Por Ludwig M. Lachmann
[Tradução de Causes and Consequences of the Inflation of Our Time por José Aldemar, retirado de Capital, Expectations, and the Market Process, parte 5, cap. 1]
1.
O assunto com o qual eu vou lidar é de natureza econômica, mas, ao mesmo tempo, histórica. Embora processos inflacionários tenham sido a preocupação dos economistas por quase tanto tempo quanto se pode dizer que o pensamento econômico coerente existiu, qualquer comparação entre características marcantes da “inflação de nossa época” e aquelas de outras épocas, tais como meu assunto claramente exige, envolve a perspectiva da história. Essa natureza dupla da minha tarefa apresenta um problema de método e abordagem. Esse problema é proveniente não de uma incompatibilidade fundamental entre a abordagem econômica e histórica, mas de uma certa tendência inerente à análise macroeconômica moderna. Na análise econômica, bem como em todo pensamento generalizante, nós construímos “modelos” mentais da realidade ao deduzir consequências necessárias a partir de hipóteses arbitrariamente escolhidas. É claro que estamos todos cientes de que quanto mais “realistas” são as nossas hipóteses, mais próximas da realidade podemos esperar que sejam nossas conclusões. Mas uma vez que é sempre impossível incluir toda a realidade no nosso conjunto de hipóteses, a seleção dos componentes desse conjunto não pode ser arbitrária. O historiador estudando as mudanças que uma determinada sociedade tem passado ao longo do tempo enfrenta o mesmo problema de seleção, uma vez que ele também precisa se restringir a um número limitado de características. Não há, então, em princípio, no que diz respeito à seleção arbitrária de tópicos para inclusão no modelo analítico do economista ou no “modelo observacional” do historiador, nenhuma incompatibilidade ente as duas abordagens.
Mas o recente desenvolvimento da teoria econômica na direção de uma forte ênfase nos problemas macroeconômicos, analisados em termos de variáveis e relações entre elas, torna, na verdade, muito improvável que um economista que construa um modelo de inflação e um historiador que estude processos inflacionários ao longo do tempo, selecionem os mesmos aspectos como tendo importância primária, e que terminem por abstrair dos mesmos aspectos como de significância apenas secundária. O economista moderno, imerso como ele está em exames de sistemas de relações funcionais entre macrovariáveis, tem de abstrair dos propósitos humanos, atitudes e ideias que as fundamentam, enquanto o historiador dificilmente pode segui-lo nessa prática, pois essas próprias coisas formam o objeto problema essencial de toda a história.
Hoje em dia escutamos muito sobre funções de consumo, modelos insumo-produto e relações capital-produto. Ninguém se incomoda em explicar por que, num mundo de mudanças rápidas de atitudes, gostos e técnicas, variáveis como essas deveriam subsistir, nem por que, se há mudanças, tais mudanças deveriam seguir um padrão definitivo e previsível. Mas deve ser claro que onde nossa tarefa é a explicação da mudança no tempo, nenhum argumento no qual as ideias humanas e atitudes que poderiam promover tal mudança são ignoradas ou abstraídas será merecedor de uma consideração séria. Quando tentamos explicar o caráter específico dos processos inflacionários de nosso tempo, deve estar como objetivo, acima de tudo, assegurar que ideias e atitudes tenham um lugar proeminente no nosso esquema de explicação.
2.
Quando olhamos para qualquer um dos nossos índices de preços, sejam preços de atacado ou preços ao consumidor, de antes ou após 1958, é o aspecto implacável de suas altas anuais que deixam a impressão mais avassaladora. Entre 1939 e 1966, não encontramos nem um único ano no qual o índice de preços não foi mais alto do que no ano precedente e mais baixo do que no próximo.
Dois aspectos contrastantes dessa situação nos parecem chamar atenção. Por um lado, é impossível não se surpreender com a extensão na qual esse estado de coisas vem hoje a ser comumente aceito como uma, talvez indesejável, mas inevitável característica da vida econômica na sociedade Ocidental moderna. Todos nós sabemos que estamos vivendo em um mundo no qual os preços podem subir, mas nunca cair. Quando falamos de “combater a inflação”, o que realmente significa é que nós esperamos que a taxa de aumento de preços seja reduzida. Talvez, em nossos momentos mais ousados, até mesmo imaginemos um período de preços estáveis que poderia durar alguns anos. Mas eu nunca encontrei ninguém, economista ou leigo, que realmente pense que o contínuo aumento dos preços nas últimas três décadas poderia um dia ser revertido, nem que nós viveremos para ver algo como uma década de queda de preços. Eu imagino que se tal pessoa surgisse nessa conferência, ela iria imediatamente criar um alvoroço entre os demais.
