Por Erik von Kuehnelt-Leddihn
[Este artigo faz parte do livro “O Mito da Defesa Nacional”, o livro está disponível para download na página “Livros” deste mesmo site e disponível para compra aqui.]
“A história moderna se resume a nada mais que um grande inventário de declarações de bancarrota.”
—Nicolas Gomez Davilla
Monarquia é uma forma de governo raramente bem compreendida na América do Norte. Para muitas pessoas nesta parte do mundo, a monarquia é totalmente obsoleta, uma instituição infantil. As monarquias sobreviventes, no final das contas, ainda desempenham um papel simbólico ou até mesmo psicológico, mas não um papel realmente decisivo na política. Sendo um racionalista e liberal — no sentido internacional e não americano — sou também um monarquista, que concluiu que, junto do Cristianismo e da antiguidade, a monarquia foi responsável pela ascensão e florescimento da Civilização Ocidental, e que na atualidade está assumindo um caráter quase global.
Ainda assim, a mente do homem é mais política do que histórica e, portanto, é esperançosamente ligada ao espírito de seu tempo. Assim como disse Goethe:
Wer nicht von dreitausend Jahren sich weiss Rechenschaft zu geben bleibt im Dunklen unerfahren mag von Tag zu Tag er leben.
[Aquele que de três milênios não pode se dar conta, repousa na sombra de sua inexperiência, à mercê do que vive de dia para dia.]
Tal pessoa, nutrida intelectualmente pela televisão e jornais, ficaria muito surpresa em ouvir o Primeiro Ministro Britânico, Disraeli, dizendo:
A tendência de uma civilização avançada é, em verdade, a Monarquia. A monarquia é, sem dúvida, um governo que requer um alto grau de civilização para seu maior desenvolvimento possível. […] Uma nação educada recua do imperfeito vicariato que chamam de governo representativo.[1]
A democracia é, antes de tudo, a forma mais antiga de governo onde as maiorias governam a minoria. Permanece preservada por comunidades aborígenes em várias partes do globo. Pode-se achar os nomes dos etnologistas que estudaram esse fenômeno em alguns de meus livros.[2] A democracia reapareceu em uma forma mais civilizada em Atenas, mas quando Sócrates, em um verdadeiro julgamento político,[3] louvou a monarquia e foi condenado a morte. Lembremos também que disse certamente que nossa civilização repousa na morte de duas pessoas: um filósofo e o Filho de Deus, ambos sendo vítimas da vontade popular. Sem dúvidas que , discípulo de Sócrates, e , discípulo de Platão, eram ferrenhos monarquistas e, posteriormente, quando a democracia retornou a Atenas, foram exilados para não sofrerem o mesmo que Sócrates. Seguindo Platão e Aristóteles, Tomás de Aquino sustentou que a democracia era o menor mal dentre outras duas más formas de governo; oclocracia e a tirania, que ele admitiu serem piores que a democracia. A tese platônica de que a democracia naturalmente leva à tirania foi também adotada por , que acreditava em uma anakyklosis, um processo evolucionário circular e natural da monarquia para a aristocracia, aristocracia à democracia e democracia à tirania. Certamente, ao lermos A República de Platão, do Livro VIII ao IX, obtém-se a exata descrição da transição da República de Weimar à tirania Nacional Socialista.
O observador historicamente consciente conclui não apenas que países como a Grã-bretanha, Espanha ou os Países Baixos, que hoje em dia são monarquias, já passaram por períodos republicanos. Grécia e México, hoje em dia repúblicas, já foram monarquias duas vezes. Mesmo assim, o caso mais “educacional” é o de Roma. Caso tenhamos a oportunidade — dado nosso conhecimento histórico — de nos encontrarmos um cidadão romano do sexagésimo ano antes de Cristo, e dissermos a ele que seu império logo se tornaria uma monarquia, com certeza que ele reagiria de forma vigorosa, insultando-nos por ignorar totalmente a tradição e mentalidade romana. Monarquia? Um retorno ao autoritarismo de Tarquínio Soberbo? Totalmente fora de questão! César já se aproximava além do horizonte. Agora, se tivermos a chance de conhecer algum de seus descendentes no ano 260 depois de Cristo e contar a ele sobre a indignação perante nossa ingenuidade e arrogância, ele certamente teria cruzado os braços. “Claro que ele estava correto.” “Mas e atualmente?” “Atualmente? Atualmente ainda somos uma república. Veja placas em todos os lugares dizendo SENATUS POPULUSQUE ROMANUS! Uma monarquia? Da mesma forma que os orientais e bárbaros? Totalmente fora de questão!”, “Mas vocês têm um imperador”, “Haha! Imperator significa general e sempre devem haver generais numa república!” Ainda sim alguns anos depois, , o Imperator Augustus, teve uma coroa de ouro colocada em sua cabeça e demandou a proskynesis, isto é, que ajoelhassem perante ele ao se aproximar de sua pessoa. Então até mesmo o mais estúpido dos romanos notou que a república sucumbiu às tentações da carne. Tácito, com certeza, suspeitava disso há bastante tempo.
