Por Murray Rothbard
[Retirado de Economic Controversies, seç. 5, cap. 32]
I.
Se os homens fossem como as formigas, não haveria interesse na liberdade humana. Se os homens individuais, como as formigas, fossem uniformes, intercambiáveis, desprovidos de traços de personalidade próprios, quem se importaria se eles fossem livres ou não? Quem, de fato, se importaria se eles vivessem ou morressem? A glória da raça humana é a singularidade de cada indivíduo, o fato de que cada pessoa, embora semelhante em muitos aspectos às outras, possui uma personalidade própria completamente individualizada. É o fato da singularidade de cada pessoa — o fato de que duas pessoas não podem ser totalmente intercambiáveis — que torna cada homem insubstituível e que nos preocupa se ele vive ou morre, se é feliz ou oprimido. E, finalmente, é o fato de que essas personalidades únicas precisam de liberdade para seu pleno desenvolvimento que constitui um dos principais argumentos para uma sociedade livre.
Talvez exista um mundo em algum lugar onde seres inteligentes são totalmente formados em algum tipo de gaiola externamente determinada, sem necessidade de aprendizado interno ou escolhas por parte dos próprios seres individuais. Mas o homem está necessariamente em uma situação diferente. Os seres humanos individuais não nascem ou são formados com conhecimento, valores, objetivos ou personalidades totalmente formados; cada um deve formar seus próprios valores e objetivos, desenvolver suas personalidades e aprender sobre si mesmos e sobre o mundo ao seu redor. Todo homem deve ter liberdade, deve ter o escopo de formar, testar e agir de acordo com suas próprias escolhas, para que ocorra qualquer tipo de desenvolvimento de sua própria personalidade. Ele precisa, em suma, ser livre para que possa ser plenamente humano. Em certo sentido, mesmo as civilizações e sociedades mais congeladas e totalitárias permitiram pelo menos um mínimo de espaço para escolha e desenvolvimento individual. Mesmo o mais monolítico dos despotismos teve que permitir pelo menos um pouco de “espaço” para a liberdade de escolha, mesmo que apenas dentro dos interstícios das regras sociais. Quanto mais livre a sociedade, é claro, menor tem sido a interferência nas ações individuais e maior o escopo para o desenvolvimento de cada indivíduo. Quanto mais livre for a sociedade, então, maior será a variedade e a diversidade entre os homens, pois mais plenamente desenvolvida será a personalidade individual única de cada homem. Por outro lado, quanto mais despótica a sociedade, mais restrições à liberdade do indivíduo, mais uniformidade haverá entre os homens e menos diversidade, e menos desenvolvida será a personalidade única de cada homem. Em um sentido profundo, então, uma sociedade despótica impede que seus membros sejam plenamente humanos.[1]
Se a liberdade é condição necessária para o pleno desenvolvimento do indivíduo, não é de forma alguma o único requisito. A própria sociedade precisa ser suficientemente desenvolvida. Ninguém, por exemplo, pode se tornar um físico criativo em uma ilha deserta ou em uma sociedade primitiva. Pois, à medida que uma economia cresce, o leque de escolha aberto ao produtor e ao consumidor passa a se multiplicar enormemente.[2] Além disso, apenas uma sociedade com um padrão de vida consideravelmente superior à subsistência pode se dar ao luxo de dedicar grande parte de seus recursos para melhorar o conhecimento e desenvolver uma miríade de bens e serviços acima do nível de subsistência bruta. Mas há outra razão pela qual o pleno desenvolvimento dos poderes criativos de cada indivíduo não pode ocorrer em uma sociedade primitiva ou subdesenvolvida, e essa é a necessidade de uma ampla divisão do trabalho.
Ninguém pode desenvolver plenamente suas faculdades em qualquer direção sem se engajar em especialização. O primitivo membro da tribo ou camponês, preso a uma série interminável de diferentes tarefas para se manter, não poderia ter tempo ou recursos disponíveis para perseguir qualquer interesse particular ao máximo. Ele não tinha espaço para se especializar, para desenvolver qualquer área em que fosse melhor ou na qual estivesse mais interessado. Duzentos anos atrás, Adam Smith apontou que o desenvolvimento da divisão do trabalho é a chave para o avanço de qualquer economia acima do nível mais primitivo. Uma condição necessária para qualquer tipo de economia desenvolvida, a divisão do trabalho também é necessária para o desenvolvimento de qualquer tipo de sociedade civilizada. O filósofo, o cientista, o construtor, o comerciante — ninguém poderia desenvolver essas habilidades ou funções se não tivesse espaço para especialização. Além disso, nenhum indivíduo que não viva em uma sociedade desfrutando de uma ampla divisão de trabalho pode empregar suas faculdades ao máximo. Ele não pode concentrar suas faculdades em um campo ou disciplina e desenvolver essa disciplina e suas próprias faculdades mentais. Sem a oportunidade de se especializar naquilo que sabe fazer de melhor, ninguém pode desenvolver plenamente suas faculdades; nenhum homem, então, poderia ser totalmente humano.
Embora uma divisão contínua e avançada do trabalho seja necessária para uma economia e uma sociedade desenvolvidas, a extensão desse desenvolvimento em um determinado momento limita o grau de especialização que qualquer dada economia pode ter. Não há, portanto, lugar para um físico ou um engenheiro de computação em uma ilha primitiva; essas habilidades seriam prematuras no contexto dessa economia existente. Como disse Adam Smith: “a divisão do trabalho é limitada pela extensão do mercado”. O desenvolvimento econômico e social é, portanto, um processo que se reforça mutuamente: o desenvolvimento do mercado permite uma divisão mais ampla do trabalho, que por sua vez permite uma maior extensão do mercado.[3]
Se o escopo do mercado e a extensão da divisão do trabalho se reforçam mutuamente, também o são a divisão do trabalho e a diversidade de interesses e habilidades individuais entre os homens. Pois assim como uma divisão cada vez maior do trabalho é necessária para dar pleno alcance às habilidades e faculdades de cada indivíduo, assim a existência dessa mesma divisão depende da diversidade inata dos homens. Pois não haveria espaço para uma divisão do trabalho se todas as pessoas fossem uniformes e intercambiáveis. (Outra condição para o surgimento de uma divisão do trabalho é a variedade de recursos naturais; áreas de terra específicas na Terra também não são intercambiáveis.) Além disso, logo se tornou evidente na história do homem que a economia de mercado baseada em uma divisão de trabalho era profundamente cooperativa, e que tal divisão multiplicou enormemente a produtividade e, portanto, a riqueza de cada pessoa que participava da sociedade. O economista Ludwig von Mises colocou a questão com muita clareza:
Historicamente, a divisão do trabalho se origina em dois fatos da natureza: a desigualdade das habilidades humanas e a variedade das condições externas da vida humana na Terra. Esses dois fatos são realmente um só: a diversidade da Natureza, que não se repete, mas cria o universo em variedade infinita e inesgotável. […]
Estas duas condições […] são de fato tais que quase forçam a divisão do trabalho na humanidade. Velhos e jovens, homens e mulheres cooperam fazendo uso apropriado de suas várias habilidades. Aqui também está o germe da divisão geográfica do trabalho; o homem vai à caça e a mulher à fonte para buscar água. Se a força e as habilidades de todos os indivíduos e as condições externas de produção fossem iguais em todos os lugares, a ideia de divisão do trabalho nunca poderia ter surgido. […] Nenhuma vida social poderia ter surgido entre homens de igual capacidade natural em um mundo que fosse geograficamente uniforme. […]
Uma vez que o trabalho foi dividido, a própria divisão exerce uma influência diferenciadora. O fato do trabalho ser dividido torna possível o cultivo do talento individual e, assim, a cooperação torna-se cada vez mais produtiva. Através da cooperação, os homens são capazes de alcançar o que estaria além deles como indivíduos. […]
A maior produtividade do trabalho sob a divisão do trabalho é uma influência unificadora. Leva os homens a se considerarem como camaradas em uma luta conjunta pelo bem-estar, em vez de concorrentes em uma luta pela existência.[4]
A liberdade, então, é necessária para o desenvolvimento do indivíduo, e tal desenvolvimento também depende da extensão da divisão do trabalho e da altura do padrão de vida. A economia desenvolvida encoraja e abre espaço para uma especialização e um florescimento enormemente maiores das faculdades do indivíduo do que uma economia primitiva, e quanto maior o grau de tal desenvolvimento, maior o escopo para cada indivíduo.
Se a liberdade e o crescimento do mercado são importantes para o desenvolvimento de cada indivíduo e, portanto, para o florescimento da diversidade e das diferenças individuais, então também existe uma conexão causal entre liberdade e crescimento econômico. Pois é precisamente a liberdade, a ausência ou limitação de restrições ou interferências interpessoais, que prepara o terreno para o crescimento econômico e, portanto, da economia de mercado e da divisão do trabalho desenvolvida. A Revolução Industrial e o corolário e consequente crescimento econômico do Ocidente foram um produto de sua relativa liberdade de iniciativa, de invenção e inovação, de mobilidade e avanço do trabalho. Em comparação com as sociedades de outras épocas e lugares, a Europa Ocidental dos séculos XVIII e XIX e os Estados Unidos foram marcados por uma liberdade social e econômica muito maior — liberdade para se movimentar, investir, trabalhar e produzir — protegidos de muito assédio e interferência do governo. Comparado com o papel do governo em outros lugares, seu papel nestes séculos no Ocidente foi notavelmente mínimo.[5]
Ao permitir amplo espaço para investimento, mobilidade, divisão do trabalho, criatividade e empreendedorismo, a economia livre cria assim as condições para um rápido desenvolvimento econômico. É a liberdade e o livre mercado, como bem apontou Adam Smith, que desenvolvem a “riqueza das nações”. Assim, a liberdade leva ao desenvolvimento econômico, e ambas essas condições, por sua vez, multiplicam o desenvolvimento individual e o desenvolvimento das faculdades do homem individual. De duas maneiras cruciais, então, a liberdade é a raiz; somente o homem livre pode ser plenamente individuado e, portanto, plenamente humano.
