Por uma educação antirrevolucionária

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Artigo autoral de Isaías Lobão

O retrato de nossa tragédia.

Dizem que toda unanimidade é burra. No entanto, existe um conceito que todos concordam, o sistema educacional brasileiro é péssimo, caro e ineficiente. Todos os governos prometeram melhorar a educação, entretanto, pouco se avançou.

Pesquisa, feita com base nas edições da Prova Brasil, apontou que o número de jovens pobres matriculados no ensino médio era de apenas 39%. Dados do IBGE afirmam 56,1% dos brasileiros, com idade entre 25 e 64 anos, não completaram o ensino médio. Existem 11,3 milhões de pessoas com mais de 15 anos analfabetos, ou seja, 6,8% da população. Em suma, dados oficiais revelam o péssimo desempenho da educação de base brasileira.[1]

O PISA[2] avalia até que ponto os alunos de 15 anos de idade, próximos ao final da educação obrigatória, adquiriram conhecimentos e habilidades essenciais para a plena participação na vida social e econômica. Ele oferece informações sobre o desempenho dos estudantes e principais fatores que moldam sua aprendizagem, dentro e fora da escola.

Os resultados permitem que cada país avalie os conhecimentos e as habilidades de seus próprios estudantes, em comparação com os de outros países; aprenda com as políticas e práticas aplicadas em outros lugares; e formule suas políticas e programas educacionais visando à melhora da qualidade e da equidade dos resultados de aprendizagem.

O Brasil permanece entre as últimas posições. Os resultados demonstraram que os estudantes brasileiros têm baixa proficiência em Leitura, Matemática e Ciências. Os estudantes são incapazes de compreender textos, resolver cálculos e questões científicas simples e rotineiras. Os índices do Brasil estão estagnados desde 2009. O Brasil está, entre 79 países, na 57ª posição no ranking de leitura, 66ª posição na avaliação de ciências e na 70ª posição em matemática[3].

Por tudo isso, os resultados das avaliações de desempenho em leitura no Brasil são desastrosos. Os concluintes de cada fase de escolarização apresentam desempenho abaixo do mínimo esperado. 

Portanto, o maior problema do sistema educativo no Brasil é que as crianças e os adolescentes vão à escola e aprendem muito pouco. Nosso sistema educacional falha no que deveria ser sua missão principal: ensinar.[4] Como lembra Felipe Celeti, “no Brasil vivemos o paradigma do acesso-qualidade, pois há facilidade para o ingresso em escolas públicas, mas a qualidade não consegue ser boa para todos”.[5] O atual arranjo do sistema educativo não conseguiu melhorar, de forma significativa, a qualidade do ensino oferecido e nem a qualificação dos alunos que ingressam todos os anos no sistema de escolarização brasileiro.

O pensamento revolucionário na educação

Arrisco-me a dizer que os péssimos resultados de nosso sistema de ensino devem-se ao movimento devastador que se infiltrou na educação, o pensamento revolucionário junto com seu derivado, o marxismo.

Como afirma Mateus Menezes[6]:

Infelizmente, a esquerda conseguiu destruir nossa educação. Retiraram a autoridade e desvalorizaram a boa figura que o docente tinha no passado. A violência escolar domina a maior parte dos colégios brasileiros. Os docentes são obrigados pelo sistema educacional marxista a conviver com a cultura da impunidade dos alunos portadores de graves transtornos de conduta, que não deviam frequentar a rede regular de ensino.

O moderno sistema de ensino adotado no Brasil é uma das manifestações do pensamento revolucionário. Ele pode ser visto como uma das estratégias de um amplo projeto que busca a construção de uma nova sociedade fundada no discurso da igualdade política, econômica e social.

O objetivo central da educação seria formar um cidadão com consciência crítica, leia-se, revolucionária.  “Quanto mais o homem refletir sobre a realidade, sobre a sua situação concreta, mais emerge plenamente consciente, comprometido, pronto a intervir na realidade para mudá-la.”[7] (FREIRE, 1980: 25).

 Outra premissa da educação revolucionária é o progressismo. Visto como se fosse uma escada rolante interminável, surge com a proposta de construir um ser humano autônomo, governado pela Razão e pela Ciência.