Ainda existem pensadores sensacionais que possuem um profundo respeito pela ordem monárquica, por motivos tanto racionais quanto sentimentais. Até mesmo o racionalista tem de tomar o fator psicológico em seus raciocínios — do contrário, cessaria de ser um racionalista realista. De fato, a crescente democratização da Civilização Ocidental fomentou o pensamento “monarcófilo”, embora somente em um nível um tanto erudito. Assim, não é de causar surpresa que Theodor Herzl, fundador do Sionismo, tenha dito que a monarquia é a melhor forma de governo, mas visto que nenhum descendente de Davi teria sobrevivido, a constituição aristocrática de Veneza deveria ser estudada no decorrer do planejamento de um “Estado judeu”, enquanto a democracia, como sendo a pior forma de governo, deveria ser estritamente evitada.[4] A história já está nos contando o quão certo ele estava.
Esta introdução é necessária para entender a relação entre a monarquia e a guerra — estamos aqui nos limitando a monarquia cristã e não a algum tipo abstrato de monocracia. Tenham sempre em mente que arche não é kratos — temos, certamente, de nos relembrar das palavras de Nicolas Gomez Davila, que, sem o Cristianismo e a antiguidade em sua base, os europeus nada mais seriam além de bárbaros pálidos.[5] Também não devemos nos esquecer de que a guerra é uma calamidade a ser evitada, um dos vários resultados de nossas imperfeições decorrentes do Pecado Original — mesmo que soldados, em geral, desempenhem um papel positivo no Novo Testamento. E que muitos de nossos santos — de São Francisco até Santo Inácio — já engajaram em combate. Ainda assim; eliminar a guerra, ou ao menos limitá-la, deveria ser uma de nossas metas a serem alcançadas historicamente tanto em nossos tempos quanto no futuro.
II
O Iluminismo, disseminado pela Revolução Francesa, foi o grande reavivamento histórico da democracia, uma sadística orgia sexual da qual o “Marquês Divino” teve um papel de líder tanto pessoalmente[6] quanto intelectualmente. Aqui não é o lugar de descrever os indescritíveis horrores da revolução, que, para o grande público, só foram revelados no aniversário de duzentos anos da Revolução, em 1989.[7] Mas, para explicar seus efeitos nas guerras e nos métodos de combate, é necessário destacar seu papel como personagem na história. A Revolução Francesa queria trazer liberdade e igualdade sob um denominador comum, algo que Goethe considerou que apenas os charlatães prometeriam.[8] A igualdade, certamente, só poderia ser meramente estabelecida em alguma forma de escravidão — tal como uma sebe, só pode ser mantida se constantemente a apararmos. Nesta perversa competição entre liberdade e igualdade, esta última levou a melhor.
Robespierre, antes de ser levado à notre chère mère la guillotine, planejou colocar em um só tipo de uniforme todos os homens franceses e em outro tipo de uniforme todas as mulheres francesas. Ele também queria acabar com todas as torres das Igrejas, já que elas eram “não democráticas”, pois eram maiores que todas as outras construções.[9]
O reavivamento da democracia da antiguidade, com seu ideal de igualdade, era estritamente conectado com o “nacionalismo”, um termo entendido pela maioria dos europeus como o que na América pode-se chamar de etnicismo (não confundir com racismo, que não é um conceito cultural e linguístico, mas sim biológico). O caminho básico ao qual estamos aludindo é o desejo pela mesmidade, gêmea da igualdade. Visto que o que é a mesma coisa é também igual, mas não o contrário. As diferenças, depois de 1789, tornaram-se suspeitas e deveriam ser erradicadas.
A perspectiva tradicional de nossa cultura, certamente, era vertical: Deus Pai no Céu, o Santo Padre em Roma, o rei como pai da pátria, e o pai como rei da família. Nas terras onde a Reforma foi vigente, o rei, em vez do Papa, era a cabeça da igreja. Conectada aos pais estavam as mães — desde a Regina Coeli até as rainhas e demais matriarcas.
A nova ordem agora foi cada vez mais comprimida até se tornar horizontal. Evidentemente, não eram as pessoas enquanto tais que deveriam governar, mas a maioria que deveria governar sobre a minoria, e então os números assumiram uma imensa importância.[10] Até mesmo a verdade se tornou uma questão de maioria, e quanto maior a maioria, “mais verdadeira” era a resposta certa. O ideal era o consentimento, a afirmação — finalmente atingindo quase a totalidade.[11] Daí também se segue a raiz totalitária da democracia, que reside na “politização” de todas as pessoas; até mesmo as crianças, por mais que não votem, hoje em dia são educadas nessa direção.