Se a liberdade leva a uma divisão cada vez maior do trabalho e ao alcance total do desenvolvimento individual, também leva a uma população crescente. Pois assim como a divisão do trabalho é limitada pela extensão do mercado, a população total também é limitada pela produção total. Um dos fatos marcantes sobre a Revolução Industrial não foi apenas um grande aumento no padrão de vida para todos, mas também a viabilidade de padrões de vida tão amplos para uma população enormemente maior. A área terrestre da América do Norte era capaz de sustentar apenas cerca de um milhão de índios, quinhentos anos atrás, e isso em um nível que mal chegava à subsistência. Mesmo que quiséssemos eliminar a divisão do trabalho, não poderíamos fazê-lo sem literalmente eliminar a grande maioria da atual população mundial.
II.
Concluímos que a liberdade e sua concomitante, a expandida divisão do trabalho, são vitais para o florescimento de cada indivíduo, bem como para a sobrevivência literal da grande maioria da população mundial. Deve nos preocupar muito, então, que ao longo dos últimos dois séculos surgiram poderosos movimentos sociais que se dedicaram, em seu coração, a erradicar todas as diferenças humanas, toda individualidade.
Tornou-se evidente nos últimos anos, por exemplo, que o cerne da complexa filosofia social do marxismo não reside, como parecia nas décadas de 1930 e 1940, nas doutrinas econômicas marxianas: na teoria do valor-trabalho, na conhecida proposta de donidade estatal socialista dos meios de produção e no planejamento central da economia e da sociedade. As teorias e programas econômicos do marxismo são, para usar um termo marxiano, meramente a elaborada “superestrutura” erguida no núcleo interno da aspiração marxiana. Consequentemente, muitos marxistas têm, nas últimas décadas, estado dispostos a abandonar a teoria do valor-trabalho e até mesmo o planejamento socialista centralizado, já que a teoria econômica marxiana tem sido cada vez mais abandonada e a prática do planejamento socialista se mostra impraticável. Da mesma forma, os marxistas da “Nova Esquerda” nos Estados Unidos e no exterior estão dispostos a abandonar a teoria e a prática econômica socialista. O que eles não estão dispostos a abandonar é o coração filosófico do ideal marxista — não o socialismo ou o planejamento socialista, preocupado de qualquer maneira com o que se supõe ser um “estágio” temporário de desenvolvimento, mas o próprio comunismo. É o ideal comunista, o objetivo final do marxismo, que excita o marxista contemporâneo, que envolve suas paixões mais fervorosas. O marxista da Nova Esquerda não tem utilidade para a Rússia soviética porque os soviéticos claramente relegaram o ideal comunista ao futuro mais remoto possível. A Nova Esquerda admira Che Guevara, Fidel Castro, Mao Tse-Tung não apenas por causa de seu papel como revolucionários e líderes de guerrilha, mas mais por causa de suas repetidas tentativas de saltar para o comunismo o mais rápido possível.[6]
Karl Marx foi vago e nebuloso ao descrever o ideal comunista, sem falar no caminho específico para alcançá-lo. Mas uma característica essencial é a erradicação da divisão do trabalho. Ao contrário da crença atual, o agora popular conceito de “alienação” de Marx tinha pouco a ver com um sentimento psicológico de distanciamento ou descontentamento. O cerne do conceito era a “alienação” do indivíduo em relação ao produto do trabalho. Um trabalhador, por exemplo, trabalha em uma siderúrgica. Obviamente, ele próprio consumirá pouco ou nada do aço que produz; ele ganha o valor de seu produto na forma de uma mercadoria-dinheiro e, então, alegremente usa esse dinheiro para comprar o que quiser dos produtos de outras pessoas. Assim, A produz aço, B ovos, C sapatos, etc., e então cada um os troca por produtos dos outros por meio do uso de dinheiro. Para Marx, esse fenômeno do mercado e da divisão do trabalho era um mal radical, pois significava que ninguém consumia nada de seu próprio produto. O metalúrgico tornou-se assim “alienado” do seu aço, o sapateiro dos seus sapatos, etc.
A resposta adequada a esse “problema”, parece-me, é: “E daí?” Por que alguém deveria se importar com esse tipo de “alienação”? Certamente o fazendeiro, o sapateiro e o metalúrgico ficam muito felizes em vender seus produtos e trocá-los por quaisquer produtos que desejem; prive-os dessa “alienação” e eles ficariam muito infelizes, além de morrer de fome. Pois se o fazendeiro não pudesse produzir mais trigo ou ovos do que ele próprio consome, ou o sapateiro mais sapatos do que pode usar, ou o metalúrgico mais aço do que pode usar, é claro que a grande maioria da população rapidamente passaria fome e o resto seria reduzido a uma subsistência primitiva, com uma vida “desagradável, brutal e curta”.[7] Mas para Marx essa condição era o resultado perverso do individualismo e do capitalismo e precisava ser erradicada.
Além disso, Marx era completamente ignorante do fato de que cada participante da divisão do trabalho coopera por meio da economia de mercado, trocando os produtos uns dos outros e aumentando a produtividade e os padrões de vida de todos. Para Marx, as diferenças entre os homens e, portanto, qualquer especialização na divisão do trabalho, é uma “contradição”, e o objetivo comunista é substituir essa “contradição” pela harmonia entre todos. Isso significa que para o marxista quaisquer diferenças individuais, qualquer diversidade entre os homens, são “contradições” a serem eliminadas e substituídas pela uniformidade do formigueiro. Friedrich Engels sustentou que o surgimento da divisão do trabalho destruiu a alegada harmonia e uniformidade sem classes da sociedade primitiva e foi responsável pela divisão da sociedade em classes separadas e conflitantes. Portanto, para Marx e Engels, a divisão do trabalho precisa ser erradicada para abolir o conflito de classes e introduzir a harmonia ideal da “sociedade sem classes”, a sociedade da uniformidade total.[8]
Assim, Marx prevê seu acordo comunista somente “depois que a subordinação escravizadora dos indivíduos sob a divisão do trabalho, e com isso também a antítese entre trabalho mental e físico, tenha desaparecido”.[9] Para Marx, a sociedade comunista ideal é aquela em que, como diz o professor Gray, “todos devem fazer tudo”. Segundo Marx em The German Ideology,
Na sociedade comunista, onde ninguém tem uma esfera de atividade exclusiva, mas cada um pode se aperfeiçoar em qualquer ramo que desejar, a sociedade regula a produção geral e assim me possibilita fazer uma coisa hoje e outra amanhã, caçar de manhã, pescar à tarde, criar gado à noite, criticar depois do jantar, assim como eu quiser, sem nunca me tornar caçador, pescador, pastor ou crítico.[10]
E o marxista August Bebel aplicou consistentemente essa noção diletante ao papel das mulheres:
Em um momento um trabalhador prático em alguma indústria ela é na hora seguinte educadora, professora, enfermeira; na terceira parte do dia ela exerce alguma arte ou cultiva uma ciência; e na quarta parte ela cumpre alguma função administrativa.[11]
O conceito da comuna no pensamento socialista assume sua importância central justamente como meio de erradicar as diferenças individuais. Não é apenas que a comuna é dona de todos os meios de produção entre seus membros. Crucial para o ideal comunal é que todo homem assuma todas as funções, de uma só vez ou em rápida rotação. Obviamente, a comuna tem que subsistir apenas em nada mais do que um nível primitivo, com apenas algumas tarefas comuns, para que esse ideal seja alcançado. Daí a comuna da Nova Esquerda, onde cada pessoa deve se revezar igualmente em todas as tarefas; novamente, a especialização é erradicada e ninguém pode desenvolver suas faculdades ao máximo. Daí a admiração atual por Cuba, que tentou enfatizar incentivos “morais” ao invés de econômicos na produção, e que estabeleceu comunas na Ilha de Pinos. Daí a admiração de Mao, que tentou estabelecer comunas urbanas e rurais uniformes, e que recentemente enviou vários milhões de estudantes para o exílio permanente nas áreas agrícolas fronteiriças, a fim de eliminar a “contradição entre trabalho intelectual e físico”.[12] De fato, no centro da divisão entre a Rússia e a China está o abandono efetivo da Rússia do ideal comunista em face da devoção “fundamentalista” da China ao credo original. A devoção compartilhada à comuna também explica as semelhanças entre a Nova Esquerda, os socialistas utópicos do século XIX,[13] e os anarquistas comunistas, uma ala do anarquismo que sempre compartilhou o ideal comunal com os marxistas.[14]
O comunista negaria que sua sociedade ideal iria suprimir a personalidade de cada homem. Pelo contrário, livre dos limites da divisão do trabalho, cada pessoa desenvolveria plenamente todas as suas capacidades em todas as direções. Todo homem seria totalmente completo em todas as esferas da vida e do trabalho. Como Engels colocou em seu Anti-Dühring, o comunismo daria “a cada indivíduo a oportunidade de desenvolver e exercitar todas as suas faculdades, físicas e mentais, em todas as direções […]”[15] E Lênin escreveu em 1920 sobre a “abolição da divisão do trabalho entre as pessoas […] a educação, escolarização e formação de pessoas com um desenvolvimento integral e uma formação integral, pessoas capazes de fazer tudo. O comunismo está marchando e deve marchar para este objetivo, e o alcançará. […]”[16]
Esse ideal absurdo — do homem que “consegue fazer tudo” — só é viável se (a) todos fizerem tudo muito mal, ou (b) houver pouquíssimas coisas para fazer, ou (c) todos se transformarem milagrosamente em um super-homem. O professor Mises observa apropriadamente que o homem comunista ideal é o diletante, o homem que sabe um pouco de tudo e não faz nada bem. Pois como ele pode desenvolver qualquer uma de suas potências e faculdades se for impedido de desenvolver qualquer uma delas em qualquer extensão sustentada? Como diz Mises sobre a Utopia de Bebel,
A arte e a ciência são relegadas às horas de lazer. Dessa forma, pensa Bebel, a sociedade do futuro “possuirá cientistas e artistas de todos os tipos em números incontáveis”. Estes, de acordo com suas diversas inclinações, prosseguirão seus estudos e suas artes nas horas vagas. […] Todo trabalho mental ele considera como mero diletantismo. […] Mas, no entanto, devemos indagar se, nessas condições, a mente seria capaz de criar aquela liberdade sem a qual não pode existir.