Economistas, por outro lado, notavelmente lentos em apreender e absorver mudanças históricas no pensamento e nas instituições que acontecem durante o seu próprio período de vida, têm sido, até então, relutantes em sondar as implicações dos fatos mencionados para a teoria e prática. Discussões recentes da então chamada “inversão da curva de juros” evidenciam essa relutância, cujas principais razões devem ser buscadas na história do pensamento econômico. Muito da nossa reflexão clássica, neoclássica e Keynesiana sobre preços e problemas monetários está consciente ou inconscientemente baseada na hipótese de um mundo de preços flexíveis em ambas as direções, para cima e para baixo; nossa relutância em reformular algumas de nossas ferramentas conceituais em um molde mais apropriado para um mundo de mudança unidirecional de preço talvez não seja tão surpreendente. Tampouco indesculpável. Quando nos lembramos que todos os economistas modernos são treinados para pensar em termos de equilíbrio, em termos de um “sistema econômico” coerente no qual o “sistema de preços” faz parte, descobriremos quão fácil é entender por que suas mentes se confundem sobre o que Sir John Hicks chamou de O Método do Preço Fixo,[1] uma descrição pela qual, como o autor afirma, “não implica […] que preços nunca sejam permitidos a mudar—apenas que eles não necessariamente mudam quando há desequilíbrio de oferta e demanda.”[2]
Afinal, mesmo Keynes, em seu Treatise on Money, de 1930, assumiu preços flexíveis em ambas as direções. É simplesmente natural que os fatos da nova situação devam gradualmente permear nosso pensamento, e que somos lentos, talvez mais lentos do que deveríamos, para chegar a lidar com eles.
Por outro lado, frequentemente não é percebida a real situação que confrontamos. Ela gradualmente veio a existir, até onde posso cogitar, ao longo da década de 1920. Antes daquela época, os preços frequentemente caiam, mesmo nos anos imediatamente após a Primeira Guerra Mundial. Naquele mundo, tão diferente do nosso, era geralmente tomado como certo que períodos de aumento de preços seriam seguidos por queda de preços.
Talvez o exemplo mais chocante dessa mudança possa ser encontrada no fato de que, cem anos atrás, no que já era uma economia industrial, era tomado como certo que os resultados da inflação teriam que ser eliminados pela deflação e queda nos preços: a eliminação do “período Greenback” na América nos anos pós-Guerra Civil assumiu a forma de um processo prolongado de deflação. Entre 1865 e 1879, com um moderado aumento no estoque de moeda, que havia sido inflacionado entre 1861 e 1865, um rápido aumento no produto social bruto causou um “drástico e permanente declínio de preços”. Como Schumpeter afirma, naqueles quatorze anos, “permitiu-se deixar o organismo econômico crescer livremente”. Como o Professor Friedman e o senhor Schwartz descreveram, “O nível de preços caiu para metade de seu nível inicial ao longo de menos que quinze anos e, ao mesmo tempo, o crescimento econômico prosseguiu a passos rápidos. […] Suas coincidências remetem sérias dúvidas quanto a validade da agora amplamente defendida visão de que preços deflacionários e rápido crescimento econômico são incompatíveis”.[3]
Enquanto os preços caiam pela metade dentro de quatorze anos, o produto nacional líquido dobrou entre 1869 e 1879. O produto nacional per capita (nos preços de 1929) aumentaram de 188 para 295 dólares.[4] O rápido crescimento não ficou restrito às indústrias de manufatura, nas quais o emprego cresceu por um terço durante a década.
“O número de fazendas aumentou em mais de cinquenta por cento de 1870 até 1880 nos EUA como um todo. O valor médio por acre aparentemente aumentou apesar do declínio agudo nos preços de produtos agrícolas—clara evidência de um aumento na produtividade econômica. A produção de carvão, ferro-gusa e cobre, mais que dobrou e a do chumbo multiplicou-se por seis.[5]
3.
Por qual motivo todos esses fatos nos soam como contos de um mundo perdido? Essa é uma questão tanto econômica quanto histórica.
Inflação significa que o produto social ficou aquém do total demandado sobre ele. O “valor real” de cada vale-dinheiro é então reduzido pelo aumento dos preços. Com uma dada demanda, um aumento suficiente no produto social é capaz de eliminar a inflação. Mas em uma economia em crescimento, a inflação se tornará endêmica caso a taxa de crescimento da demanda continuar a exceder a taxa de crescimento do produto social. Essa é evidentemente a situação da sociedade Ocidental de hoje. A causa fundamental de nossa incapacidade de deter a inflação de nossa época é nossa incapacidade de controlar a criação de demanda por partes do produto social.
Pode-se pensar que o problema poderia ser brevemente mitigado, se não curado, ao induzir pelo menos alguns demandantes a postergá-los. Sem dúvida, aumentos na poupança reduzirão a pressão inflacionária. Mas em um mundo no qual os preços não caem, tal persuasão, ao requerer que as pessoas poupem mais, é cada vez menos provável de ocorrer, pois os demandantes percebem que ao postergar seus recebimentos eles podem apenas perder, mas nunca ganhar. É muito mais provável que eles convertam seus vales em fontes reais que, caso houver algum risco, podem ser convertidas em fonte de renda futura, assim, salvaguardando-os contra a certeza de perda. Mas isso, é claro, significa que tais vales não são postergados, mas, ao contrário, atualmente reclamados.
Cada tentativa de acessar as principais causas da inflação de nossa época precisará, portanto, partir do fato da criação de vales em excesso para o produto social. Aqui nós temos que distinguir, mais cuidadosamente do que foi feito no passado, entre as fontes de tal criação de vales e os meios monetários através dos quais os vales são usados. Os economistas parecem tomar como certeza que o controle da inflação significa controle dos meios monetários através dos quais tais vales fluem. Examinaremos esse ponto de forma mais ampla. Mas poderia mesmo ser que, como uma questão histórica, numa época quando o número de fontes possíveis de tais vales em excesso era pequena, praticamente confinada ao governo e grandes negócios que pretendiam obter acesso fácil ao mercado de capitais e moeda, o controle dos meios monetários era em si mesmo suficiente para limitar a inflação.