Firmando-se na antropologia ingênua de Rosseau (bondade inerente do homem), na perspectiva de transformação social de Marx (luta de classes e estabelecimento da ditadura do proletariado), no socioconstrutivismo de Piaget e Vygotsky (ensinar não é transferir conhecimento) e na pedagogia de Paulo Freire (obrigação do educador transmitir seus posicionamentos e valores políticos na educação), a educação revolucionária confia que uma nova sociedade irá emergir por meio da escola.

A este respeito, o professor Zamboni afirmou[8]:

A educação moderna tendeu cada vez mais nesta direção, apostando num projeto insensato. Seus mentores perverteram o sentido da educação, apresentando, em seu lugar, uma caricatura. Não havia sido uma grande ideia, mas apenas uma ideia presunçosa. Quanto mais empenho houve na tentativa de realizar essa impossibilidade, mais as contradições e perplexidades se tornaram evidentes. O fracasso do sistema educacional é consequência de uma aspiração imoral e de uma concepção limitada do ser humano.

O pensamento revolucionário é, em essência, coletivista. Uma notável característica que vemos na defesa intransigente do ensino escolar compulsório como panaceia aos péssimos resultados da educação brasileira. Não se ouve entre os revolucionários alternativa ao status quo. Reforçam o papel social da escola, como único centro de propagação do conhecimento e do saber, retirando das famílias o direito de optar por novas alternativas.

Por sua vez, os defensores da educação clássica ou antirrevolucionária (incluo aqui conservadores, liberais e libertários) são ardorosos defensores e propagandistas do ensino domiciliar, de alternativas ao monopólio do MEC na certificação de escolas e professores; além propor alternativas de financiamento para a educação dos mais pobres.

A educação antirrevolucionária é extremamente contrária ao sistema de escolarização compulsória imposta pelo estado[9]. A premissa que rege esta postura é a crença que os indivíduos precisam agir de forma responsável e arcar com as consequências de suas escolhas.

Segundo Murray Rothbard, escolas públicas não são apenas instituições educacionais, elas são agências políticas, logo, são controladas pelo grupo que tenha mais influência política. Portanto, para o autor, a instrução pública obrigatória através do sistema de escolarização compulsória é uma política totalitária.[10]

Assim, pode-se afirmar que, na realidade, o sistema educacional funciona bem, já que serve ao propósito para o qual foi realmente construído. Por isso, é importante que a educação seja obrigatória. Dessa forma, logra-se que ninguém possa escapar de uma homogeneização que facilite o controle da população, uma vez que, se todos pensam igual, dominar a todos será como dominar um único indivíduo[11].

Soluções propostas

Portanto, temos diante de nós, a inadiável tarefa de (re)construir uma educação antirrevolucionária. A resolução dos sérios problemas do sistema educacional brasileiro não requer mais regulamentação estatal, tampouco a adoção de invenções ou modismos pedagógicos da moda, como os intelectuais querem nos fazer crer.

Os sistemas educacionais orientados pelo livre mercado surpreendem com seus resultados, e a razão é muito simples:  empresas são orientadas pelo mecanismo do lucro e dos prejuízos, que dizem ao empreendedor se ele está satisfazendo ou não as necessidades dos consumidores[12].

Os empreendedores que continuam com prejuízo acabam deixando de ser empreendedores. Por outro lado, o lucro é uma recompensa para os empreendedores que antecipam corretamente o desejo do consumidor. Conteúdos, estruturas, modelos de ensino irão concorrer entre si. Irão sobreviver as escolas que, pelo empreendedorismo, conseguirem antecipar os anseios das pessoas[13].

Esses empresários podem decidir quais programas são acessíveis para quais pais, e quais programas atenderão às demandas procuradas pelas famílias. À medida que mais escolas entram no mercado, as opções de escolha para as famílias aumenta. É a definição padrão do que constitui crescimento econômico. Como disse Mises[14] o crescimento econômico ocorre quando os clientes podem comprar mais bens e serviços do que antes do aumento do crescimento econômico. A concorrência entre os serviços educativos conduz à excelência, porque a concorrência seleciona os melhores.

A defesa do arranjo do livre mercado para o sistema de ensino não privilegia somente os mais abastados. A pesquisa de James Tooley prova que os mais pobres podem educar a si mesmos, se o estado não atrapalhar e não tolher sua existência com um cipoal de regulações. A viagens de Tooley para a Índia, Sudão do Sul, Serra Leoa e Libéria mostram que, mesmo nos lugares mais pobres, o livre mercado oferece opções acessíveis aos mais pobres e servem a esse público mais eficientemente do que as escolas controladas pelo estado[15].

