A Pornografia é Feminina

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Me parece que essa ideia de que a pornografia feminina é sempre violência acredita veementemente que a humanidade surgiu há 10 anos atrás. Para entender isso a fundo, você precisa levar algumas coisas em consideração sobre as quais não se costuma ponderar normalmente. 

A primeira coisa a entender é que a sexualidade das mulheres em geral começa há alguns milhares de anos como uma expressão própria da natureza da monogamia. Veja bem, a sexualidade do homem no seu quesito biológico é literalmente voltada a proliferação da espécie. Sendo assim, o homem está normalmente voltado a ter o máximo de mulheres que possa. 

A limitação auto-imposta da monogamia dentro de uma perspectiva do relacionamento homem-mulher nos leva a entender que não mais estávamos expressando a sexualidade masculina, mas sim a sexualidade feminina. E quais são algumas das características básicas da sexualidade feminina sob as quais nós podemos pensar essa monogamia? 

Uma das características principais da mulher é a perpetuação dos melhores genes possíveis, essa transmutação possui efeitos nos próprios gostos femininos e se dá por meio de características físicas como o formato do queixo, envergadura das costas, tamanho das mãos,  por meio de características reprodutivas como o tamanho do pênis e cheiro do homem e por meio de características sociais como a capacidade de empatia e proteção dos iguais. 

Essas características físicas seriam responsáveis pelo que há de possibilidade real no adquirir recursos para a prole nascida. As características reprodutivas seriam responsáveis por garantir a própria perpetuação desses ideias na prole. As características sociais seriam responsáveis por garantir a perpetuação dessa prole em uma comunidade, na qual nós teriamos o apoio mútuo e a ideia de que casais periféricos tinham o mesmo valor do que os casais que lideravam. 

Essas ideias são importantíssimas para entendermos a sexualidade feminina justamente porque são elementos biológicos que precedem o processo de socialização, sendo aquilo que os possibilita. Tendo isso em vista, nós podemos começar a refletir acerca da própria industria pornográfica. Vejamos alguns elementos que caracterizam a maior parte dos pornôs:

Foco no prazer feminino

Uma das coisas que não ficam muito claras para as mulheres de forma geral é o porque das mulheres que participam dos pornôs fazerem o possível para parecerem que estão sentindo prazer. Deixe-me dar a resposta masculina para essa questão: se a mulher não sente prazer no sexo, ou seja, o sexo foi apenas um ato físico de penetração, toques e afins, ele não é visto como algo a ser valorizado pelos homens.

Os homens necessitam desse tipo de ação explícita para enxergarem consentimento no ato e só então poderem ter prazer. Alias, toda a dinâmica do ato sexual é sempre determinada e enxergada pela mulher, sendo ela a mais importante na medida em que ao dizer o não, encerra imediatamente o ato sexual. Na verdade, o próprio sexo ultraviolento é muito mais fantasiado por mulheres que homens, como se pode perceber nessa pesquisa e não tem relação com um sentimento de culpa sexual como poderia ser argumentado como demonstrado pela pesquisa.

O ato de estupro é considerado claramente um disruptor na dinâmica social e mesmo que os homens tenham uma sexualidade claramente voltada a ter o máximo de parceiras o possível, a sexualidade feminina impera dentro da dinâmica do pornô consumido pelo homem, restringindo as próprias possibilidades de sua sexualidade. A sexualidade feminina não encontra em si mesma um limite para a possibilidade do sexo coercitivo, já que aquele cujo qual comportamento fosse capaz de superar as dinâmicas sociais imediatas e força-la ao ato, seria um homem que tivesse uma capacidade física e reprodutiva elevada. 

Um parceiro desse tipo, ainda que não tivesse os elementos sociais necessários para a absorção da prole na comunidade, já possuí os elementos físicos e reprodutivos para tal, sendo visto numa ideia mais emotiva e diretamente física como um parceiro com qualificações mínimas para o ato sexual. 

A questão da submissão

Enquanto é claramente verdade que um dos elementos naturais da questão homem-mulher é a competição por poder, na medida em que a conquista do homem é o ato de submissão da mulher, uma coisa não fica clara aqui como deveria ficar: se o valor do homem é dado pela possibilidade de subjugar a mulher, como é que o homem poderia ser o instrumento inicialmente mais valoroso dessa relação?

Observe bem, se a ideia do homem por a mulher em submissão é sobre ser capaz de ser aquele o qual ela irá apresentar um comportamento de submissão e o que é exatamente essa capacidade é justamente dado pela mulher, qual o valor em si mesmo que tem o homem? Nem mesmo valor sexual intrínseco o homem possuí. 

A mulher possuí a regua sobre o qual irá determinar se o homem é merecedor dessa submissão e essa mesma submissão é feita apenas nos termos femininos, se a mulher decidir que não irá consentir em qualquer momento do ato, aquele ato se torna imediatamente um ato coercitivo e é igualado a qualquer estupro. Não há submissão verdadeira num escravo se aquilo que seu dono pode ordenar era determinado desde o início pela própria vontade do escravo. 

A evidência mais sincera desse tipo de ocorrência é a existência de um instituto no BDSM chamado “safe word” ou palavra de segurança. O BDSM é geralmente voltado a elementos mais violentos e de maior abrangência que o sexo chamado baunilha. Mas, mesmo nesse tipo de sexo, a ideia é que a “safe word” seja um instrumento que irá parar imediatamente o ato sexual e é usada justamente pela pessoa submissa. 