Faz-se óbvio, também, que a nova ordem não poderia tolerar propriedades de terra e, logo, demandaria revoltas para eliminar as diferenças sociais baseadas em riqueza e renda em vez de eliminar apenas as de nascença. Para esse desenvolvimento, não tiveram de esperar por Karl Marx. Já em 1794, a ira popular também se voltou contra os ricos, e alguns, aliás, já haviam sido guilhotinados por essa razão. Sequer é preciso dizer que o novo horizontalismo é também conflitante com a Tradição Cristã, que enfaticamente não defende igualdade.[12]
Nos livros escolares, pode-se ler “La terreur était terrible, mais grande” — “O medo era terrível, mas grandioso” —, algo que, tendo em vista nossa estupidez humana sem fim, um dia alguém pode ter dito a mesma coisa sobre o Nacional Socialismo Alemão ou sobre o Internacional Socialismo Soviético. A maioria de nossos contemporâneos simplesmente assume que as vítimas da guilhotina eram, em sua maioria, aristocratas degenerados,[13] e que os benefícios finais da revolução foram maiores que os danos e as perdas que os franceses tiveram. Ainda apenas alguns anos antes da celebração de seu aniversário de duzentos anos em 1989, uma enchente de livros bem documentados veio à tona e tiraram a máscara da face daquele ímpio evento. Ainda em 1986, o deputado francês Bernard Antony alertou ao Parlamento Europeu em Estrasburgo para não celebrarem “1789”, pois estariam comemorando o que espalhou o nacional socialismo e o internacional socialismo.[14] Na mesma época vieram as revelações de François Furet, Simon Schama e, acima de todos, de Reynald Secher, cujos assustadores volumes o professor Jean Meyer escreveu em seu prefácio que as piores e mais nauseantes atrocidades sequer poderiam ser mencionadas.[15] Sabemos que, nessa sadística orgia sexual, mulheres grávidas eram espremidas em prensas de vinhos e de uvas, mães e suas crianças eram lentamente assadas até a morte em fornos de padeiros, mulheres tinham sua genitália preenchida com pólvora e eram explodidas. Não podemos continuar a descrever mais tais horrores, e não deveríamos nos surpreender que Sade foi invocado em escritos pornográficos cujas longas passagens são devotadas a reflexões filosóficas (e antirreligiosas). As infâmias e crueldades da Revolução Francesa foram de natureza tão baixa que os nacionais e internacionais socialistas parecem meros humanistas perto desses democratas. No número de vítimas, porém, não é possível superar estes, já que o mundo “progrediu” tecnologicamente depois de 1789 e agora oferece maiores possibilidades de assassinato em massa. Em 1989, as celebrações da Revolução Francesa concentraram-se unilateralmente na “Declaração dos Direitos Humanos” (à sombra da guilhotina!), e sem mencionar a queda da Bastilha com seus nojentos detalhes.[16]
A invenção da guilhotina foi, psicologicamente, um passo em uma “nova direção”: a mecanização do assassinato ágil. Ainda assim a Revolução Francesa deixou para trás algo muito pior que a guilhotina, pois esse algo é permanente: a mudança radical na natureza das guerras, que fizeram essa calamidade humana mais extensiva e intensiva: la levée des masses, conscrição.
III
A pirâmide social, em seu novo horizontalismo, foi erguida, e a quantidade, não a qualidade, passou a ter prioridade. Todos tinham os mesmos direitos — uma partilha de decisões verdadeiramente microscópica, que é efetiva somente se contribui a uma maioria — e também as mesmas obrigações. Era possível votar por um representante, mas, por outro lado, os homens tinham o dever de defender seu país (ou de participar nas agressões de seu país), o que envolve labuta em quartéis, feridas de cativeiro, mutilação e até mesmo morte — com certeza um mal negócio. O recruta quase cessou de ser uma pessoa real e foi despido de sua privacidade e se tornou um “indivíduo”, um termo que realmente significa apenas a última parte indivisível de um todo coletivo.[17] Hippolyte Taine descreveu os resultados desse retorno ao estágio das tribos primitivas ecoando as seguintes palavras, extraídas de sua obra Origines de la France contemporaine:
Põe-se nas mãos de cada adulto uma cédula, mas, nas costas de cada soldado uma mochila com tantas promessas de massacre e bancarrota para o século XX, com tantas exasperações de débil vontade e desconfiança, com tanta perda um esforço salutar, por uma perversão de descobertas produtivas acompanhada por uma melhora nos meios de destruição, para um recuo em direção às inferiores e hostis formas das antigas sociedades combatentes, pelo qual se faz um retrógrado passo em direção a egoísticos e brutais instintos, em direção aos sentimentos à mesma maneira e moralidade das antigas cidades e tribos bárbaras, a qual conhecemos muito bem.[18]