A história mostra diversos exemplos de política de crédito anti-inflacionária. Em nosso mundo as fontes de criação de vales são mais difusas enquanto nosso sistema monetário é, ao mesmo tempo, mais complexo e mais difícil de controlar. Nós não podemos mais tomar como garantido que o controle bem-sucedido dos meios monetários significa êxito na luta contra a inflação.
Mesmo assim, permanece verdadeiro que uma das principais causas da inflação de nossa época repousa no alto grau de elasticidade de nossa oferta monetária. Com uma moeda metálica, o processo inflacionário que testemunhamos nas três últimas décadas seria impossível. Um sistema de crédito no qual a criação de moeda requer pouco mais que um acordo entre o credor (banco) e o mutuário, e no qual um grande e amplo mantenimento de estoque de ativos de alta liquidez irão de uma vez começar a fluir em qualquer brecha deixada aberta por um “arrocho de crédito”, é evidentemente algo muito diferente de, e muito mais pesado que, qualquer coisa que os bancos centrais da belle époque tiveram de lidar.
Uma segunda grande fonte da inflação de nossa época terá de ser encontrada na maneira com a qual os preços dos bens industriais são determinados em nosso mundo. Essas são primordialmente “listas” ou catálogos de preços. No caso de manutenção do preço de revenda, o produtor ainda determina o preço que o consumidor terá de pagar. Mas com ou sem a manutenção do preço de revenda, o produtor, na grande maioria dos casos, determina o preço no qual venderá o produto para seu cliente, que é um “tomador de preço”: ele pode apenas aceitar o preço ou se recusar a comprar. O produtor é seu próprio estabelecedor de preço. Ao estabelecer seu preço, para ser claro, o produtor deve se orientar no mercado e considerar a elasticidade da demanda que diz respeito a ele. Mas, primeiro, em nossa época de inflação, a maioria dos produtores tem aprendido a distinguir entre elasticidade de demanda de curto prazo, imediatamente posterior ao aumento de preços, e a de longo prazo, que prevalecerá uma vez que a economia digerir outro surto de inflação geral. Segundo, tomar a orientação das expectativas de vendas é em princípio algo diferente de tomá-la dos atuais preços de mercado. O último não é uma simples invenção da imaginação dos teóricos da economia ao construir modelos de “competição perfeita”. No mundo do século dezenove, tal modo de orientação realmente existiu.
O estabelecimento de preços pelos produtores industriais é um fenômeno relativamente novo, e concomitante ao declínio do mercador de atacado como um intermediário econômico. Antes de 1900, em um mundo no qual a maioria dos bens eram produzidos por produtores relativamente de pequena escala, os preços eram estabelecidos em mercados dominados por mercadores, cuja função econômica era igualar uma demanda e uma oferta, cujas fontes estavam igualmente além de seu controle. Maximizar seus lucros significava para eles maximizar seus volumes de negócios. Então eles tinham que fixar preços de equilíbrio que refletissem cada mudança, seja na oferta ou demanda. A teoria de equilíbrio de mercado marshalliana grandemente refletia essa situação concreta que prevalecia no mundo real na época quando Marshall a escreveu. O que importa para nós é que esse tipo de mercado exigia flexibilidade de preço em ambas as direções, caso os mercadores quisessem maximizar seus volumes de negócios. Produtores e consumidores não tinham escolha a não ser aceitar esses preços de mercado flexíveis. A separação da função de fixador de preços da função de produtor foi, assim, a base da flexibilidade de preços.
O consumidor moderno está ainda na posição de tomador de preço, mas o produtor moderno não mais está. Tendo assumido a posição do fixador de preço outrora vacante pela saída do mercador de atacado,[6] ele naturalmente exerce essa função de forma que maximize seus lucros de longo prazo, em vez de, como fazia o marcador, sua rotatividade de curto prazo. Ele lidará com um excesso de oferta ao reduzir sua produção, em vez de deixar o preço cair. Ele pode se permitir, de uma forma que seu antecessor não podia, que sua conduta seja em cada momento motivada por expectativas que reflitam em grande parte as interpretações das regras gerais do mundo contemporâneo. Ele evitará qualquer coisa que possa “prejudicar o mercado”. E uma vez que ele sabe, como todos nós, que ele está vivendo em um mundo de mudanças unidirecionais de preços de longo prazo, e que qualquer economia de custos ao seu alcance será, cedo ou tarde, engolida pelas exigências salariais, ele será relutante em reduzir seu preço mesmo nos casos em que pudesse ganhar uma vantagem de mercado imediata. Reduzir o preço quando se sabe muito bem que em pouco tempo terá de aumentá-lo novamente não é uma boa estratégia de negócios.
Um aumento nos custos, por outro lado, pode ser facilmente convertido em um aumento de preço onde os produtores são os fixadores de preço. É claro, o medo de “prejudicar o mercado” pode atuar aqui, também, como um obstáculo. Mas a longa experiência até agora tem ensinado ao nosso produtor que ao garantir demandas salariais, onde todos os seus competidores estão na mesma posição que ele, não precisa hesitar em se compensar por um aumento de preços, e que no que diz respeito ao preço relativo de seu produto em relação aos preços de fora de sua indústria, a próxima rodada de aumentos salariais no país logo corrigirá sua posição.
Nós agora vamos a terceira, e mais importante, causa de nossa inflação: a natureza implacável das demandas salariais que se sucedem, indústria por indústria, no que por agora na maioria dos países industrializados tem se tornado um padrão costumeiro e bem estabelecido. O assunto é bastante familiar.[7] Nós iremos nos restringir a três comentários elaborados para definir os fenômenos na perspectiva histórica.