Obviamente, todo trabalho artístico e científico que exija tempo, viagens, educação técnica e grande dispêndio material, estaria totalmente fora de questão.[17]
O tempo e a energia de cada pessoa na Terra são necessariamente limitados; portanto, para desenvolver qualquer uma de suas faculdades ao máximo, ele precisa se especializar e se concentrar em algumas e não em outras. Como Gray escreve,
Que cada indivíduo tenha a oportunidade de desenvolver todas as suas faculdades, físicas e mentais, em todas as direções, é um sonho que alegrará a visão apenas dos simplórios, alheios às restrições impostas pelos estreitos limites da vida humana. Pois a vida é uma série de atos de escolha, e cada escolha é ao mesmo tempo uma renúncia. […]
Até mesmo o habitante do futuro país das fadas de Engels terá que decidir, mais cedo ou mais tarde, se deseja ser arcebispo de Cantuária ou First Sea Lord, se deve procurar se destacar como violinista ou pugilista, se deve escolher saber tudo sobre literatura chinesa ou sobre as páginas escondidas na vida da cavala.[18]
Claro, a única maneira de resolver esse dilema é fantasiar que o Novo Homem Comunista será um super-homem. O marxista Karl Kautsky afirmou que na sociedade futura “surgirá um novo tipo de homem […] um super-homem […] um homem exaltado”. Leon Trotsky profetizou que sob o comunismo
o homem se tornará incomparavelmente mais forte, mais sábio, mais refinado. Seu corpo mais harmonioso, seus movimentos mais rítmicos, sua voz mais musical. […] A média humana se elevará ao nível de um Aristóteles, um Goethe, um Marx. Acima dessas outras alturas surgirão novos picos.[19]
Nos últimos anos, os comunistas intensificaram seus esforços para acabar com a divisão do trabalho e reduzir todos os indivíduos à uniformidade. As tentativas de Fidel Castro de “construir o comunismo” na Ilha dos Pinheiros e a Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung foram repetidas em miniatura pela Nova Esquerda americana em inúmeras tentativas de formar comunas hippies e criar “coletivos” organizacionais nos quais todos fazem tudo sem o benefício da especialização.[20] Em contraste, a Iugoslávia tem sido o desespero silencioso do movimento comunista, movendo-se rapidamente na direção oposta — em direção a cada vez mais liberdade, individualidade e operações de livre mercado — e provou ser influente em liderar os outros países “comunistas” da Europa Oriental (notavelmente, Hungria e Tchecoslováquia) na mesma direção.[21]
III.
Uma forma de avaliar a extensão do desenvolvimento “harmonioso” de todas as faculdades do indivíduo na ausência de especialização é considerar o que realmente aconteceu durante as eras primitivas ou pré-industriais. E, de fato, muitos socialistas e outros oponentes da Revolução Industrial exaltam os períodos primitivo e pré-industrial como uma idade de ouro de harmonia, comunidade e pertencimento social — uma sociedade pacífica e feliz destruída pelo desenvolvimento do individualismo, da Revolução Industrial e da economia de mercado. Em sua exaltação do primitivo e do pré-industrial, os socialistas foram perfeitamente antecipados pelos reacionários do movimento romântico, aqueles homens que ansiavam por reverter a maré do progresso, do individualismo e da indústria e retornar à suposta idade de ouro da era pré-industrial. A Nova Esquerda, em particular, também enfatiza a condenação da tecnologia e da divisão do trabalho, bem como o desejo de “voltar à terra” e a exaltação da comuna e da “tribo”. Como aponta perspicazmente John W. Aldridge, a atual Nova Esquerda constitui praticamente uma tribo geracional que exibe todas as características de um rebanho uniforme e intercambiável, com pouca ou nenhuma individualidade entre seus membros.[22]
Da mesma forma, o reacionário alemão do início do século XIX, Adam Müller, denunciou a
tendência viciosa de dividir o trabalho em todos os ramos da indústria privada. […] [A] divisão do trabalho nas grandes cidades ou nas províncias industriais ou mineiras divide o homem, o homem completamente livre, em rodas, rolos, raios, eixos, etc., impõe-lhe um escopo totalmente unilateral no já unilateral campo da provisão de um único desejo.[23]
Os principais conservadores franceses do início do século XIX, Bonald e de Maistre, que idealizaram a ordem feudal, denunciaram a ruptura pelo individualismo da ordem social pré-existente e da coesão social.[24] O reacionário francês contemporâneo, Jacques Ellul, em The Technological Society, um livro muito apreciado pela Nova Esquerda, condena “nossas fábricas desumanizadas, nossos sentidos insatisfeitos […] nosso distanciamento da natureza”. Na Idade Média, em contraste, afirma Ellul, “o homem procurou espaços abertos […] a possibilidade de se locomover […] de não colidir constantemente com outras pessoas”.[25] Enquanto isso, do lado socialista, o influente The Great Transformation, do historiador econômico Karl Polanyi, faz dessa tese da ruptura de uma harmonia social anterior pelo individualismo, a economia de mercado e a divisão do trabalho o tema central do livro.
De sua parte, a adoração do primitivo é uma extensão lógica da adoração do pré-industrial. Essa adoração por intelectuais sofisticados modernos vai desde o “bom selvagem” de Rousseau e a idolatria dessa criatura pelo movimento romântico, até a adoração dos Panteras Negras por intelectuais brancos.[26] Qualquer outra patologia que a adoração do primitivo reflita, uma parte básica dela é um ódio profundamente arraigado à diversidade individual. Obviamente, quanto mais primitiva e menos civilizada for uma sociedade, menos diversa e individualizada ela pode ser.[27] Também faz parte desse primitivismo reflete um ódio ao intelecto e suas obras, já que o florescimento da razão e da intelecção leva à diversidade e desigualdade da realização individual.
Para que o indivíduo avance e se desenvolva, a razão e o intelecto precisam ser ativos, devem incorporar a mente do indivíduo trabalhando e transformando os materiais da realidade. Desde a época de Aristóteles, a filosofia clássica apresentava o homem como apenas realizando a si mesmo, sua natureza e sua personalidade por meio de uma ação propositada sobre o mundo. É dessa ação racional e propositada que as obras da civilização se desenvolveram. Em contraste, o movimento romântico sempre exaltou a passividade da criança que, necessariamente ignorante e imatura, apenas reage passivamente ao seu ambiente, em vez de agir para modificá-lo. Essa tendência de exaltar a passividade e os jovens, e de denegrir o intelecto, alcançou sua atual personificação na Nova Esquerda, que venera tanto a juventude per se quanto uma atitude passiva de ignorância e espontaneidade sem propósito. A passividade da Nova Esquerda, seu desejo de viver de forma simples e em “harmonia” com “a terra” e os supostos ritmos da natureza, remonta completamente ao movimento romântico rousseauniano. Como o movimento romântico, é uma rejeição consciente da civilização e dos homens diferenciados em nome da “tribo” primitiva, ignorante e como um rebanho.[28]
Se razão, propósito e ação devem ser desprezados, então o que os substitui no panteão romântico são “sentimentos” espontâneos e não analisados. E como a gama de sentimentos é relativamente pequena em comparação com as realizações intelectuais e, de qualquer forma, não é objetivamente conhecida por outra pessoa, a ênfase nos sentimentos é outra maneira de eliminar a diversidade e a desigualdade entre os indivíduos.
Irving Babbitt, um grande crítico do romantismo, escreveu sobre o movimento romântico:
Todo o movimento está repleto de elogios à ignorância e àqueles que ainda desfrutam de suas vantagens inapreciáveis – o selvagem, o camponês e, acima de tudo, a criança. Pode-se dizer que o rousseauniano descobriu a poesia da infância […] mas no que às vezes pareceria um sacrifício bastante pesado de racionalidade. Em vez de consentir que as coisas sejam desabrochadas pela análise, deve-se, como nos diz Coleridge, afundar-se no devoto estado de admiração infantil. No entanto, crescer eticamente não é afundar, mas lutar penosamente para a frente. Afirmar o contrário é proclamar sua incapacidade de amadurecimento. […] [O romântico] está pronto para afirmar que o que vem à criança espontaneamente é superior ao esforço moral deliberado do homem maduro. Os discursos de todos os sábios são, de acordo com Maeterlinck, superados pela sabedoria inconsciente da criança passageira.[29]
Outra crítica perspicaz do romantismo e do primitivismo foi escrita por Ludwig von Mises. Ele observa que “toda a tribo dos românticos” denuncia a especialização e a divisão do trabalho. “Para eles, o homem do passado que desenvolveu suas faculdades ‘harmoniosamente’ é o ideal: um ideal que, infelizmente, não mais inspira nossa era degenerada. Eles recomendam retrocesso na divisão do trabalho.” Com os socialistas superando seus companheiros românticos a esse respeito.[30] Mas os homens primitivos ou pré-industriais têm o privilégio de se desenvolver livre e harmoniosamente? Mises responde:
É inútil procurar o homem harmoniosamente desenvolvido no início da evolução econômica. O sujeito econômico quase autossuficiente como o conhecemos no camponês solitário de vales remotos não mostra nada daquele desenvolvimento nobre e harmonioso de corpo, mente e sentimento que os românticos atribuem a ele. A civilização é um produto do lazer e da paz de espírito que só a divisão do trabalho pode tornar possível. Nada é mais falso do que supor que o homem apareceu pela primeira vez na história com uma individualidade independente e isso apenas durante a evolução [da sociedade] […] ele perdeu […] sua independência espiritual. Toda a história, evidência e observação da vida dos povos primitivos é diretamente contrária a esta visão. O homem primitivo carece de toda individualidade em nosso sentido. Dois ilhéus dos Mares do Sul se parecem muito mais do que dois londrinos do século XX. A personalidade não foi concedida ao homem desde o início. Foi adquirido no curso da evolução da sociedade.[31]
Ou podemos notar a crítica de Charles Silberman às rapsódias de Jacques Ellul sobre os “ritmos tradicionais da vida e da natureza” vividos pelo homem pré-industrial, em comparação com “fábricas desumanizadas […] nosso distanciamento da natureza”. Silberman pergunta:
Mas com o que devemos contrastar este mundo desumanizado? A bela e harmoniosa vida vivida, digamos, pela camponesa chinesa ou vietnamita, que trabalha nos campos perto da natureza, doze horas por dia — aproximadamente as condições sob as quais as grandes mulheres (e homens) trabalharam […] através de toda a história humana? Pois esta é a condição que Ellul idealiza.