Uma das mais imediatas e degradantes consequências do serviço militar geral em tempos de guerra foi a “doutrinação” dos recrutas. Eles eram em sua vasta maioria inocentes e até mesmo civis desmotivados cujo entusiasmo para lutar e matar era muito limitado. Então eles foram ordenados a odiar o inimigo, degradados à impessoalização da perversidade, aberração e destituição de todo tipo de virtude. Isso seria diferente em idades prévias, quando os soldados eram homens — tanto cavalheiros quanto rufiões — que amavam lutar e ofereciam seus serviços a qualquer um que os liderasse e os pagasse bem. O príncipe Eugénio de Sabóia ofereceu em vão os seus serviços à França, mas terminou sendo um glorioso herói militar para os Habsburgos. O mesmo aconteceu ao Barão Gideon de Laudon, nascido na Livônia, mas de origem escocesa, cujo pai era um oficial nos serviços suecos. Laudon, entretanto, serviu primeiro no exército russo e, então, ofereceu sua experiência a Frederico II da Prússia; ainda, rejeitado por Frederico, Laudon entrou no grande exército austríaco do Sacro Imperador Romano-Germânico — e derrotou Frederico em batalha. Essas mudanças de lado são muitíssimo raras hoje em dia, mas não inauditas.[19]
Visto que bem no meio do século XIX a grande maioria dos “recrutas” tinham pouquíssima educação — o analfabetismo em massa prevaleceu por gerações —, eles tinham de servir por muito tempo no exército, frequentemente três, às vezes quatro anos. Aqueles que tinham níveis de bacharelado (faixa etária de 18 a 19 anos) serviam apenas por um ano, recebiam comissões e se tornavam oficiais de reserva. A ideia era ter soldados versados nas armas até nas forças de reserva, periodicamente convocados para exercícios. A perda de tempo para todos era considerável.
Caso uma grande potência adotasse nosso sistema, isso literalmente forçaria outros países (no mesmo continente), para que não saiam em desvantagem numérica, a fazer exatamente o mesmo. E, uma vez que as monarquias da Europa dolorosamente experienciaram a superioridade numérica do exército francês nas guerras napoleônicas — enquanto monarquias “constitucionais” —, elas entraram na mistura do caldeirão democrático, agora elas também eram vítimas de um fenômeno chamado “militarismo”, resultando na “horda armada”. A Inglaterra, contando com seu “isolamento esplêndido”, era uma exceção à regra, mas os Estados Unidos, politicamente já uma vítima da “Escola Francesa”, iniciou a Guerra entre os Estados, não apenas entre seus cidadãos, mas até mesmo os estrangeiros em solo americano; apesar destes não votarem, eles ganharam dinheiro, e o dinheiro era amortizado por sangue. O serviço militar voluntário é um outro caso. Em menor grau, pode-se recorrer a ele pelo desejo de lutar[20] e, num maior grau, pelo fascínio pela vida no exército[21] e, no mais alto grau, pelo desejo de defender o país de alguém ou trazer à vida um grande ideal.[22]
No livro do qual citamos Taine, o autor americano Hoffman Nickerson escreveu:
Durante o último século e meio, a civilização recriou a horda armada. Previamente uma raridade, tornou-se o instrumento aceito de qualquer grande esforço militar. Porém, isso não veio sozinho. Exatamente cento e cinquenta anos atrás, em 1789 — pouco depois de os Estados Unidos procurarem proteger a si mesmos contra a democracia com sua constituição federal — a Revolução Francesa começou. Daqueles tempos até hoje, as ideias democráticas vieram a dominar a política, tal como os exércitos em massa, que dominaram a guerra. É a tese deste livro que esses dois são inseparavelmente conectados um com o outro e com uma terceira característica, o barbarismo.[23]
IV
O compromisso no século XIX da monarquia com a democracia foi também simbolizado pelo fato de que os monarcas apareciam em uniformes militares e desempenhavam proeminentes papéis nos exércitos. A ordem horizontal-identitária assumiu um progressivo caráter “nacional” (étnico) e a tendência geral ia em direção a um Estado etnicamente unificado. Encaramos o “Pangermanismo”, o “Pan-Italianismo” (o movimento de Risorgimento), até mesmo o “Pan-Eslavismo”, que transcendeu as fronteiras étnicas “menores”.[24] De mãos dadas com a Revolução Francesa, nós vemos, no campo dos falantes de alemão e dos eslavos, a ascensão de movimentos coletivos de ginastas, cultivando um violento espírito nacionalista, manifestando-se em gigantescas performances “sincronizadas” em massa.[25] Este treinamento físico também implicou na finalidade paramilitar de impressionar o público com números.[26] Aqui temos, sem dúvida, uma das raízes culturais do nacional socialismo. Os comunistas também amavam performances uniformizadas e sincronizadas em massa. Enfim o horizontalismo se manifesta visualmente.