Nossas primeiras duas causas, mesmo sendo condições importantes para a inflação, são realmente apenas condições. Tampouco a natureza elástica da oferta de dinheiro ou o método moderno de fixar preços industriais poderiam por si mesmos ter produzido os fenômenos como todos conhecemos. Considerando os “preços administrados” em particular, há poucas razões para duvidar que industrialistas modernos prefeririam preços e custos estáveis a mudanças unidirecionais em ambos. As forças realmente decisivas de nossa inflação precisam ser buscadas no poder governante dos sindicatos, e no ambiente, intelectual e institucional, dentro do qual eles hoje operam.
A principal função original dos sindicatos, assim como dos cartéis, era evitar que um movimento de preços competitivos que ocorreu durante um boom fosse revertido durante a queda subsequente; nenhuma taxa salarial deve ser permitida a cair. Uma vez que isso se tornou uma questão de fé comumente aceita na sociedade moderna de massa, sindicatos tinham de assumir uma nova função para justificar a continuidade de sua existência. Uma economia com taxas salariais estáveis e preços caindo gradualmente com maior produtividade não apetece os sindicatos. Enquanto isso pode apresentar problemas difíceis aos fixadores de preços “administrados”, também torna os sindicatos supérfluos. A opção por uma economia com taxas salariais permanentemente crescentes é, portanto uma opção natural para um tipo de organização que de outra forma seria deixada sem qualquer função econômica significativa.
Mas como os sindicatos foram capazes de fazer seus interesses prevalecerem acima de todos os outros, incluindo o interesse social em um nível de preços estável? Como exatamente a criação de excesso de vales sobre o produto social veio a se tornar parte dos costumes aceitos na sociedade moderna, uma norma social mais convincente por ser uma norma não escrita?
Esse processo nos parece ininteligível a menos que prestemos atenção às mudanças históricas as quais as instituições de negociação coletiva têm passado no último meio século. Quando, no início da década de 1920, a maioria dos países do Ocidente seguiram o exemplo britânico e estabeleceram tais instituições, acrescentando arbitragem por um árbitro “imparcial” em alguns casos, o clima da opinião predominante era ainda que a economia de mercado, com seu sistema de preços autônomo e coerente, era assumida como garantida. Céticos eram silenciados ao apontar para eles que “negociar” é a essência da atividade de mercado e que “negociação coletiva” é um mais sofisticado, talvez um mais civilizado, método de se alcançar as taxas salariais de equilíbrio. Poucos duvidaram que a existência dos preços, coordenados pelo sistema de preços, estreitaria os limites para o campo da negociação salarial.
Como todos sabemos, o resultado tem sido bem diferente. Ao invés do sistema de preços restringir a área de negociação salarial dentro de limites estreitos, o sistema de preços autônomo tem sido destruído no processo. O nível salarial de cada indústria não é mais governado por um sistema de preços que existe independentemente disso. Ao contrário, o sistema de preços, se é podemos ainda chamá-lo assim, tem se tornado hoje o resultado cumulativo de toda negociação salarial industrial e dos consequentes ajustes de preços que têm acontecido ao longo do tempo. A vida no “padrão salarial” significa que, em cada instante do tempo, o preço dos bens industriais reflete não a relativa magnitude das forças de oferta e demanda, mas o relativo poder de negociação dos vários sindicatos, nos momentos em que as últimas negociações foram feitas. Ninguém espera que o atual conjunto de preços dure além da data na qual o próximo acordo salarial seja revisto.
As instituições de negociação coletiva, que meio século atrás estavam tão confiantemente esperando adicionar novo brilho à economia de mercado, têm, ao invés disso, destruído o sistema de preços no qual essa economia deve repousar.
4.
Nós agora devemos nos voltar às consequências do processo contemporâneo de inflação. Alguns deles são tão bem conhecidos que nós teremos que gastar muito pouco tempo neles. Mas alguns outros são menos familiares. Pareceria, em particular, que os efeitos de nosso modo contemporâneo de aumento de preços (descontínuo, em vez de contínuo) sobre preços relativos, e o funcionamento do sistema econômico como um todo, tem até agora recebido muito pouca atenção.
É desnecessário dizer que uma política monetária em um mundo de mudança unidirecional de preços apresenta problemas que eram desconhecidos por nossos avós. [8]
Anteriormente, quando um banco central era lento em puxar os freios anti-inflacionários, de modo que os preços tinham realmente aumentado antes dessa ação ser tomada, era sabido que o aumento de preço poderia e seria revertido. Um erro na cronometragem da tomada de ação seria retificado com passar do tempo. No nosso mundo, um banqueiro central deve ter a visão de uma águia e as qualidades perceptivas de um gato para detectar novas fontes de pressão inflacionária de uma só vez; de outra forma, será tarde demais. Em nosso mundo, um erro nessa cronometragem não é retificável. De fato, a regra de política monetária mais sã de hoje é provavelmente que nós nunca faremos o bastante para limitar a inflação, porque o que quer que estejamos fazendo não será o suficiente.