E, quanto ao hino de Ellul à Idade Média como sendo móvel, espaçosa e sem aglomeração:
Isso teria sido uma notícia surpreendente para o camponês medieval, que vivia com sua esposa e filhos, outros parentes e provavelmente também animais em uma cabana de palha de um quarto. E mesmo para a nobreza, havia realmente mais possibilidade de “movimentar-se” na Idade Média, quando as viagens eram a pé ou a cavalo, do que hoje, quando os aceiros passam férias sabáticas na Europa?[32]
Supõe-se que o selvagem não seja apenas “nobre”, mas também supremamente feliz. Dos rousseaunianos ao que Erich Fromm chamou de “o paraíso infantil” de Norman O. Brown e Herbert Marcuse, os românticos exaltaram a felicidade proporcionada pelo espontâneo e infantil. Para Aristóteles e para os filósofos clássicos, a felicidade era agir de acordo com a natureza única e racional do homem. Para Marcuse, qualquer ação intencional e racional é, por definição, “repressiva”, à qual ele contrasta o estado “liberado” do jogo espontâneo. Além da destituição universal que a proposta de abolição do trabalho traria, o resultado seria uma profunda infelicidade, pois nenhum indivíduo seria capaz de se realizar, sua individualidade desapareceria em grande parte, pois em um mundo de jogo “polimorfo” todos seriam praticamente iguais.
Se considerarmos a suposta felicidade do homem primitivo, devemos também considerar que sua vida foi, na famosa frase de Hobbes, “desagradável, bruta e curta”. Havia poucos auxílios médicos contra doenças; não havia nada contra a fome, pois em um mundo sem mercados inter-regionais e pouco acima da subsistência, qualquer restrição à oferta local de alimentos dizimaria a população. Realizando os sonhos dos românticos, a tribo primitiva é uma criatura passiva de seu ambiente e não tem meios de agir para superá-lo e transformá-lo. Portanto, quando a oferta local de alimentos dentro de uma área se esgota, a tribo “despreocupada” morre en masse.
Além disso, devemos perceber que o primitivo enfrenta um mundo que não pode compreender, uma vez que não se envolveu em uma investigação racional e científica de seu funcionamento. Sabemos o que é uma tempestade e, portanto, tomamos medidas racionais contra ela; mas o selvagem não sabe e, portanto, supõe que o Deus do Trovão está descontente com ele e precisa ser propiciado com sacrifícios e ofertas votivas. Uma vez que o selvagem tem apenas um conceito limitado de um mundo unido pela lei natural (um conceito que emprega razão e ciência), ele acredita que o mundo é governado por uma hoste de espíritos caprichosos e demônios, cada um dos quais só pode ser propiciado por ritual ou magia, e por um ofício sacerdotal de feiticeiros que se especializam em sua propiciação.[33] O renascimento da astrologia e credos místicos semelhantes na Nova Esquerda marca uma reversão a tais formas primitivas de magia. Tão medroso é o selvagem, tão preso a um tabu irracional e ao costume de sua tribo, que não consegue desenvolver sua individualidade.
Se os costumes tribais paralisavam e reprimiam o desenvolvimento de cada indivíduo, também o faziam os vários sistemas de castas e redes de restrição e coerção nas sociedades pré-industriais que forçavam todos a seguir os passos hereditários da ocupação de seu pai. Cada criança sabia desde o nascimento que estava condenada a pisar onde seus ancestrais haviam ido antes dela, independentemente de habilidade ou inclinação ao contrário. A “harmonia social”, o “sentimento de pertencimento” proporcionado pelo mercantilismo, pelas guildas ou pelo sistema de castas, fornecia tal contentamento que seus membros deixavam as agonias do sistema quando tinham uma oportunidade. Dada a liberdade de escolha, os membros da tribo abandonam o seio de sua tribo para vir para as cidades mais livres e “atomísticas” em busca de empregos e oportunidades. É curioso, de fato, que aqueles românticos que anseiam por restaurar a mítica idade de ouro da casta e do status se recusem a permitir a cada indivíduo a liberdade de escolher entre o mercado, por um lado, ou a casta e a comuna tribal, por outro. Invariavelmente, a nova idade de ouro tem que ser imposta pela coerção.
É, de fato, uma coincidência que os nativos de países subdesenvolvidos, quando têm uma chance, invariavelmente abandonam sua “cultura popular” em nome de modos ocidentais, padrões de vida e “coca-colalização”? Em poucos anos, por exemplo, o povo do Japão ficou encantado em abandonar sua cultura e costumes tradicionais centenários e voltar-se para as conquistas materiais e a economia de mercado do Ocidente. As tribos primitivas também, tendo uma chance, estão ansiosas para se diferenciar e desenvolver uma economia de mercado, para abandonar sua “harmonia” estagnada e substituir sua magia pelo conhecimento da lei descoberta. O eminente antropólogo, Branislaw Malinowski, apontou que os primitivos permitem que a magia cubra apenas aquelas áreas da natureza que eles são ignorantes; naquelas áreas onde eles passaram a entender os processos naturais em ação, a magia não é, muito sensatamente, empregada.[34]
Um exemplo particularmente notável do ávido desenvolvimento de uma economia de mercado generalizada entre tribos primitivas é o caso pouco divulgado da África Ocidental.[35] E Bernard Siegel apontou que quando, como entre os penajachel da Guatemala, uma sociedade primitiva se torna grande e tecnológica e socialmente complexa, uma economia de mercado inevitavelmente acompanha esse crescimento, repleta de especialização, competição, compras à vista, demanda e oferta, preços e custos, etc.[36]
Há, portanto, ampla evidência de que mesmo os próprios membros de tribos primitivas não gostam de seu primitivismo e aproveitam a primeira oportunidade para escapar dele; o principal baluarte do amor pelo primitivismo parece repousar entre os decididamente não-primitivos intelectuais românticos.
Outra instituição primitivista que foi saudada por muitos cientistas sociais é o sistema da “família extendida”, uma harmonia e status supostamente rompidos pela “família nuclear” individualista do Ocidente moderno. No entanto, o sistema de família extendida tem sido responsável por incapacitar o indivíduo criativo e produtivo, bem como por reprimir o desenvolvimento econômico. Assim, o desenvolvimento da África Ocidental foi impedido pelo conceito de família extendida de que, se um homem prospera, ele tem o dever de compartilhar essa recompensa com uma série de parentes, drenando assim a recompensa por sua produtividade e prejudicando seu incentivo para o sucesso, enquanto incentivando os parentes a viver ociosamente com o auxílio família. E os membros produtivos da tribo também não parecem muito felizes com esse vínculo social supostamente harmonioso. O professor Bauer aponta que
muitos admitem em discussão privada que temem essas extensas obrigações. […] O medo das obrigações do sistema familiar é parcialmente responsável pelo uso generalizado de tecidos e bijuterias como saídas para a poupança, em detrimento de formas de investimento mais produtivas e com maior probabilidade de atrair a atenção dos parentes.
E muitos africanos desconfiam dos bancos, “temendo que eles revelem o tamanho de suas contas a membros de suas famílias. Eles, portanto, preferem manter suas poupanças sob a lareira ou enterradas no chão”.[37]
De fato, a comunidade primitiva, longe de ser feliz, harmoniosa e idílica, é muito mais propensa a ser dominada pela suspeita mútua e pela inveja dos mais bem-sucedidos ou mais favorecidos, uma inveja tão difundida que paralisa, pelo medo de sua presença, todo desenvolvimento econômico pessoal ou geral. O sociólogo alemão Helmut Schoeck, em seu importante trabalho recente sobre a inveja, cita numerosos estudos sobre esse efeito incapacitante generalizado. Assim, o antropólogo Clyde Kluckhohn encontrou entre os navajos a ausência de qualquer conceito de “sucesso pessoal” ou “realização pessoal”; e tal sucesso foi automaticamente atribuído à exploração de outros e, portanto, o índio navajo mais próspero sente-se sob constante pressão social para doar seu dinheiro. Allan Holmberg descobriu que o índio siriono da Bolívia come sozinho à noite porque, se ele comer durante o dia, uma multidão se reúne ao seu redor para olhar com ódio invejoso. O resultado entre os siriono é que, em reação a essa pressão generalizada, ninguém compartilhará comida voluntariamente com ninguém. Sol Tax descobriu que a inveja e o medo da inveja em “uma pequena comunidade onde todos os vizinhos observam e onde todos são vizinhos” explicavam a falta de progresso, a lentidão da mudança em direção a uma economia produtiva entre os índios da Guatemala. E quando uma tribo de índios de Pueblo mostrou o início da especialização e da divisão do trabalho, a inveja de seus companheiros de tribo os impeliu a tomar medidas para acabar com esse processo, incluindo a destruição física da propriedade daqueles que pareciam de alguma forma melhores do que seus companheiros.