Isso é parte da transformação ainda “misturada” do século XIX. Desnecessário dizer que esse novo ideal, o Estado etnicamente uniforme, estaria mais em harmonia com a “militarização” do que um Estado etnicamente misto — e também com o desenvolvimento de instituições parlamentares. Mark Twain nos deu uma descrição da vida parlamentar em Viena,[27] e John Stuart Mill insistiu na opinião que a democracia é problemática em um Estado multilíngue[28] — isso sem dúvida, já que instituições totalitárias precisam de uniformidade linguística. Adicionado a isto está o fato de que a maioria étnica, através de seu partido (ou partidos), busca governar democraticamente, sem ser no sentido liberal, as minorias. (Multilingualidade em um parlamento, tal como no exército, cria muitas enormes dificuldades). Eis o motivo da hostilidade da revolução em relação ao uso de línguas não francesas na república. O surgimento do nacionalismo democrático e étnico entrou em sincro-mesh. Esses dois movimentos “horizontais” de massa facilmente se combinaram com o termo demos. É interessante o fato de as forças armadas da vermelha “República Democrática Alemã” serem conscritas e ideologicamente recrutadas como National Volksarmee, o “Exército Popular Nacional”, cujo termo “popular” aparece em duas formas. Porém, quando o nobre e monarquista Charles de Gaulle propôs ao socialista Leon Blum transformar o Exército Francês em um armée du métier, um exército puramente profissional constituído por voluntários, seu plano (como se fosse um truque antidemocrático direitista) foi imediatamente rejeitado. Tal exército poderia ser facilmente mobilizado contra a população e poderia desenvolver um esprit de corps, que seria totalmente “antidemocrático”.
V
Já foi abordada a questão da “doutrinação” dos conscritos que, naturalmente, torna-se muito importante em tempos de guerra. Um mal ainda maior é o fato de, em virtude de os recrutas serem convocados da população em geral, as pessoas em si precisarem ser doutrinadas, ou melhor, instigadas a odiar o inimigo coletivamente. Para esse propósito, os governos nos tempos modernos recorrem ao apoio da mídia, que informará ao público as atrocidades do inimigo — com pouca ou nenhuma consideração pela verdade. O ataque será lançado em três direções: salientando a maldade e inferioridade da nação hostil e os feitos cruéis cometidos pelas suas forças armadas, que é composta por covardes, por uma casta baixa recrutada a partir um povo diabólico.
Na Primeira Guerra Mundial, a Tríplice Entente, sendo mais democrática, também era mais habilidosa em organizar seu ódio coletivo. Tomando vantagem da estupidez das massas (em todos os lugares!), eles poderiam imprimir qualquer coisa, até mesmo o que era mais absurdo, que as massas acreditariam, por exemplo, que os soldados alemães cortavam as mãos de bebês belgas. Um holandês chamado Louis Raemaeker produziu, em serviço aos Aliados, gravuras incrivelmente nauseantes representando atrocidades cometidas pelos exércitos alemães. Uma das piores mostrava uma garotinha francesa nua sendo crucificada e cuspida por soldados alemães barbudos e com óculos. Todavia nada parecido com isso foi feito pelos impérios centrais.[29] Georges Bernanos descreveu, em um memorável livro, as idiotices da propaganda de guerra naquele período. De acordo com Bernanos, aos soldados franceses era contado que os corpos dos alemães emitiam um cheiro pior do que os dos franceses, e também que os alemães eram ridiculamente covardes e sequer ameaçavam interromper a confortável vida dos poilus franceses em suas trincheiras. Era uma propaganda enganosa do pior tipo.[30] (Mesmo assim, durante os motins franceses em 1917, batalhões inteiros foram “dizimados”, isto é, um em cada dez homens era executado. Então a guerra não entretia e nem era tão confortável no final das contas).
