O Estado é velho, assim torna-se velho para compreendê-lo.
Essa união (voto, política e libertarianismo) é assunto de discussão assídua em meio ao movimento libertário, mas geralmente é lido de forma rasa. E isso em muito se deve ao caráter utilitarista que se expressa em meio à confusão de conceitos sobre política, legitimidade e poder.
Viemos aqui com a intenção de trazer uma visão sociológica mais sólida do problema para leigos e demonstrar porque o voto é essencialmente o maior favor que qualquer libertário pode fazer ao estado. A discussão começa essencialmente pela abordagem dos dois pontos estabelecidos pelos Gradualistas e pelos Puristas.
O primeiro grupo advoga pela destruição parcial do estado através de ações institucionalizadas em direção a mudança de paradigmas até que o indivíduo médio seja livre o suficiente para que possa obter sua própria alforria em relação ao estado.
O segundo grupo advoga pela intransigência ética em relação a atuação do estado, mantendo a maior distância possível em relação a atuação do estado. O argumento contido no segundo grupo é essencialmente o de que a atuação política não só é antiética, mas também é primordialmente contraditória, sustentando uma visão sociológica do problema dentro da própria visão da ação social do ato de votar.
Do argumento Sociológico
Para entendermos como essa visão sociológica se manifesta, precisamos primeiro nos entender como em uma dicotomia clássica da sociologia, indivíduosociedade. Sociedade é uma estrutura pós-comunitária, onde há conflitos, justamente pela mesma ser maior do que a própria escala social dos indivíduos e não refletir sua vontade. Nela, como descrito por Luckamnn, há mundos subjetivos em paralelo com o mundo objetivo de cada ser e é a ação social que descreve nossas interações com esses mundos. Como diz Mises;
“Ação social é então considerada como um caso particular da categoria mais universal da ação humana”
estando portando submetida a suas condições. Quais sejam: insatisfação, imagem de uma situação melhor e expectativa de que a ação o ajude a chegar nessa situação melhor para si. Há ainda a questão da casualidade; nós efetivamente acreditamos que aquela ação X ou Y terá êxito em alcançar o fim Z e apenas agimos em função dessa crença.
Bebendo das águas de Weber temos que o voto é uma ação social política, ação social por ter sentido e finalidade e levar em consideração indivíduos externos a si e política por ser um esforço feito para influenciar a divisão do poder, que se perfaz no âmbito da legalidade, atributo estrito da legitimidade para weber. Sendo assim, o eleitor ao votar, é dócil em relação ao jugo de determinado político, submetendo-se a sua dominação racional-legal, ao descrevê-lo como competente materialmente para agir legitimamente em seu nome quando ao resolver a sua insatisfação logrou encontrar na ação política a ação que o levaria a uma posição de maior conforto. E mais ainda, ao participarmos da esfera política, estamos participando nós mesmos do campo político, em termos bourdieanos, expresso pelas regras do estado, saindo de nossa perspectiva individual para uma perspectiva coletiva e que por maior poder que tenhamos e poder aqui é lido como capacidade para influenciar esse campo, inclusive suas regras, não nos pertence e será caracterizado por uma resistência natural advinda das próprias mensurações do poder como bem visto por Foucault.
Ainda que uma adoção do poder como apoio seja adotada, a lá Hannah Arendt, ela terá ainda menos eficiência em se defender o libertário que se posicionar dessa forma, já que o apoio não é uma dicotomia, sendo três as posições possíveis, favorável, desfavorável e neutra, e mais, como lembra a autora;
A forma extrema de poder é O Todos contra um, a forma extrema da violência é o Um contra todos.
Ao assumir uma posição de distância em relação à intransigência ética, o libertário gradualista está justamente se estabelecendo como meio de oposição da própria concepção a nível intelectual que acredita estar professando, eis que a nível social não há distinção de intencionalidade e a própria expressão de oposição seria uma posição uníssona da sociedade em relação aos grupos de poder que professam o estatismo e a espoliação.
Indo ainda mais a fundo e lendo a ação social como agência como em Giddens, ou seja, como um fato consolidado que terá consequências no mundo exterior e amparados pelo critério da casualidade em Mises, temos que as nossas ações políticas, entregam uma responsabilidade entre o ato do político que o representará e as suas. Toda e qualquer espoliação cometida pelo político, será em última análise uma espoliação cometida por si. E em última instância, essa ação social é primordialmente descrita como resultado das nossas vontades e valores na esfera pública discursiva, nesse sentido, é a nossa ação que dá publicidade a aquilo que acreditamos e valorizamos.
E para libertários, principalmente aqueles que valorizam a questão do discurso como instrumento normativo e de busca da validade, o debate é justamente o local onde através do consenso, chegamos na objetividade das subjetividades, onde aquilo que se é decidido, é para aqueles que decidiram, um corpo objetivo indivisível. Uma vontade geral que é em si mesma holística, é desse tipo de coisa que está participando comunicativamente e publicitariamente o libertário que vota.
Essa expressão é por si só fruto de um mito de sísifo, personagem que rolava uma rocha em um terreno que aumentava o quão íngreme conforme chegava mais perto do seu ponto final, onde o próprio voto em direção a oposição da democracia e do estado é per si uma sustentação de legitimidade adhoc do próprio estado que se opõe, não legitimidade ética, mas SOCIOLÓGICA.
Os puristas, por outro lado, propõe uma Desmagificação do mundo, onde que por mais que se percam os caminhos fáceis, os atalhos mágicos que por ventura pudessem aparecer, esse desencantamento nos torna mais cientes de nós e nos permite procurar sentido e direção em ações sociais que sejam realmente eficientes, como a desobediência civil e a contra economia.
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