Oscar Lewis descobriu um medo extremamente penetrante da inveja dos outros em uma aldeia de índios mexicanos, um medo que produzia intenso sigilo. Lewis escreveu:
O homem que fala pouco, guarda seus assuntos para si mesmo e mantém alguma distância entre si e os outros tem menos chance de criar inimigos, de ser criticado ou invejado. Um homem geralmente não discute seus planos de comprar, vender ou fazer uma viagem.[38]
O professor Schoeck comenta:
é difícil imaginar o que significa para o desenvolvimento econômico e técnico de uma comunidade quando, quase automaticamente e por uma questão de princípio, a dimensão futura é banida das relações e conversas humanas, quando nem mesmo pode ser discutida. A inveja onipresente, o medo dela e daqueles que a abrigam, isola essas pessoas de qualquer tipo de ação comunitária voltada para o futuro. […] Todo esforço, toda preparação e planejamento para o futuro podem ser empreendidos apenas por seres socialmente fragmentados e reservados.[39]
Além disso, nesta aldeia mexicana ninguém avisará ou contará a ninguém sobre perigo iminente à propriedade do outro; não há qualquer senso de solidariedade social humana.
Entre os índios de Aritama na Colômbia, os Reichel-Dolmatoffs relataram:
Cada indivíduo vive em constante medo da agressão mágica dos outros, e a atmosfera social geral na aldeia é de suspeita mútua, de perigo latente e hostilidade oculta, que permeiam todos os aspectos da vida. A razão mais imediata para a agressão mágica é a inveja. Tudo o que pode ser interpretado como uma vantagem pessoal sobre os outros é invejado: boa saúde, vantagens econômicas, boa aparência física, popularidade, uma vida familiar harmoniosa, um vestido novo. Todos esses e outros aspectos implicam prestígio e, com ele, poder e autoridade sobre os outros. A magia agressiva é, portanto, destinada a impedir ou destruir esse poder e atuar como uma força niveladora.[40]
Os Reichel-Dolmatoffs também observaram que se um membro de um grupo em Aritama trabalhasse mais rápido ou melhor do que seus colegas, seu local de trabalho era marcado com uma cruz antes de ele chegar na manhã seguinte, e seus colegas invejosos oravam a Deus para fazer este trabalhador mais capaz lento e cansado.
Finalmente, Watson e Samora descobriram que a principal razão para o fracasso de um grupo de cidadãos de língua espanhola de classe baixa de um município montanhoso no sul do Colorado em se equiparar à comunidade anglo-americana de classe alta foi a amarga inveja do grupo espanhol de qualquer um dos seus que conseguisse ascender para cima. Qualquer um que trabalhe seu caminho para cima é considerado um homem “que se vendeu aos anglos”, “que subiu nas costas de seu povo”.[41]
O antropólogo Eric Wolf até cunhou o termo “inveja institucionalizada” para descrever tais instituições difundidas, incluindo a prática e o medo da magia negra nessas sociedades primitivas.[42] Schoeck observa:
Inveja institucionalizada […] ou o medo onipresente disso, significa que há pouca possibilidade de avanço econômico individual e nenhum contato com o mundo exterior através do qual a comunidade pode esperar progredir. Ninguém se atreve a mostrar nada que possa levar as pessoas a pensar que ele estava melhor. Inovações são improváveis. Os métodos agrícolas permanecem tradicionais e primitivos, em detrimento de toda a aldeia, porque qualquer desvio da prática anterior esbarra nas limitações impostas pela inveja.[43]
E Schoeck conclui apropriadamente:
Não há nada a ser visto aqui da comunidade próxima que supostamente existe entre os povos primitivos em tempos pré-afluentes — quanto mais pobre, afirma-se, maior o senso de comunidade. A teoria sociológica teria evitado muitos erros se esses fenômenos tivessem sido devidamente observados e avaliados um século atrás. O mito de uma idade de ouro, quando a harmonia social prevalecia porque cada homem tinha quase tão pouco quanto o outro, o caloroso e generoso espírito comunitário das sociedades simples, era de fato, em sua maior parte, apenas um mito, e os cientistas sociais deveriam saber melhor do que criar a partir dele um conjunto de padrões utópicos com os quais criticar suas próprias sociedades.[44]
Em suma, as críticas de Ludwig von Mises contra o romantismo não parecem exageradas:
O romantismo é a revolta do homem contra a razão, assim como contra a condição sob a qual a natureza o obrigou a viver. O romântico é um sonhador; ele facilmente consegue em imaginação desrespeitar as leis da lógica e da natureza. O homem que pensa e age racionalmente tenta livrar-se do desconforto das necessidades insatisfeitas pela ação econômica e pelo trabalho; ele produz para melhorar sua posição. O romântico […] imagina os prazeres do sucesso mas nada faz para alcançá-los[:] não remove os obstáculos; ele apenas os remove na imaginação. […] Ele odeia trabalho, economia e razão.
O romântico dá por certo todos os dons de uma civilização social e deseja, além disso, tudo de bom e belo que, segundo ele, tempos e criaturas distantes tiveram ou têm a oferecer. Cercado pelos confortos da vida urbana europeia, ele deseja ser um rajá indiano, beduíno, corsário ou trovador. Mas ele vê apenas aquela parte da vida dessas pessoas que lhe parece agradável. […] A natureza perigosa de sua existência, a pobreza comparativa de suas circunstâncias, suas misérias e sua labuta — essas coisas sua imaginação ignora com tato: tudo é transfigurado por um brilho rosado. Comparada com esse ideal onírico, a realidade parece árida e superficial. Há obstáculos a superar que não existem no sonho. […] Aqui há trabalho a fazer, incessantemente, assiduamente. […] Aqui é preciso arar e semear se se deseja colher. O romântico não escolhe admitir tudo isso. Obstinado como uma criança, ele se recusa a reconhecê-lo. Ele ridiculariza e zomba; ele despreza e detesta o burguês.[45]
A atitude romântica, ou primitivista, também foi brilhantemente criticada pelo filósofo espanhol Ortega y Gasset:
é possível haver povos perenemente primitivos […] aqueles que permaneceram no crepúsculo imóvel e congelado, que nunca avança para o meio-dia.
Isso é o que acontece no mundo que é mera Natureza. Mas isso não acontece no mundo da civilização que é o nosso. A civilização não está “apenas aí”, não é autossustentável. É artificial. […] Se você quer fazer uso das vantagens da civilização, mas não está preparado para se preocupar com a manutenção da civilização — você está perdido. Em um instante você se encontra sem civilização. […] A floresta primitiva aparece em seu estado nativo. […] A selva é sempre primitiva e, vice-versa, todo primitivo é mera selva.[46]
Ortega acrescenta que o tipo de homem que ele vê surgindo, o moderno “homem-massa”, “acredita que a civilização na qual nasceu e da qual faz uso é tão espontânea e autoprodutiva quanto a Natureza”. Mas o homem-massa, o pastor, também se caracteriza por seu desejo de eliminar os indivíduos que diferem da massa: “A massa […] não deseja compartilhar a vida com quem não é dela. Tem um ódio mortal de tudo o que não é ele mesmo.[47]
IV.
A esquerda, é claro, não expressa suas demandas em termos de erradicar a diversidade; o que ela busca soa semanticamente muito mais agradável: igualdade. É em nome da igualdade que a esquerda busca todos os tipos de medidas, desde a tributação progressiva até o estágio final do comunismo.
Mas o que, filosoficamente, é “igualdade”? O termo não deve ser deixado sem análise e aceito pelo valor nominal. Tomemos três entidades: A, B e C. A, B e C são considerados “iguais” entre si (ou seja, A=B=C) se uma característica particular for encontrada na qual as três entidades são uniforme ou idêntico. Resumindo, aqui estão três homens individuais: A, B e C. Cada um pode ser semelhante em alguns aspectos, mas diferente em outros. Se cada um deles tiver precisamente 5’10” de altura, eles serão iguais um ao outro em altura. Segue-se de nossa discussão sobre o conceito de igualdade que A, B e C podem ser completamente “iguais” entre si apenas se forem idênticos ou uniformes em todas as características — em suma, se todos eles forem, como o mesmo tamanho de porca ou parafuso, totalmente intercambiáveis. Vemos, então, que o ideal de igualdade humana só pode implicar a uniformidade total e a eliminação total da individualidade.
Já é tempo, então, para aqueles que prezam a liberdade, a individualidade, a divisão do trabalho e a prosperidade econômica e a sobrevivência, parar de conceder a suposta nobreza do ideal de igualdade. Com muita frequência, os “conservadores” concederam o ideal de igualdade apenas para criticar sua “impraticabilidade”. Filosoficamente, não pode haver separação entre teoria e prática. Medidas igualitárias não “funcionam” porque violam a natureza básica do homem, do que significa para o homem individual ser verdadeiramente humano. O apelo à “igualdade” é um canto de sereia que só pode significar a destruição de tudo o que prezamos como seres humanos.
É irônico que o termo “igualdade” nos traga sua conotação favorável de um uso passado radicalmente diferente. Pois o conceito de “igualdade” alcançou sua ampla popularidade durante os movimentos liberais clássicos do século XVIII, quando significava não uniformidade de status ou renda, mas liberdade para todo e qualquer homem, sem exceção. Em suma, “igualdade” naqueles dias significava a libertação e o conceito individualista de plena liberdade para todas as pessoas. Assim, o bioquímico Roger Williams aponta corretamente que “a frase ‘livres e iguais’ na Declaração de Independência foi uma paráfrase infeliz de uma declaração melhor contida na Declaração de Direitos da Virgínia […] ‘todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes’. Em outras palavras, os homens podem ser igualmente livres sem serem uniformes.”[48]
Este credo libertário foi formulado com particular convicção por Herbert Spencer em sua “Lei da Liberdade Igual” como o núcleo fundamental sugerido de sua filosofia social:
a felicidade do homem só pode ser obtida pelo exercício de suas faculdades. […] Mas o cumprimento deste dever pressupõe necessariamente liberdade de ação. O homem não pode exercer suas faculdades sem certo alcance. Ele deve ter liberdade de ir e vir, de ver, de sentir, de falar, de trabalhar; obter comida, roupas, abrigo e prover para todas e cada uma das necessidades de sua natureza. […] Para exercer suas faculdades, ele precisa ter liberdade para fazer tudo o que suas faculdades realmente o impelem a fazer. […] Portanto, ele tem um direito a essa liberdade. Isso, porém, não é direito de um, mas de todos. Todos são dotados de faculdades. Todos são obrigados a […] [exercer] elas. Todos, portanto, devem ser livres para fazer aquelas coisas em que consiste o exercício delas. Ou seja, todos devem ter direito à liberdade de ação.