Naturalmente, a Primeira Guerra Mundial deixou de ser uma guerra de gabinete entre monarcas, mas já era o que os alemães chamavam de Völkerringen, uma guerra entre nações, ao menos até 1917, quando a Monarquia Russa caiu e tornou a entrada dos Estados Unidos politicamente viável. A partir disso a guerra se tornou uma cruzada ideológica “Tornar o mundo seguro à democracia”, assim como já havia sido experienciado, no final do século XIX, quando a França desafiou a Europa no campo ideológico. Interessante notar o modo pelo qual as “tensões” eram diferentes em dois frontes — oriental e ocidental. No Fronte Oriental, até 1917, havia uma luta entre três imperadores, e esta era a razão da moda antiga ter, de algum modo, sobrevivido e continuado em um nível mais alto. Ainda era uma guerra entre cavalheiros,[31] um fato evidenciado não só no fronte, mas também na pátria. Na Rússia, artesãos e comerciantes, até então prisioneiros, eram frequentemente libertos e, até a tomada do poder pelos Bolcheviques, eles ganhavam um bom dinheiro. “Alienígenas inimigos” eram aprisionados na Grã-Bretanha, França, Itália e na Alemanha, mas não na Áustria.[32] Minha família viveu por metade de um ano em um campo de prisioneiros na Áustria, onde meu pai instalava e dirigia uma estação de Raio X, e nós, crianças, amávamos os prisioneiros (a maioria eram russos) com os quais brincávamos (eles nos ensinavam o Alfabeto Cirílico). Depois disso, vivemos por aproximadamente dois anos em Baden, perto de Viena, nos quartéis-generais do Exército Austro-Húngaro, onde eu ostentava uma roupa de marinheiro com uma fita no meu boné escrito “H.M.S. Renown”. Também tínhamos uma governanta francesa e falávamos francês com ela nas ruas. Mutatis Mutandis, alguns destes fatos seriam impensáveis no Ocidente mais “progressista” (leia-se mais degradado). Depois da queda da grande fortaleza de Przemist (que foi capitulada por causa da fome), os oficiais russos convidaram seus colegas austro-húngaros para um banquete, onde brindavam uns com os outros. Veio-me a notícia de um oficial austríaco que, feito prisioneiro, entregou aos russos seu cartão de visitas.[33] Me diverti muito, depois de uma aula em uma discussão com americanos. Um professor, um verdadeiro esquerdista imbecil, com longos cabelos, óculos escuros e jeans, queixou-se do fato de ele não conseguir entender o meu termo “uma guerra de cavalheiros”, “mas é claro não” foi a minha reação. Pode-se imaginar o quanto riram os alunos.
VI
Uma guerra entre nações inteiras que desaguou em uma cruzada ideológica — a palavra “cruzada” tendo implicações quase religiosas — estava fadada a assumir características integralmente totalitárias. Anatole François notou isso muito bem.[34] Os “totalitários” poderiam acender o fervor de seus soldados mais facilmente, pois operavam em uma estrutura altamente autoritária. (Isso também explica o fato de o Exército Alemão ter lutado tão bem durante dois anos — 1942-1945 — em uma impossível reação de retaguarda). Ainda assim a propaganda de ódio das “democracias” teve, em parte, bastante sucesso. Assim, os Estados Unidos decidiram (adicionando alguns motivos racistas) colocar todos os estrangeiros, bem como americanos com descendência japonesa, da Costa Oeste em campos de concentração (campos estes que foram inventados pelos britânicos durante a Guerra dos Bôeres). Havia, nesses campos de concentração, cidadãos americanos com apenas um avô japonês, pareciam com “caucasianos” e sequer falavam uma palavra em japonês.[35] Depois da rendição em massa dos soldados alemães, em maio de 1945, estes não foram tratados como prisioneiros de guerra ordinários protegidos pela convenção de Hague, mas como FID (“Forças Inimigas Desarmadas”) e foram tratados miseravelmente. Estavam morrendo de fome e sofreram enormes perdas — possivelmente mais de um milhão.[36] A Indignação acerca dos campos de concentração alemães, entretanto, desempenhou um papel minoritário para a existência dessa “política”, pois os fatos eram amplamente desacreditados. As pessoas lembraram das mentiras disseminadas acerca dos alemães durante a Primeira Guerra.[37]
Depois de entrar na era da Horda Armada, as guerras inevitavelmente tomaram novas formas e características. A ideia não era mais ter melhores estratégias que o inimigo e simplesmente vencer batalhas, mas — visto que a guerra deixou de ser entre pessoas e passou a ser entre ideologias — matar a maior quantidade de inimigos possível, sendo assim, as guerras assumiram um caráter “exterminador”. Os mercenários do passado pertenciam a diferentes nacionalidades e, uma vez em que eles se “alistavam”, eles poderiam ser empregados pelo seu empregador por diversas razões e operações ou serem até mesmo “vendidos” a outros empregadores. Aquele que vende a si mesmo a alguém também pode sê-lo a outro.[38]
Visto que as guerras evoluíram de forma bem democrática, de conflitos entre cabeças com coroas a conflitos entre massas populacionais, nações inteiras tornaram-se coletivamente inimigas de outras nações. Assim, as guerras finalmente poderiam ser declaradas contra civis, não apenas contra cidades sitiadas, mas contra populações inteiras — homens, mulheres e crianças. Junto de todos esses fatores também está o progresso tecnológico, agora é possível atacar as regiões interiores do inimigo: vilarejos e cidades. A aviação tratou do problema.