Também é bastante claro que os credores estão agora ficando relutantes a entregar suas fortunas nas mãos dos negociantes salariais. A “inversão da curva de juros” e o atual nível das taxas de juros são, é claro, simplesmente os primeiros sinais da crescente consciência do que está acontecendo. Sem dúvidas, com o tempo, um padrão de pagamento diferente do dinheiro atual, um padrão além do alcance dos negociantes salariais e banqueiros obedientes, será concebido. Os mutuários descobrirão que eles podem mais prontamente pedir emprestado e em taxas mais baixas se eles estiverem dispostos a arcar com o risco da depreciação da dívida.[9]
Foi-me pedido para devotar alguma atenção nesse artigo para os efeitos de nossa inflação contemporânea sobre a distribuição de renda, mas sinceramente não acho esse assunto gratificante. Em primeiro lugar, nos falta um padrão de comparação. Uma vez que todos os países com uma economia de mercado têm sido afetados por essa inflação, nenhum pode servir como referência. E me encontro incapaz de conjurar uma imagem de como nosso mundo seria sem essa inflação.
Segundo, parece improvável que o esquema clássico da teoria de distribuição de renda, concebida como ela está em termos de classe de destinatários de renda, produz quaisquer resultados interessantes nas circunstâncias de nossa era. É claro que os beneficiários de renda fixa sofrem, mas é difícil dizer se os assalariados ou os que recebem lucros ganham mais às suas custas.
Em tempos passados, pode ter havido “inflações de lucro” em que os assalariados sofreram temporariamente com o reajuste tardio dos salários. Em nosso mundo, com o modo contemporâneo de fixação de preços descrito acima, os beneficiários do lucro podem se recuperar em parte ao estabelecer preços mais altos, mas em parte, no que diz respeito ao volume de vendas, apenas gradualmente, à medida em que o novo surto de inflação permeia o resto da economia. No que diz respeito à distribuição dos rendimentos reais, então, as diferenças mais significativas parecem existir não entre assalariados e os que recebem lucros, mas entre pessoas operando em diferentes setores da economia. E essas diferenças decorrem não do movimento dos preços absolutos, mas do modo descontínuo de mudança dos preços relativos. Isso é mais claramente visto no caso dos assalariados em qualquer indústria. Enquanto eles ganham uma vantagem relativa sobre todos os seus concidadãos toda vez que seus salários aumentam, eles estão do lado perdedor toda vez que isso acontece em outro setor. Também não é um resultado surpreendente. Keynes, afinal, mostrou que, exceto pela existência de preços e rendimentos fixos, mudanças na unidade salarial não influenciarão a distribuição de renda. É claro que em nosso mundo não existe uma “unidade salarial” e todos os efeitos mais interessantes decorrem de mudanças relativas de salários e preços.
Devemos nos lembrar que muito mais importantes do que essas mudanças de renda são as mudanças de capital concomitantes a cada inflação, os ganhos e perdas de capital feitos por devedores e credores. Com o sistema de locação-venda, os trabalhadores podem se tornar devedores e, assim, se beneficiar da inflação de uma forma que nenhuma estatística de renda dá conta, outra razão pela qual a análise dos processos inflacionários em termos de variações de renda real parece tão pouco gratificante. Talvez eu não precise fazer mais do que sugerir as implicações econômicas do fato bem conhecido de que, em uma inflação, as empresas mais endividadas parecerão as mais lucrativas, já que o “retorno sobre o patrimônio” aqui inclui um elemento de ganho de capital. Essas empresas naturalmente acharão mais fácil atrair novo capital para expansão do que seus rivais. Podemos concluir que toda inflação, independentemente dos efeitos sobre a estrutura de preços relativos a serem discutidos, gera uma tendência à distorção da estrutura de capital. Não há mais um critério inequívoco pelo qual possamos medir o desempenho relativo das empresas. A inflação oferece outro exemplo instrutivo do quão inseparáveis a renda e os ganhos de capital realmente são.
5.
Permita-me agora chamar sua atenção para um fenômeno contemporâneo que geralmente não é considerado consequência da inflação de nossa época: o surgimento de esquemas de Programação de Desenvolvimento Econômico, promovidos por governos, em países cujos sistemas econômicos se conformam ao padrão da economia de mercado; que os franceses chamam de “planejamento indicativo” por agências governamentais.
Argumentarei ser possível defender tais programas como guias para a tomada de decisões empreendedoriais em um mundo em que preços relativos, não mais responsivos às forças de mercado, não mais flexíveis em ambas as direções, perderam em grande parte sua antiga função de orientar os empreendedores em suas ações.
É claro que não pode haver dúvida de que, vista politicamente, a Programação Econômica é simplesmente uma extensão do princípio da política de pleno emprego. O estado de bem-estar moderno, tendo uma vez assumido a responsabilidade pelo pleno emprego permanente, é compelido, pela natureza das forças inerentes a sociedade de massa moderna, a dar o próximo passo e se responsabilizar pela taxa máxima de crescimento de renda. Mas por que pensar que a realização desse objetivo não pode ser deixada ao jogo das forças de mercado no que é, afinal, uma economia de mercado?
A resposta geralmente dada a essa pergunta é, talvez não surpreendentemente, redigida em termos Keynesianos. Os economistas que defendem o planejamento indicativo nos dirão, via de regra, que a economia de mercado pode nem sempre fazer pleno uso de todos os recursos existentes, e que para isso é necessária uma coordenação das expectativas de todos os empreendedores, algo que as forças de mercado sozinhas não conseguiriam realizar.
Eu considero essa resposta como inadequada. Keynes estava exclusivamente preocupado com o desemprego na sociedade industrial. Na Inglaterra e na França, ao menos, os dois países que têm nos anos recentes sido os protagonistas do planejamento indicativo, não tem havido desemprego grave por quase três décadas; então, seus planejamentos podem ser dificilmente justificados em termos Keynesianos. Mas se nós vamos incluir entre nossos termos de referência outros recursos senão trabalho, bem como estendê-los ao mal-emprego, em vez de desemprego, seremos incapazes de usar as ferramentas Keynesianas.