E daí surge necessariamente uma limitação. Pois se os homens têm reivindicações semelhantes àquela liberdade que é necessária para o exercício de suas faculdades, então a liberdade de cada um deve ser limitada pela liberdade semelhante de todos. […] Portanto, chegamos à proposição geral de que todo homem pode reivindicar a mais plena liberdade para exercer suas faculdades compatíveis com a posse de igual liberdade por qualquer outro homem.[49]
Assim, apenas a igualdade específica da liberdade — a visão mais antiga da igualdade humana — é compatível com a natureza básica do homem. A igualdade de condição reduziria a humanidade a uma existência de formigueiro. Felizmente, a natureza individuada do homem, aliada à diversidade geográfica da terra, torna inatingível o ideal de igualdade total. Mas uma quantidade enorme de danos — a paralisação da individualidade, bem como a destruição econômica e social — poderia ser gerada na tentativa.
Passemos da igualdade ao conceito de desigualdade, a condição que existe quando todo homem não é idêntico a todos os outros em todas as características. É evidente que a desigualdade decorre inevitavelmente da especialização e da divisão do trabalho. Portanto, uma economia livre levará não apenas à diversidade de ocupações, com um homem como padeiro, outro como ator, um terceiro como engenheiro civil, etc., mas desigualdades específicas também surgirão na renda monetária e no status e escopo de controle dentro de cada ocupação. Cada pessoa, na economia de livre mercado, tenderá a ganhar uma renda monetária igual ao valor atribuído à sua contribuição produtiva para satisfazer os desejos e demandas dos consumidores. Na terminologia econômica, cada homem tenderá a ganhar uma renda igual à sua “produtividade marginal”, à sua produtividade particular na satisfação das demandas do consumidor. Claramente, em um mundo de diversidade individual desenvolvida, alguns homens serão mais inteligentes, outros mais alertas e perspicazes do que o restante da população. Outros ainda, entretanto, estarão mais interessados nas áreas que obtêm maiores ganhos monetários; aqueles que tiverem sucesso na exploração de petróleo bruto colherão maiores recompensas monetárias do que aqueles que permanecerem em empregos de secretária.
Muitos intelectuais costumam denunciar a “injustiça” do mercado ao conceder uma renda monetária muito maior a uma estrela de cinema do que, digamos, a um assistente social, recompensando assim o “material” muito mais do que o “espiritual”; é impressionante que, se a alegada “bondade” do assistente social de fato reside em sua “espiritualidade”, então é certamente inapropriado e inconsistente exigir que ela receba mais comodidades “materiais” (dinheiro) vis-à-vis estrela de cinema. Na sociedade livre, aqueles que são capazes de fornecer bens e serviços que os consumidores valorizam e estão dispostos a comprar receberão exatamente o que os consumidores estão dispostos a gastar. Aqueles que persistem em ocupações de preços mais baixos, seja porque preferem o trabalho ou porque não são suficientemente capazes nas áreas mais bem pagas, dificilmente podem reclamar quando ganham um salário mais baixo.
Se, então, a desigualdade de renda é o corolário inevitável da liberdade, também o é a desigualdade de controle. Em qualquer organização, seja uma empresa de negócios, uma loja ou um clube de bridge, sempre haverá uma minoria de pessoas que ascenderão à posição de líderes e outras que permanecerão como seguidores entre os membros. Robert Michels descobriu isso como uma das grandes leis da sociologia: “A Lei de Ferro da Oligarquia”. Em toda atividade organizada, não importa a esfera, um pequeno número se tornará os líderes “oligárquicos” e os outros os seguirão.
Na economia de mercado, os líderes, sendo mais produtivos em satisfazer os consumidores, inevitavelmente ganharão mais dinheiro do que os membros ordinários. Dentro de outras organizações, a diferença será apenas de controle. Mas, em ambos os casos, habilidade e interesse selecionarão aqueles que chegarão ao topo. O melhor e mais dedicado produtor de aço ascenderá à liderança da corporação siderúrgica; os mais capazes e enérgicos tenderão a ascender à liderança no clube de bridge local; e assim por diante.
Esse processo de habilidade e dedicação encontrando seu próprio nível funciona melhor e mais suavemente, é verdade, em instituições como empresas de negócios na economia de mercado. Pois aqui toda empresa se coloca sob a disciplina de lucros monetários e renda obtidos com a venda de um produto adequado aos consumidores. Se gerentes ou trabalhadores falham no trabalho, uma perda de lucros fornece um sinal muito rápido de que algo está errado e que esses produtores devem se corrigir. Nas organizações não mercantis, onde o lucro não fornece um teste de eficiência, é muito mais fácil que outras qualidades extrínsecas à atividade real desempenhem um papel na seleção dos membros da oligarquia. Assim, um clube de bridge local pode selecionar seus líderes, não apenas por habilidade e dedicação às atividades do clube, mas também por características raciais ou físicas extrínsecas preferidas pelos membros. Esta situação é muito menos provável quando ocorrerem perdas monetárias por ceder a tais fatores externos.
Precisamos apenas olhar ao nosso redor para cada atividade ou organização humana, grande ou pequena, política, econômica, filantrópica ou recreativa, para ver a universalidade da Lei de Ferro da Oligarquia. Pegue um clube de bridge com cinqüenta membros e, independentemente das formalidades legais, meia dúzia ou mais estará comandando o show. Michels, de fato, descobriu a Lei de Ferro observando a regra rígida, burocrática e oligárquica que permeava os partidos social-democratas na Europa no final do século XIX, mesmo que esses partidos fossem supostamente dedicados à igualdade e à abolição da divisão do trabalho.[50] E é precisamente a desigualdade obviamente congelada de renda e poder, e o domínio da oligarquia, que desiludiu totalmente a Nova Esquerda que busca a igualdade na União Soviética. Ninguém exalta Brezhnev ou Kosygin.
É a tentativa igualitária da Nova Esquerda de escapar da Lei de Ferro da desigualdade e da oligarquia que explica seus esforços desesperados para acabar com a liderança da elite dentro de suas próprias organizações. (Certamente não houve indicação de qualquer desaparecimento da elite do poder na tão anunciada Cuba ou na China.) O impulso inicial em direção ao igualitarismo na Nova Esquerda surgiu no conceito de “democracia participativa”. Em vez dos membros de uma organização elegerem uma liderança de elite, assim dizia a teoria, cada pessoa participaria igualmente de todas as tomadas de decisão da organização. A propósito, foi provavelmente esse senso de participação direta e intensa de cada indivíduo que representou o entusiasmo inebriante das massas nos primeiros estágios dos regimes revolucionários na Rússia soviética e em Cuba — um entusiasmo que rapidamente diminuiu à medida que o inevitável a oligarquia começou a assumir o controle e a participação em massa a morrer.
Embora os pretensos democratas participativos tenham feito críticas agudas ao governo burocrático em nossa sociedade, o próprio conceito, quando aplicado, vai rapidamente contra a Lei de Ferro. Assim, qualquer pessoa que tenha assistido a sessões de qualquer organização engajada na democracia participativa conhece o intenso tédio e a ineficiência que se desenvolvem rapidamente. Pois se cada pessoa deve participar igualmente de todas as decisões, o tempo dedicado à tomada de decisão deve tornar-se quase interminável e os processos da organização se tornam a própria vida dos participantes. Esta é uma das razões pelas quais muitas organizações da Nova Esquerda rapidamente começam a insistir que seus membros vivam em comunas e dediquem suas vidas inteiras à organização — na verdade, para fundir suas vidas com a organização. Pois se eles realmente vivem e buscam a democracia participativa, dificilmente podem fazer outra coisa. Mas, apesar dessa tentativa de salvar o conceito, a inevitável ineficiência grosseira e o tédio agravado garantem que todos, exceto os mais intensamente dedicados, abandonarão a organização. Em resumo, se é que pode funcionar, a democracia participativa só pode funcionar em grupos tão pequenos que são, na verdade, os “líderes” desprovidos de seguidores.
Concluímos que, para ter sucesso, qualquer organização deve eventualmente cair nas mãos de “profissionais” especializados, de uma minoria de pessoas dedicadas às suas tarefas e aptas a realizá-las. Curiosamente, foi Lênin quem, apesar de sua promessa ao ideal supremo do comunismo igualitário, reconheceu que uma revolução também, para ter sucesso, deve ser liderada por uma minoria, uma “vanguarda” de profissionais dedicados.
Além disso, é o intenso impulso igualitário da Nova Esquerda que explica sua curiosa teoria da educação — uma teoria que causou enorme impacto no movimento estudantil contemporâneo nas universidades americanas nos últimos anos. A teoria sustenta que, em contraste com os conceitos “antiquados” de educação, o professor não sabe mais do que qualquer um de seus alunos. Todos, então, são “iguais” em condição; um não é melhor em nenhum sentido do que qualquer outro. Como só um imbecil proclamaria de fato que o aluno sabe tanto sobre o conteúdo de qualquer disciplina quanto seu professor, essa reivindicação de igualdade é sustentada pela defesa da abolição do conteúdo em sala de aula. Esse conteúdo, afirma a Nova Esquerda, é “irrelevante” para o aluno e, portanto, não faz parte do processo educacional. O único assunto adequado para a sala de aula não é um corpo de verdades, nem leituras ou tópicos atribuídos, mas uma discussão inconclusiva e flutuante dos sentimentos do aluno, uma vez que apenas seus sentimentos são verdadeiramente “relevantes” para o aluno. E como o método de aulas implica, é claro, que o professor que dá aulas sabe mais do que os alunos a quem ele transmite conhecimento, as aulas também devem desaparecer. Tal é a caricatura de “educação” proposta pela Nova Esquerda.