Os franceses, pioneiros na aviação, começaram a Primeira Guerra bombardeando uma procissão de Corpus Christi em Karlsruhe e matando crianças, mas os alemães seguiram e jogaram bombas de seus zepelins em cidades britânicas e dispararam mísseis de artilharia de longa distância (80 milhas) em Paris, franceses tiveram de morrer, independente de idade ou sexo. E isso tudo parecia aceitável. A Europa havia decaído a um nível baixíssimo.
Bem curiosamente, foi o Terceiro Reich que (apesar de estar planejando guerras agressivas) queria restringir o combate aéreo apenas em frentes de batalha bem definidos. Em 1935, os alemães, desejando um acordo ilegalizando a guerra a civis no interior, sugeriu aquilo à Grã-Bretanha, que, naquela época, estava sob o regime dos trabalhistas. Entretanto, o oferecimento de tal pacto caiu por terra, na medida em que todos os esforços para humanizar a guerra faria dela mais aceitável e, portanto, uma pancada à nobre causa do pacifismo. Atualmente, os mais importantes autores britânicos confirmam a tese de que foi na Segunda Guerra Mundial onde o combate aéreo à outrance havia começado, desejado e performado pelas democracias, não pelos nacionais socialistas. Os ataques alemães fora das zonas de guerra eram sempre retaliações. Alguns autores britânicos admitem tímida e vergonhosamente esse fato; outros se orgulham,[39] o principal entre esses últimos é o Sr. Churchill.[40]
O general J.F.C. Fuller bem disse que “Foi o Sr. Churchill que ligou o fusível que detonou uma guerra com a maior devastação e terrorização já vista desde a invasão dos Seljúcidas.”[41] Alcançou seu apogeu com a destruição de Dresden, a Florença Alemã, com uma perda de 204.000 vidas[42] e a aniquilação de Hiroshima e Nagasaki.[43] Embora os japoneses tenham pedido desesperadamente por condições de armistício — em Abril de 1945, através do Vaticano e em Julho via Moscou — a resposta foi apenas a famosa e idiota formula da “rendição incondicional”. (Os americanos não sabiam disso e, durante aquele período, não apenas milhares de japoneses morreram em vão, mas também vários jovens americanos). O ódio generalizado pela propaganda aqueceu a mentalidade coletivo-horizontal a um grau tão grande que, quando a guerra chegou ao Pacífico, nas palavras do líder socialista americano Norman Thomas, ela assumiu um caráter de um tumulto militarmente organizado de raças.
O aspecto racista da guerra recebeu uma expressão bem concreta em um incidente memorável: um soldado americano mandou ao Presidente Roosevelt um abridor de cartas feito do fêmur de um soldado japonês morto em ação. O presidente escreveu uma carta de agradecimento e expressou sua esperança em receber mais presentes do tipo. Isto veio à notícia dos japoneses, ao ponto de que Ken Harada, o embaixador japonês no Vaticano, decidiu protestar através dos canais de comunicação de Roma. O presidente então mudou de ideia e prometeu dar a seu abridor de cartas um funeral digno. Poderíamos imaginar alguma das cabeças coroadas da Europa envolvidas em um “incidente” similar a este? Francisco José da Áustria se utilizando do fêmur de um granadeiro prussiano como um abridor de cartas? Ou a Rainha Vitória de um modo tão delicado fazendo o mesmo com um osso de um franco-atirador bôere? Apenas um chefe de uma tribo da Alta Ubangi agiu de forma similar.
Uma evidência ainda mais grave de puro gorilismo apareceu no bombardeamento do centro da Gestapo em Hague, que matou mais de 800 holandeses, ou, ainda pior, o “bombardeio de tapetes” de Le Havre, pouco antes da libertação da cidade, mas depois da evacuação dos alemães da cidade, com mais de 3500 vítimas. De Gaulle, em Londres, estava furioso, mas os aliados britânicos e americanos justificaram-se dizendo: “Nós achávamos mesmo que os alemães ainda estavam na cidade!” A partir de então De Gaulle chegou no limite. Matar 3.500 franceses apenas para matar alguns alemães![44] Ele foi a Le Havre para o funeral, seguindo o cortejo com o clero.