O sistema privado deveria ser livre para planejar currículos, programas e cursos porque são eles que conhecem as demandas dos seus alunos e suas famílias. Informações sobre diferentes propostas pedagógicas, metodologias e conteúdos que atendam à diversidade da população devem ser disponibilizadas da maneira mais eficiente possível e o acesso aos serviços educacionais pode ser garantido através de alternativas de financiamento público para o setor privado[16]. As pessoas não precisam esperar para se tornarem uma maioria. Ninguém mais pode fazer o trabalho, exceto aqueles que compreendem o que precisa ser feito. A influência perturbadora da política centralizadora na educação só vai continuar até que tenha sido ofuscada e tornada inútil por uma força gerada por indivíduos que compreendam o que está em jogo a existência uma melhor forma de educar os jovens.


[1] BRASIL, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Brasil no Pisa 2018, [s.l.]: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020.

[2] O Programme for International Student Assessment (PISA), ou Programa Internacional de Avaliação de Alunos, coordenado pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), tem como objetivo avaliar as políticas públicas voltadas para educação e propor melhorias. 

[3] BRASIL, Brasil no Pisa 2018.

[4] BARROS, Daniel, País mal educado: Por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras?, Rio de Janeiro: Record, 2018.

[5] CELETI, Felipe Rangel, Educação não obrigatória: Uma discussão sobre o estado e o mercado, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2011.

[6] Por uma educação mais conservadora. Site do Instituto Liberal. https://www.institutoliberal.org.br/blog/economia/por-uma-educacao-mais-conservadora/

[7] FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação. 3. ed. São Paulo: Moraes, 1980.

[8] ZAMBONI, Fausto, Contra a escola: Ensaios sobre literatura, ensino e educação liberal, [s.l.]: Vide Editorial, 2016.

[9] A opção de escrita do termo estado em letras minúsculas está de acordo com o conteúdo proposto no trabalho, o de diminuir o poder e o tamanho do estado. Este padrão pode ser encontrado em outros trabalhos acadêmicos que buscam o mesmo objetivo.

[10] ROTHBARD, Murray N., Educação: Livre e obrigatória, São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2013.

[11] DAVILA, M. A. ¿Es necesario un sistema educativo? Disponível em: <https://xoandelugo.org/es-necesario-un-sistema-educativo-miguel-alonso-davila/>. Acesso em: 18 de abril de 2023.

[12] IORIO, Ubiratan Jorge, Dez lições fundamentais de escola austríaca, [s.l.]: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2013.

[13] CELETI, Educação não obrigatória: Uma discussão sobre o estado e o mercado.

[14] MISES, Ludwig von, As seis lições: Reflexões sobre a política econômica para hoje e amanhã, 8a Revista. São Paulo: LVM, 2017.

[15] TOOLEY, James, A Árvore Bela: Uma jornada pessoal através de como os povos mais pobres do mundo estão educando a si mesmos, [s.l.]: Bunker Editorial, 2020.

[16] CAMARGO, Anamaria; MIOTTO, Giuliano F. (Orgs.), Educar é libertar: Uma nova abordagem aos desafios da educação no Brasil, Goiânia: Kelps, 2017.

Referências

BARROS, Daniel. País mal educado: Por que se aprende tão pouco nas escolas brasileiras? Rio de Janeiro: Record, 2018.

BRASIL, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Brasil no Pisa 2018. [s.l.]: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020.

CAMARGO, Anamaria; MIOTTO, Giuliano F. (Orgs.). Educar é libertar: Uma nova abordagem aos desafios da educação no Brasil. Goiânia: Kelps, 2017.

CELETI, Felipe Rangel. Educação não obrigatória: Uma discussão sobre o estado e o mercado. Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2011.

IORIO, Ubiratan Jorge. Dez lições fundamentais de escola austríaca. [s.l.]: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2013.

MISES, Ludwig von. As seis lições: Reflexões sobre a política econômica para hoje e amanhã. 8a Revista. São Paulo: LVM, 2017.

ROTHBARD, Murray N. Educação: Livre e obrigatória. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2013.

TOOLEY, James. A Árvore Bela: Uma jornada pessoal através de como os povos mais pobres do mundo estão educando a si mesmos. [s.l.]: Bunker Editorial, 2020.

ZAMBONI, Fausto. Contra a escola: Ensaios sobre literatura, ensino e educação liberal. [s.l.]: Vide Editorial, 2016.

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