Um argumento muito mais forte para o planejamento pode ser feito simplesmente perguntando como os preços relativos em nosso mundo, definidos na maioria dos casos por um aumento sobre os salários existentes e custos materiais que ninguém espera durar, podem servir como um guia para a ação empreendedora. Evidentemente que não podem. Os preços, em um mundo em que não podem cair, não são capazes de refletir as forças da demanda; não são preços de equilíbrio. É verdade que mesmo os preços desequilibrados podem orientar os empresários, mas obviamente eles podem fazer isso quando estão livres para se mover em resposta à demanda e à oferta, e é exatamente isso que em nosso mundo eles não podem mais fazer.
Simplesmente não temos mais um “sistema” de preços digno desse nome. A estrutura existente de preços relativos reflete a história das negociações salariais passadas, portanto, nada mais é do que o resultado cumulativo de uma série de acidentes históricos. É claro que ele é governado por custos relativos, mas não é mais afetado pelo desequilíbrio de demanda e oferta. O que o afeta são novas negociações salariais. Uma queda na demanda por nosso produto resultante de um aumento de preços pode ser seguramente desconsiderada pela boa razão keynesiana de que novas negociações salariais em outros setores irão, em qualquer caso, modificar a demanda por nosso produto. Nosso preço dura tanto quanto nossa negociação salarial. Todo mundo sabe disso e age de acordo.
Como apontei em outro lugar,[10] os oponentes da Programação Econômica às vezes prejudicam sua causa reivindicando mais para o sistema de preços da economia de mercado do que pode ser feito com justiça. Em particular, devemos tomar cuidado para não confundir o sistema de equilíbrio geral de Walras e Pareto, que pressupõe um mundo estacionário, com a economia de mercado do mundo real. No primeiro, toda a ação é determinada pelos preços presentes, enquanto no mundo real os empreendedores terão que se deixar guiar também pelas expectativas de preços e vendas futuras. Mas se é verdade que em um mundo incerto os preços atuais não podem oferecer aos empreendedores mais do que uma base de orientação para seus planos, é verdade também que o desaparecimento dessa base deve constituir uma séria perda. À luz desse fato, é fácil entender como poderia ganhar terreno a ideia de que o crescimento econômico poderia ser promovido oferecendo aos empreendedores outra base de orientação, em vez do desaparecido sistema de preços, expresso desta vez em termos de expectativas coordenadas sobre quantidades futuras de bens. A economia de mercado, tendo perdido seu guia tradicional, deve ser oferecida mais um dispositivo para a coordenação de expectativas. Se este relato do pano de fundo da ideia de Programação Econômica for aceito, também explicaria o motivo, na maioria dos programas, dos preços desempenharem um papel tão pequeno.
Surge então a questão de saber se é realmente possível estimar tendências futuras de produção para um grande número de bens, desconsiderando seus preços relativos. A programação do desenvolvimento econômico terá, em grande medida, de ser orientada pelos recursos disponíveis. O objetivo deve ser superar as carências em alguns setores que coexistem com recursos não utilizados em outros. Esse objetivo pode ser alcançado sem um sistema de preços em que os preços relativos reflitam a relativa escassez de bens? É provável que os planejadores possam fazer melhor aqui do o mercado consegue?
Temos que lembrar que a escassez e os excedentes que podemos observar em nosso mundo são tão provavelmente o resultado de distorções de preços de curto prazo quanto de tendências de longo prazo. Um excedente na oferta de um determinado bem e o correspondente excesso de capacidade na indústria que o produz pode ser simplesmente por seu preço ter subido recentemente antes de outros preços, enquanto uma escassez pode ser devido a um nível de salários que não foi revisto há muito tempo. O excedente provavelmente desaparecerá quando outros preços começarem a subir e a escassez desaparecer após o próximo aumento salarial. Não nego que excedentes e carências que se devam a outras causas, portanto, de natureza menos efêmera, existam em nosso mundo. É claro que em um mundo de mudanças inesperadas existem muitas dessas causas. Meu ponto é que somos incapazes de distinguir excedente e escassez indicativos de tendências de longo prazo daqueles que refletem distorção relativa dos preços. No momento da observação é impossível distinguir um tipo do outro. Nesse aspecto, os economistas-planejadores não estão em melhor situação do que os empreendedores. Em um mundo em que as quantidades e os preços não são mais coordenados pelas forças de mercado, nenhuma, por si só, pode servir como um guia útil para a ação.
Parece, portanto, que o mesmo evento cuja existência parece exigir uma nova base de orientação para a avaliação empreendedorial das tendências de longo prazo, a saber, o desaparecimento de um sistema de preços coerente governado pela oferta e procura, ao mesmo tempo, deve privar esta nova base de orientação de qualquer significado econômico que poderia ter.
