gerador de conflitos, o processo eleitoral democrático inevitavelmente transfere a característica antissocial do estado para as pessoas — e essa característica fica em maior evidência naqueles que mais se engajam na política.
Uma explicação concisa e precisa de como a horrível e detestável democracia aflora estes sentimentos antissociais nas pessoas pode ser encontrada neste vídeo, que foi produzido para mostrar como a democracia é maravilhosa, o que torna tudo ainda mais medonho:
Quatro jovens estão decidindo onde irão passar um feriado: na praia ou na serra. Três querem praia e uma quer serra. Sendo assim, a democracia impera e fica decidido que os quatro devem ir para a praia.
No entanto, dado que intenção do vídeo é glorificar a democracia, as implicações práticas daquilo que o vídeo realmente defende são bem mais tenebrosas do que parecem à primeira vista. Se o cenário é a democracia, então, ao se transferir essa decisão democrática (3 contra 1) para o estado, como era a intenção do vídeo, os três jovens que venceram a eleição adquiriram o “direito” de coagir e obrigar a garota que preferia a serra não só a ir para a praia como também a pagar por todo o pacote da viagem com as opções que eles escolheram.
Não, ela não poderia ir sozinha para a serra e deixar que os outros três fossem para a praia — afinal, “deu praia” na eleição. E era para nós acharmos o vídeo sublime!
Adaptando o vídeo para as eleições atuais, imaginem que o destino da viagem fosse escolhido por uma quinta pessoa, e fossem destinos que ninguém quisesse ir, como Chernobyl e Sibéria. Se o seu eventual ódio ao frio fosse maior do que seu medo de radiação, você iria transferir esse ódio para todos aqueles que estivessem apoiando uma viagem a Sibéria, dado que você seria obrigado a ir e a pagar pela viagem. Por outro lado, se você soubesse que a radiação irá resultar em sequelas que no longo prazo o levariam à morte, você iria bradar incessantemente contra os eleitores de Chernobyl.
Mas essa adaptação ainda está muito aquém da realidade das eleições, pois o que são alguns dias desagradáveis de viagem quando comparados a anos com uma pessoa que você detesta tomando seu dinheiro e mandando em você?
E é isso que está em jogo nessas eleições. Sendo assim, é perfeitamente compreensível que amigos briguem por conta de suas divergências políticas.
Todavia, nenhuma das partes tem razão. Embora você certamente acredite que esteja do lado do bem (ou do menor mal) e tenha toda a convicção de que sua escolha é a melhor (e você pode ter razão quanto a isso), a outra parte pode ter objetivos e tendências diferentes da sua e pode pensar a mesma coisa em relação à escolha dela. Na disputa da viagem, fica claro que a melhor solução seria deixar cada um gastar o seu próprio dinheiro livremente, escolhendo o destino que preferir, e ir sozinho. Então, se você está tentando impor sua escolha sobre os outros, seja essa escolha qual for, você está errado.
O que alegam os defensores da escolha da viagem “menos ruim” é que, já que teremos de viajar de qualquer jeito, é preferível que nos engajemos na campanha do destino “menos pior” para não termos que viajar para um lugar pior ainda. “Você poderia estar na Sibéria, passando frio, mas ao menos observando a bela natureza em vez de estar aqui no meio dessa radiação de Chernobyl que irá nos matar em pouco tempo!”
E, desse modo, viagens e mais viagens vão sendo marcadas para locais aonde quase ninguém quer ir, pois ninguém está defendendo a solução correta.
É imperativo nos livrarmos dessa que é a mais perigosa das superstições: a crença na autoridade. As pessoas têm de entender que uma porcentagem numérica não confere poder superior a ninguém, e que ninguém pode magicamente delegar direitos que não possua. É vital que as pessoas comecem a pensar além da democracia.
Os libertários são os únicos que não querem impor à força seu destino aos perdedores (e ausentes) de uma eleição. Os libertários são a favor de que cada um escolha o seu destino, que cada um faça o que quiser com seu próprio dinheiro e sua propriedade. Enquanto todos parecem estar inebriados com o circo eleitoral e se ocupam de defender a viagem preferida (ou a que menos desgostam), apenas os libertários seguem dizendo o que importa: não queremos obrigar ninguém a viajar para onde não queiram.
Quem quiser ir para Chernobyl ou para a Sibéria, que vá, e pague pela viagem. Aposto que ninguém está brigando por causa dos destinos que os outros escolheram viajar nas próprias férias. Mas se há alguém querendo lhe obrigar a ir passar uns dias em Chernobyl (ou na Sibéria), é óbvio que isso irá gerar brigas.