Uma questão que esta doutrina traz à mente, e que a Nova Esquerda nunca realmente respondeu, é claro, é por que os alunos deveriam estar na faculdade para começar. Por que eles também não conseguiam realizar essas discussões abertas sobre seus sentimentos em casa ou na confeitaria da vizinhança? De fato, nessa teoria educacional, a escola como tal não tem nenhuma função particular; torna-se, com efeito, a confeitaria local e também se funde com a própria vida. Mas então, novamente, por que ter uma escola? E por que, de fato, os alunos deveriam pagar mensalidades e os professores receber um salário por seus serviços inexistentes? Se todos são verdadeiramente iguais, por que só o corpo docente é pago?
De qualquer forma, a ênfase nos sentimentos em vez do conteúdo racional nos cursos novamente garante uma escola igualitária; ou melhor, a escola como tal pode desaparecer, mas os “cursos” certamente seriam igualitários, pois se apenas “sentimentos” devem ser discutidos, então certamente os sentimentos de todos são aproximadamente “iguais” aos de todos os outros. Uma vez que a razão, o intelecto e as conquistas tenham pleno domínio, o demônio da desigualdade rapidamente levantará sua feia cabeça.
Se, então, a desigualdade natural de habilidade e interesse entre os homens deve tornar as elites inevitáveis, o único caminho sensato é abandonar a quimera da igualdade e aceitar a necessidade universal de líderes e seguidores. A tarefa do libertário, a pessoa dedicada à ideia da sociedade livre, não é investir contra as elites que, como a necessidade de liberdade, decorrem diretamente da natureza do homem. O objetivo do libertário é antes estabelecer uma sociedade livre, uma sociedade na qual cada homem é livre para encontrar seu melhor nível. Em tal sociedade livre, todos serão “iguais” apenas em liberdade, embora diversos e desiguais em todos os outros aspectos. Nesta sociedade as elites, como todas as outras, estarão livres para subir ao seu melhor nível. Na terminologia jeffersoniana, descobriremos “aristocracias naturais” que alcançarão proeminência e liderança em todos os campos. O objetivo é permitir o surgimento dessas aristocracias naturais, mas não o domínio das “aristocracias artificiais” — aquelas que governam por meio da coerção. Os aristocratas artificiais, os oligarcas coercitivos, são os homens que ascendem ao poder invadindo a liberdade de seus semelhantes, negando-lhes sua liberdade. Ao contrário, os aristocratas naturais vivem em liberdade e harmonia com seus semelhantes, e ascendem exercendo sua individualidade e suas mais altas habilidades a serviço de seus semelhantes, seja em uma organização ou produzindo eficientemente para os consumidores. De fato, os oligarcas coercitivos invariavelmente sobem ao poder suprimindo as elites naturais, juntamente com outros homens; os dois tipos de liderança são antitéticos.
Tomemos um exemplo hipotético de um possível caso de tal conflito entre diferentes tipos de elites. Um grande grupo de pessoas se envolve voluntariamente no futebol profissional, vendendo seus serviços para um público consumidor ávido. Subindo rapidamente ao topo está uma elite natural dos melhores — os mais capazes e dedicados — jogadores de futebol, treinadores e organizadores do jogo. Aqui temos um exemplo da ascensão de uma elite natural em uma sociedade livre. Então, a elite do poder no controle do governo decide em sua sabedoria que todos os esportes profissionais, e especialmente o futebol, são maus. O governo então decreta que o futebol profissional é proibido e ordena que todos participem de um clube eurítmico local como substituto de participação em massa. Aqui os governantes do governo são claramente uma oligarquia coercitiva, uma “elite artificial”, usando a força para reprimir uma elite voluntária ou natural (assim como o resto da população).
A visão libertária de liberdade, governo, individualidade, inveja e elites coercitivas versus naturais nunca foi apresentada de forma mais concisa ou com maior entusiasmo do que por H.L. Mencken:
Todo governo, em sua essência, é uma conspiração contra o homem superior: seu único objetivo permanente é oprimi-lo e paralisá-lo. Se for aristocrática em organização, então procura proteger o homem que é superior apenas na lei contra o homem que é superior de fato; se for democrático, então procura proteger o homem que é inferior em todos os sentidos contra ambos. Uma de suas funções primárias é arregimentar os homens pela força, torná-los tão semelhantes quanto possível e tão dependentes uns dos outros quanto possível, buscar e combater a originalidade entre os homens. Tudo o que pode ver em uma ideia original é uma mudança potencial e, portanto, uma invasão de suas prerrogativas. O homem mais perigoso para qualquer governo é aquele que é capaz de pensar nas coisas por si mesmo, sem se importar com as superstições e tabus prevalecentes.[51]
Da mesma forma, o escritor libertário Albert Jay Nock viu nos conflitos políticos entre esquerda e direita “simplesmente uma luta entre dois grupos de homens-massa, um grande e pobre, o outro pequeno e rico. […] O objeto da disputa eram os ganhos materiais resultantes do controle do maquinário do Estado. É mais fácil apoderar-se da riqueza (dos produtores) do que produzi-la; e enquanto o Estado fizer da apreensão de riqueza uma questão de privilégio legalizado, a disputa por esse privilégio continuará.[52]
Envy, de Helmut Schoeck, é um argumento poderoso para a visão de que o impulso igualitário moderno para o socialismo e doutrinas semelhantes é um favorecimento à inveja do diferente e do desigual, mas a tentativa socialista de eliminar a inveja por meio do igualitarismo nunca pode esperar ser bem-sucedida. Pois sempre haverá diferenças pessoais, como aparência, habilidade, saúde e boa ou má sorte, que nenhum programa igualitário, por mais rigoroso que seja, pode eliminar e sobre as quais a inveja será capaz de fixar suas preocupações.
[1] Sobre as inter-relações entre liberdade, diversidade e o desenvolvimento de cada indivíduo, veja a obra clássica de Wilhelm von Humboldt, The Limits of State Action (Nova York: Cambridge University Press, 1969). Sobre a liberdade como necessária para o desenvolvimento da individualidade, veja também Josiah Warren, Equitable Commerce (Nova York: Burt Franklin, 1965) e Stephen Pearl Andrews, The Science of Society (Londres: C.W. Daniel, 1913).
[2] Os economistas Bauer e Yamey definem convincentemente o desenvolvimento econômico como “a ampliação do leque de alternativas abertas às pessoas como consumidores e como produtores”. Peter T. Bauer e Basil S. Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries (Cambridge: Cambridge University Press, 1957), p. 151.
[3] Veja George J. Stigler, “The Division of Labor is Limited by the Extent of the Market”, Journal of Political Economy (junho de 1951), p. 193.
[4] Ludwig von Mises, Socialism: An Economic and Sociological Analysis (New Haven, Conn.: Yale University Press, 1951), pp. 292–95 e 303.
[5] Os historiadores têm nos lembrado nas últimas décadas que nem na Inglaterra nem nos Estados Unidos o governo se limitou estritamente ao ideal do laissez faire. É verdade; mas devemos comparar esta era com o papel do governo em dias anteriores — e posteriores — para ver o significado da diferença. Assim, cf. Karl Wittfogel, Oriental Despotism (New Haven, Connecticut: Yale University Press, 1957).
[6] A Nova Esquerda, por exemplo, ignora e despreza o marechal Tito, apesar de seu papel igualmente proeminente como revolucionário marxista, líder de guerrilha e rebelde contra o ditador russo soviético. A razão, como veremos mais adiante, é porque Tito foi pioneiro na mudança do marxismo para uma filosofia individualista e uma economia de mercado.
[7] É difícil, claro, ver como serviços intangíveis poderiam ser produzidos sem “alienação”. Como pode um professor ensinar, por exemplo, se não lhe é permitido “alienar” os seus serviços docentes prestando-os aos seus alunos?
[8] Assim, veja Alexander Gray, The Socialist Tradition (Londres: Longmans, Green, 1947), pp. 306, 328.
[9] Karl Marx, Critique of the Gotha Programme (Nova York: International Publishers, 1938), p. 10.
[10] Citado em Gray, The Socialist Tradition, p. 328. Gray acrescenta divertidamente: “Um curto fim de semana em uma fazenda pode ter convencido Marx de que o próprio gado pode ter alguma objeção a ser criado dessa maneira casual, à noite.”
[11] August Bebel, em Women and Socialism. Citado em Mises, Socialism, p. 190n.
[12] Uma reportagem recente revelou que a China agora suavizou seu ataque ao trabalho intelectual. A política de intercâmbio de estudantes e trabalhadores parece ter funcionado mal, e constatou-se que “a falta de professores e de formação técnica prejudicou o desenvolvimento e a produção industrial nos últimos anos”. Além disso, “os trabalhadores muitas vezes parecem não ter sido temperados, mas suavizados por sua exposição a uma vida mais sedentária, já que muitos estudantes, em vez de achar a vida na fazenda gratificante, fugiram da China ou se mataram”. Lee Lescase, “China Softens Attitude on Profs. School Policy”, The Washington Post (23 de julho de 1970), p. A12.
[13] Sobre os socialistas utópicos, veja Mises, Socialism, p. 168.
[14] É provável que a devoção particular de Mao ao ideal comunista tenha sido influenciada por ele ter sido anarquista antes de se tornar marxista.
[15] Citado em Gray, The Socialist Tradition, p. 328.
[16] Itálico como de Lenin. V.I. Lenin, Left-Wing Communism: An Infantile Disorder (Nova York: International Publishers, 1940), p. 34.