Professor H.M. Robertson, o primeiro debatedor, sentiu que o título do artigo do Professor Lachman era inadequado. O Professor Lachman havia discutido as “Causas e Consequências da Inflação de Nossa Época”, mas ele também havia discutido causas e consequências de nossas formas de pensar sobre a inflação nestes tempos. Ele havia lançado dúvidas sobre a utilidade das variáveis macroeconômicas atualmente em voga ao discutir o fenômeno da inflação. Mas ele assumiu, então, que uma determinada mudança definitiva nas atitudes e técnicas havia ocorrido nos últimos 30 anos, e que daí em diante, para sempre, persistiria uma máxima política que, historicamente falando, só muito recentemente se tornou amplamente aceita, a saber, que sempre que houvesse qualquer ameaça à manutenção do pleno emprego, seriam tomadas medidas para aumentar o fluxo de renda monetária o suficiente para compensar a folga, onde quer que ela aparecesse, e independentemente da escassez de mão de obra que seria causada em outras partes da economia. O Professor Robertson perguntou se essa recente revolução no pensamento era tão completa que agora havia paralisado e poderia ser escrita nas funções macroeconômicas que descreveriam, explicariam e governariam todas as economias pós-keynesianas, embora quaisquer dessas variáveis, ou melhor, parâmetros, estariam ausentes das funções apropriadas das econômicas pré-keynesianas.
Em seu artigo, o autor se juntou de maneira justa e direta às fileiras dos institucionalistas, mas não levou seu institucionalismo longe o suficiente. As instituições julgadas responsáveis devem ser descritas e analisadas com algum detalhe.
Sem dúvida, pode haver lampejos de verdade na visão de que a força realmente decisiva de nossa inflação tinha “de ser buscada na força motriz dos sindicatos e o ambiente, intelectual e institucional, dentro do qual elas operam hoje”; ainda assim, ele (Robertson) acreditava que muito mais conhecimento tanto do padrão real das mudanças salariais quanto do papel dos sindicatos nos processos de mudança tiveram que ser adquiridos antes que a natureza decisiva desse tipo de explicação pudesse ser verificada.
Se os movimentos dos salários e as tendências em direção à inflação proveniente dos custos de trabalho na África do Sul fossem analisados mais profundamente em uma base institucional, a análise teria que ir muito mais fundo do que qualquer mera menção ao papel geral dos sindicatos em um mundo em que preço e salários virtualmente nunca mais podem cair. Tal análise deve envolver uma investigação mais profunda não apenas da estrutura sindical, mas também de outros elementos de nossa estrutura política: elementos que fundam grande parte da influência exercida pelo próprio sindicalismo sobre o progresso da inflação neste país, mas elementos que talvez tenha contribuído mais fortemente de outras maneiras.
Em relação ao surgimento da Programação de Desenvolvimento Econômico como consequência da inflação, ele sentiu que o Professor Lachmann não havia derivado a programação de desenvolvimento econômico (e as formas que seu “planejamento indicativo” tendia a tomar) da própria inflação. Ele realmente a derivou como uma consequência adicional da mesma série de causas às quais ele atribuiu as origens da inflação de nossos tempos.
Professor D. Hobart Houghton, o segundo debatedor, sentiu que não poderia respaldar tudo o dito pelo Professor Lachmann ao aceitar a moderna estrutura de preços como quase desprovida de qualquer competição. Embora fosse verdade que os preços, como um todo, tendam a subir, ele não tinha certeza se isso era verdade para todos os preços relativos e questionou se considerava suficientemente abordadas as novas técnicas que substituíram os antigos processos em no cenário moderno.
Ele endossou os comentários do Prof. Robertson sobre os sindicatos. O professor Lachmann havia enfatizado demais a pressão ascendente na negociação coletiva sindical. Não apenas os sindicatos, mas toda a população dos países democráticos foi essencialmente responsável pela inflação de custos. A principal força da inflação de nosso tempo foi que nós esperamos que ela continuasse, mas nós, como cidadãos de uma sociedade democrática, tornamos, de uma forma ou de outra, inevitável sua continuidade. Pergunta-se se o governo democrático representativo, sem falar no movimento social, seria compatível com a manutenção do valor de uma unidade monetária, a menos que um poderoso vigilante fosse estabelecido para manter o poder da moeda.
Dr. Holloway expressou a opinião de que os debatedores não tinham chegado aos fatos básicos da inflação, pelo motivo de que nenhuma tentativa foi feita para calcular o custo em termos de:
- Minar todo o sistema econômico; e
- Minar a liberdade do indivíduo
A inflação, disse ele, virou a balança a favor dos devedores e provocou uma guerra civil silenciosa e implacável entre produtores e administradores monetários autoritários. Para evitar o colapso do maquinário de produção, eles não tiveram outra opção a não ser elevar seus preços. A inflação estava desintegrando a economia. A inflação monetária foi a causa de tudo isso. A inflação de custos e inflação de demanda foram meros sintomas, meras consequências. Não poderia haver civilização sem disciplina. Esperar que essa disciplina viesse de um exército de burocratas era uma esperança vã. De onde vem essa fé patética nos burocratas? Ele perguntou. Os burocratas eram apenas uma fatia da comunidade; eles não eram super-homens.
Só havia uma maneira de disciplinar nossas relações econômicas; e era ter mais dinheiro que que possuísse valor devido a suas propriedades intrínsecas.
Sr. K. A. H. Adams, comentando o artigo de Lachmann, disse que outra possível causa da inflação poderia ser baseada em observações de que a Lei de Distribuição de Renda de Pareto ocorreu na África do Sul todos os anos nos últimos 50 anos. O índice de Pareto havia aumentado de cerca de 2 para 2,5 nesse período e implicava certa concentração de renda e de pessoas. Nos grupos de funcionários, a distribuição de renda era muito mais concentrada, principalmente porque os salários mais altos no Serviço Público se limitavam a valores anormalmente baixos.