Alias, a própria Camille Paglia trata muito bem essa questão com uma frase que é notória: 

O discurso anti-pornografia das feministas sempre ignora a gigantesca indústria do pornô gay masculino, já que qualquer menção a isso derrubaria completamente o argumento absurdo de que a pornografia é, por definição, a subordinação da mulher.

Camille Paglia

A questão da indústria

Bem, para além da pornografia em si, nós temos um argumento antigo que gira em torno do desgaste físico e da exposição aplicada na própria confeçção do ato pornográfico. O que parece estar sendo ignorado aqui é que isso já está precificado: as atrizes ganham 5 a 10 vezes mais do que os próprios atores conforme reportagem.

Outra razão que seria muito trazida seria a questão de que a industria pornográfica é em números gerais profundamente mortífera para as mulheres na medida que as inseriria numa cultura de violência sexual nos mesmos termos da MacKinnon em seu Feminism Unmodified. Acredito que pelo fato de que esse argumento simplesmente supõe literalmente uma sociedade patriarcal que tivesse criado as estruturas e conjecturas para que esse tipo de pressão social pudesse ser trazida e não demonstra quaisquer evidências empíricas para tal, ele esteja totalmente desmontado por uma perspectiva matriarcal da sociedade como bem trazida pela Universidade Libertária nesse texto

O que sobra desse tipo de argumento são alguns insights voltados a violência real sofrida pelas atrizes e uma questão de não escolha típica de estruturas marxistas. Bem, poderiamos tentar submeter isso a um crivo racional próprio, nos questionando em que medida qualquer ação é livre, mas provavelmente é mais interessante demonstrar opiniões femininas e em primeira mão sobre o assunto. Demonstrando que a solução do problema é tratar pornografia como literalmente qualquer mercado, seguem linhas gerais da grande feminista, ex-aluna de Hans Hermann Hoppe, Laurie Shrage: 

Por várias décadas, as organizações de trabalhadoras sexuais de orientação feminista têm demonstrando que, contra Kant e MacKinnon, o trabalho que eles tem desempenhado pode ser realizado com dignidade pessoal e não precisa prejudicar o respeito pelas mulheres. A existência e os esforços das associações de profissionais do sexo mostram que as mulheres podem alcançar igualdade social e respeito sem suprimir a pornografia ou o trabalho sexual, pois a igualdade das mulheres realmente depende de alcançar igualdade de tratamento nos termos da lei e no local de trabalho, na escola, rua, cozinha e quarto. 

Além disso, a igualdade no quarto ou em outro lugar não exige manter o sexo fora das ruas, mas quando é realizado em qualquer lugar, por salários, exige as mesmas proteções e privilégios que outras formas de trabalho. Isso significa que as profissionais do sexo devem ter um ambiente legal e social tolerante no qual trabalhar, saúde e segurança, proteções, contratos de trabalho executórios e assim por diante. 

Além de abordando os problemas comuns a todas as relações de mercado, muitas trabalhadoras sexuais estão lidando com os preconceitos históricos que ainda existem em relação ao trabalho e elas mesmas. Porque o trabalho sexual viola as normas convencionais de moral sexual e respeitabilidade feminina, as profissionais do sexo são vulneráveis ​​a subordinação social, desrespeito e piedade. Para contrariar sua imagem como meros instrumentos de outros, muitos estão exigindo o direito de falar por e apresentar suas vidas em termos positivos, publicando livros, tornando-se especialistas acadêmicos e críticos culturais, organizando conferências, produzindo obras de arte etc.

(Exposing the fallacies of anti-porn feminism, 2005)

E linhas gerais da ex-atriz pornô e feminista Nina Hartley:

“Conforme eu examino minha vida, eu descobro uma série de influências difusas que me levaram a optar pela carrêira em filmes adultos. Eu descobri que atuar na produção de material sexualmente explícito era satisfatório em muitos níveis. Primeiramente, providenciava um ambiente fisicamente e psicologicamente seguro para minhas fantasias exibicionistas. Em segundo lugar, vinha o fato de que me oferecia uma arena sem igual para crescer como uma performista, tanto sexual quanto não-sexualmente.  Em terceiro lugar, me oferecia um material que eu gostava de ver para meu próprio prazer e por último, o meio me oferecia oportunidades de explorar uma sexualidade feminina positiva, uma sexualidade que havia sido negada para nós em outros tempos.”

Sex, Morality and Law, 1987

É muito importante esclarecer que a intenção desse texto não é entregar uma ideia de que a pornografia seja algo a ser incentivado. Um católico ou qualquer outro crítico moral poderia continuar a acreditar veementemente que a pornografia possui muitos malefícios e que deveria ser evitada fortemente. É outra discussão se poderiamos vir a proibir legamente a pornografia e trabalhos sexuais baseado nesses critérios que é melhor abordada por Walter Block em seu Defendendo o Indefensável.  

A grande questão aqui gira em torno de que a premissa moral é praticamente inexistente naqueles que não vêem no sexo não-matriominal um elemento de deturpação moral, o que é praticamente regra entre as feministas que tanto evocam a violência da pornografia, pornografia essa que é em si tão feminina.

Autores:

Daniel Miorim
Malboro

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