[17] Mises, Socialism, p. 190.
[18] Gray, The Socialist Tradition, p. 328.
[19] Citado em Mises, Socialism, p. 164.
[20] Assim, uma das principais críticas ao periódico da Nova Esquerda, The Guardian, por seu rebelde cindido, The Liberated Guardian, era que o primeiro funcionava da mesma forma que qualquer revista “burguesa”, com editores especializados, datilógrafos, revisores, equipes comerciais, etc. Este último é gerido por um “coletivo” no qual, afirma-se, todos realizam todas as tarefas sem especialização. A mesma crítica, junto com a mesma solução, foi aplicada pelo caucus das mulheres que confiscou o semanário da Nova Esquerda, Rat. Alguns dos grupos de “Libertação das Mulheres” têm sido tão radicais no esforço de extirpar a individualidade que se recusam a identificar os nomes de membros, escritores ou porta-vozes individuais.
[21] Assim, um choque para os comunistas ortodoxos em todo o mundo foi o Programa de 1958 da Liga dos Comunistas da Iugoslávia, que declarava que o “interesse pessoal [do indivíduo] […] é a força motriz do nosso desenvolvimento social. […] A objetividade da categoria de interesse pessoal reside no fato de que o socialismo [da Iugoslávia] […] não pode sujeitar a felicidade pessoal do homem a quaisquer ‘objetivos’ ulteriores ou ‘objetivos mais elevados’, pois o objetivo mais elevado do socialismo é a felicidade pessoal do homem”. De Kommunist (Belgrado), 8 de agosto de 1963. Citado em R.V. Burks, “Yugoslavia: Has Tito Gone Bourgeois” East Europe (agosto de 1965): 2–14. Veja também T. Peter Svennevig, “The Ideology of the Yugoslav Heretics”, Social Research (primavera de 1960): 39–48. Para ataques de comunistas ortodoxos, veja Shih Tung-Hsiang, “The Degeneration of the Yugoslav Economy Owned by the Whole People”, Peking Review (12 de junho de 1964): 11–16; e “Peaceful Transition from Socialism to Capitalism?” Monthly Review (março de 1964): 569–90.
[22] John W. Aldridge, In the Country of the Young (Nova York: Harper & Row, 1970).
[23] Citado em Mises, Socialism, p. 304.
[24] Sobre a forte influência desses pensadores reacionários no anti-individualismo dos marxistas e socialistas do século XIX, veja em particular Leon Bramson, The Political Context of Sociology (Princeton, N.J.: Princeton University Press, 1961), pp. 12–16 e passim.
[25] Veja a crítica de Ellul em Charles Silberman, The Myths of Automation (Nova York: Harper & Row, 1966), pp. 104–05.
[26] Assim, veja o perspicaz artigo satírico de Tom Wolfe, “Radical Chic: That Party at Lenny’s”, New York (8 de junho de 1970).
[27] Esse culto ao primitivo permeia o livro de Polanyi, que a certa altura aplica seriamente o termo “nobre selvagem” aos cafres da África do Sul. Karl Polanyi, The Great Transformation (Boston: Beacon Press, 1957), p. 157.
[28] Tanto os aspectos passivos quanto os tribais da cultura da Nova Esquerda foram incorporados em seu ideal da “Nação Woodstock”, na qual centenas de milhares de jovens indiferenciados e parecidos com rebanhos chafurdavam passivamente na lama ouvindo sua música ritual tribal.
[29] Irving Babbitt, Rousseau and Romanticism (Nova York: Meridian Books, 1955), pp. 53–54. A ênfase da Nova Esquerda na passividade, no primitivismo, no irracional e na dissolução da individualidade pode explicar a atual popularidade da filosofia taoísta e budista. Veja ibid., pp. 297ff.
[30] Mises, Socialism, p. 304.
[31] Ibid., p. 305.
[32] Silberman, The Myths of Automation, pp. 104–05.
[33] Nem a magia usada por tribos primitivas é qualquer evidência de fins superiores e “idealistas”, em oposição a fins mundanos e “materialistas”. Pelo contrário, os ritos mágicos eram meios doentios e errôneos pelos quais as tribos esperavam alcançar fins materialistas como uma boa colheita, chuva, etc. Assim, o Culto da Carga da Nova Guiné, ao observar os europeus obtendo alimentos do exterior enviando pedaços de papel, imitou os europeus escrevendo frases ritualísticas em pedaços de papel e enviando-os para o mar, após o que esperaram pelas cargas do exterior. Cf. Ludwig von Mises, Epistemological Problems of Economics (Princeton, N.J.: D. Van Nostrand, 1960), pp. 62–66, 102–05.
[34] Bronislaw Malinowski, Magic, Science, Religion and Other Essays (Nova York: Doubleday Anchor Books, 1955), pp. 27–31. Veja também Mises, Epistemological Problems of Economics.
[35] Veja a discussão inspiradora em Peter T. Bauer, West African Trade (Cambridge: Cambridge University Press, 1954).
[36] Bernard J. Siegel, “Review of Melville J. Herskovits, Economic Anthropology”, American Economic Review (junho de 1953): 402. Sobre o desenvolvimento do individualismo entre os pondo da África do Sul, veja Bauer e Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries, p. 67n. Veja também Raymond Firth, Human Types (Nova York: Mentor Books, 1958), p. 122; Sol Tax, Penny Capitalism: A Guatemalan Indian Economy (Washington, D.C., 1953); e Raymond Firth e Basil S. Yamey, eds., Capital, Saving and Credit in Peasant Societies (Chicago: Aldine, 1963).
[37] Bauer, West African Trade, p. 8. Veja também Bauer e Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries, pp. 64-67. Da mesma forma, o professor S. Herbert Frankel relata como os africanos ocidentais costumam esperar na entrada dos bancos para atacar seus parentes e exigir dinheiro quando eles saem. Qualquer homem que acumule dinheiro deve fazer de tudo para enganar seus parentes sobre seu status real. Citado em Helmut Schoeck, Envy: A Theory of Social Behavior (Nova York: Harcourt, Brace & World, 1970), pp. 59-60. Sobre a capacidade de resposta dos nativos africanos aos incentivos econômicos do mercado, veja (além de Bauer, (West African Trade) Peter Kilby, “African Labor Productivity Reconsidered”, Economic Journal (junho de 1961), pp. 273–91.
[38] Os trabalhos citados são Clyde Kluckhohn, The Navaho (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1946) e Navaho Witchcraft (1944; Boston: Beacon Press, 1967); Allan R. Holmberg, Nomads of the Lon Bow: The Siriono of Eastern Bolivia (Washington, D.C.: U.S. Government Printing Office, 1950); Sol Tax, “Changing Consumption in Indian Guatemala”, Economic Development and Cultural Change (1957); e Oscar Lewis, Life in a Mexican Village: Tepoztlan Restudied (Urbana: University of Illinois Press, 1951). Veja Schoeck, Envy, pp. 26–61.
[39] Clyde Kluckhohn, The Navaho and Navaho Witchcraft, p. 50.
[40] De Gerardo e Alicia Reichel-Dolmatoff, The People of Aritama: The Cultural Personality of a Colombian Mestizo Village (Chicago: University of Chicago Press, 1961), p. 396. Citado em Schoeck, Envy, pp. 51–52.
[41] James B. Watson e Julian Samora, “Subordinate Leadership in a Bicultural Community: An Analysis”, American Sociological Review 19, n.° 4 (agosto de 1954): 413–21.
[42] Eric R. Wolf, “Types of Latin American Peasantry: A Preliminary Discussion”, American Anthropologist 57, n.° 3 (junho de 1955): 460.
[43] Reichel-Dolmatoff, The People of Aritama, citado Schoeck, Envy, p. 47.
[44] Ibid., p. 31.
[45] Mises, Socialism, pp. 463–64. Veja José Ortega y Gasset, The Revolt of the Masses (Nova York: W.W. Norton, 1932), pp. 63–65.
[46] Ortega y Gasset, The Revolt of the Masses, pp. 97.
[47] Ibid., pp. 98, 84. Para Ortega, o grande perigo iminente é que o homem-massa usará cada vez mais o Estado “para esmagar sob ele qualquer minoria criativa que o perturbe — perturbe-o em qualquer ordem das coisas: na política, na indústria.” Ibid., pág. 133.
[48] Roger J. Williams, Free and Unequal: The Biological Basis of Individual Liberty (Austin, Texas: University of Texas Press, 1953), pp. 4–5. Williams acrescenta: “Nosso amor pela liberdade, que parece ser inerente a todos nós, não se baseia diretamente em nossas desigualdades? Se ao nascer todos nós possuíssemos os mesmos gostos potenciais […] nos importaríamos em ser livres para persegui-los como desejamos individualmente? […] Parece-me claro que a ideia de liberdade surgiu diretamente dessa variabilidade humana. Se fôssemos todos iguais, não haveria razão para desejar a liberdade; ‘viver minha própria vida’ seria uma expressão vazia e sem sentido.” Ibid., pp. 5, 12.
[49] Herbert Spencer, Social Statics (Londres: John Chapman, 1851), pp. 76-78. No restante do livro, Spencer desenvolve as implicações concretas de seu princípio básico. Para uma crítica da Lei da Liberdade Igual, veja Murray N. Rothbard, Power and Market (Menlo Park, Calif.: Institute for Humane Studies, 1970), pp. 159–60.
[50] Robert Michels, Political Parties (Glencoe, Illinois: Free Press, 1949). Veja também o brilhante trabalho de Gaetano Mosca, The Ruling Class (Nova York: McGraw-Hill, 1939), que enfoca a inevitabilidade de uma “classe dominante” minoritária exercendo poder no governo.
[51] H.L. Mencken, A Mencken Chrestomathy (Nova York: Alfred A. Knopf, 1949), p. 145.
[52] Albert Jay Nock, Memoirs of a Superfluous Man (Nova York: Harper, 1943), p. 121.