O padrão salarial concentrado no serviço público estabeleceu um modelo para todo o país e causou migração de pessoas, insatisfação e, eventualmente, elevação de renda em subgrupos, disse ele. Com um padrão de renda mais elevado no serviço público, as dificuldades poderiam ser minimizadas, atingindo proporções ínfimas, provavelmente quando o padrão era duas vezes mais concentrado que a distribuição de renda na população. Desse modo, a inflação pode ser contida.
J. Katzenellenbogen duvidou que houvesse muitos produtores com os recursos necessários para serem seus próprios formadores de preços, que foram capazes de ignorar o mercado e de deixar seus preços resistirem à elasticidade da demanda e da oferta. Ele achava que o sistema sul-africano ainda era baseado em um mercado competitivo e os produtores em geral usaram o mecanismo de preço mesmo no curto prazo. Havia muitos pequenos e médios produtores individuais que tiveram de enfrentar uma sociedade competitiva e que poderiam fazer incursões nela apenas por um ataque do ponto de vista do preço.
R. L. Kraft afirmou ser comum dizer que os salários subiam e nunca desciam. Em uma recente pesquisa preliminar dos custos salariais nos vários setores da indústria manufatureira sul-africana, ele descobriu que a influência da negociação coletiva no custo salarial médio não era decisiva. Ele também sentiu que os custos salariais por empregado poderiam cair e caíram em certos setores. O comportamento dos salários refletiu, entre outras, as exigências de qualificação das indústrias, bem como seu maior grau de automação e complexidade mecânica.
M. N. Dagut perguntou se o Professor Lachmann, que acreditava que as instituições eram responsáveis pela continuidade da inflação, também não acreditava que houvesse algum mérito no novo tipo de instituição tentada no exterior, como um conselho de preços e rendimentos.
Dr. Timmerman disse que, no que diz respeito à África do Sul, pode ser o caso que os sindicatos não sejam ão bem organizados como os do exterior. No entanto, eles exerceram tendências de elevação nos preços. Ele também sentiu que os trabalhadores técnicos, a maioria não sindicalizados, influenciaram muito os custos. Ele sugeriu o aumento da produtividade e mais horas de trabalho como o único remédio.
Professor Lachmann respondeu concluindo que, embora a única coisa que ele acreditasse ser possível e socialmente aceitável fosse uma política combinada de preços e salários, tal política exigiria a introdução de um sistema de controle universal de preços que sabíamos por experiência que não seria um trabalho a ser bem-feito.
Em nosso mundo, disse ele, os preços e os salários não são flexíveis na direção descendente. Ele alegou que houve algumas forças que produziram a inflexibilidade descendente dos salários e preços, que também deveriam ser responsabilizados pela tendência ascendente de longo prazo dos preços. Realmente não poderia haver dúvida sobre isso. Ele foi além do Dr. Holloway e disse que uma sociedade incapaz de controlar a criação de vales sobre o seu produto social era uma sociedade doente. Um dos males da inflação foi, obviamente, as perdas de capital dos poupadores que, na outra ponta, devem corresponder a certos ganhos de capital. Parecia que alguns economistas haviam adquirido a visão de que aqueles fenômenos econômicos dos quais não tínhamos registro, e porque ganhos e perdas de capital não figuravam em nossas contas de renda nacional, não existiam. Ganhos e perdas de capital importavam porque uma economia capitalista era dirigida por eles. Havia também a visão de que as perdas de capital dos poupadores em uma economia era algo corrigível e, embora isso não fosse justiça social, não importava para a economia como um todo, porque o que alguns perdiam, outros podiam ganhar. Havia também o efeito que tais perdas de capital poderiam ter na formação de preços. Ele não tinha dúvidas de que alguns dos aumentos salariais concedidos no mundo ocidental nos últimos vinte anos haviam sido parcialmente financiados por ganhos de capital que, no entanto, geralmente não podiam ser mantidos.
[1] John Hicks, Capital and Growth (Oxford: Oxford University Press, 1965), Cap. VII.
[2] Ibid., p. 78.
[3] Milton Friedman e A. J. Schwartz, A Monetary History of the United States 1867-1960 (Nova York: National Bureau of Economic Research, 1963), p. 15.
[4] Ibid., p. 37, Tabela 2.
[5] Ibid., p. 35.
[6] Não é impossível que no futuro a cadeia de lojas moderna venha a assumir o antigo papel de fixador de preços do comerciante atacadista. A medida em que isto acontecerá deve evidentemente depender do grau de “poder compensatório” que estas organizações varejistas conseguem adquirir.
[7] Para uma explicação concisa das implicações da “Norma Trabalhista” veja J. R. Hicks, “Economic Foundations of Wage Policy,” Economic Journal 65 (setembro de 1955): 389-404.
[8] O primeiro a apontar isso foi, pelo que sei, o economista alemão Alfred Tismer em seu livro Grenzen der Diskontpolitik (Munich: Duncke & Humblot, 1932). Veja também J. K. Galbraith, “Market Structure and Stabilisation Policy”, Review of Economics and Statistics 39 (maio de 1957): 124-33.
[9] Os economistas têm prestado pouca atenção até agora a essas possibilidades, embora ensinemos a nossos alunos do primeiro ano que o meio de intercâmbio e a unidade de conta não precisam coincidir. Para uma notável exceção, veja Joan Knox, “Index-Regulated Loan Contracts”, South African Journal of Economics 32 (dezembro de 1964):237-52.
[10] “Cultivated Growth and the Market Economy”, South African Journal of Economics 31 (setembro de 1963): 165-74.