Também não havia respeito algum pelos tesouros culturais do Velho Mundo. Na Primeira Guerra, os alemães foram acusados de terem bombardeado a Catedral de Reims (com a desculpa de que espiões estavam escondidos na torre) e deliberadamente queimaram partes de Louvain-Leuwen porque civis supostamente atacaram suas tropas. Mas a Segunda Guerra Mundial foi muito mais “progressista”, o que significa que a Europa e a América do Norte decaíram nos últimos 200 anos sobre governos “populistas” e chegou ao nível cultural e ético do Glegle de Daomé ou de Idi Amin Dada da Uganda.[45] Os ataques sobre a Alemanha foram chamados de “Ataques de Baedecker”, pois, temendo pela sua segurança, os aviões dos Aliados voavam numa altura bem alta e esvaziaram seus cargueiros mais ou menos perto dos centros históricos das cidades, destruindo as construções mais belas, ao passo que a produção industrial de guerra sofreu, espantosamente, pouco. Assim, os corações de Frankfurt, Munique, Nuremberg, Hamburgo e Bremen estavam um caos, já os estabelecimentos industriais em torno destas cidades não. (Alguns dos porta-vozes Aliados explicavam que era melhor “atingir” as habitações dos trabalhadores alemães, enquanto outros diziam que ao aniquilar a Kultur alemã, isso destruiria a arrogância nazista). Ainda sim essa orgia sangrenta contribuiu pouquíssimo para a vitória dos Aliados. A IG-Farben e outras grandes empresas funcionaram até o final da guerra.
Uma das piores e mais imbecis proezas foi a destruição do antigo mosteiro de Montecassino na Itália feita pelo Exército Americano. Os aliados foram informados de que não haviam tropas alemãs no mosteiro. Visto que a construção tinha permanecido intacta, um grande apelo foi feito nos Estados Unidos dizendo que poupar o mosteiro significaria se render aos “interesses dos católicos romanos” ao custo de vidas americanas. “Nossos garotos” teriam de morrer apenas para agradar ao papa! Enfim os militares cederam a fim de reforçar a “frente doméstica”. A vox populi não deveria ser frustrada, e uma decisão política, não militar, foi tomada — a antiga construção foi reduzida a fogo e cinzas. Então tornou-se mais seguro para os alemães ocupar as ruínas, já que defender uma construção solidamente construída do fogo de uma artilharia pesada seria um suicídio. Agora os soldados americanos encararam os inimigos muito melhor entrincheirados e protegidos pelas rochas da abadia destruída. Nenhuma parede que caísse poderia enterrá-los. As perdas aliadas tornaram-se muito maiores. E esse foi o caso dos pobres poloneses, que foram traídos e tiveram de lutar com eles, mas a “opinião pública” estava satisfeita: a guerra foi travada democraticamente.[46]
Mesmo assim, os alguns soldados americanos pensavam nas perdas de belezas arquitetônicas frequentemente irreparáveis? Um oficial que se situava em Benevento, perguntou se ele teve algum engano ou falha, ele replicou ao jornalista americano: “Não há nada o que fazer — a Itália está horrível com estes monumentos clericais.”
Infelizmente, a Segunda Guerra teve outro aspecto fatal: o movimento de resistência, entusiasticamente aplaudido pelo “público” da Aliança Ocidental. Uma exceção deve ser feita para os poloneses da Armia Kraiowa, tal como os soldados judeus, pois, tanto os socialistas internacionais, quanto os nacionais socialistas queriam desprovê-los das classes mais altas ou exterminá-los de uma vez.[47] Sem exército legal algum para sua defesa, eles tiveram o direito moral de lutar para proteger sua própria existência.[48] Mesmo assim, tal como em outros países, o exército ocupante não teve outros meios para combater estes astutos atacantes senão prendê-los e matá-los. As nações não completamente democratizadas não se engajaram em tais atividades e, com muita frequência, os “resistentes” eram colaboradores que, vendo que o Terceiro Reich era um navio prestes a naufragar, mudaram de lado.[49] Obviamente, a Resistência Francesa se tornou verdadeiramente ativa depois do colapso da Aliança nacional-internacional. Houve um predecessor da Resistance civil — depois que a França se tornou uma república em 1870 — na forma dos franc-tireurs, totalmente comprometida em manter o horizontalismo crescente. Antes, não se tinha o direito de participar de uma guerra sem se utilizar o “manto do rei”. A alternativa a isso foi descer até o nível da selvageria. Isto foi de algum modo diferente no caso dos Balkans, onde, após 50 anos de governança turca, a tradição cristã havia sido quebrada e as guerras passaram a ser feitas “coletivamente”, tal como dolorosamente experienciamos em duas guerras mundiais.[50] Primeiro tivemos os komitadjis nacionalistas, e depois os partizani ideológicos.
VII
Um dos piores resultados da democratização das guerras é, e permanece sendo, a dificuldade em acabar com uma guerra pela paz ou, ao menos, por grandes períodos de paz, pois, em uma ordem lentamente ou totalmente democratizada, tendo lutado com soldados conscritos, o governo é amplamente feito por representantes das pessoas, por homens que não pensam historicamente, mas politicamente. De história, economia, mentalidades culturais e geografia eles não sabem nada. Ademais, eles pensam “pessoalmente”, não dinasticamente. O que eles teriam primeiramente em mente? O bem-estar de seus netos e bisnetos ou a vitória nas próximas eleições? Os soldados que retornam, caso a guerra tenha sido ganha, também querem ver os frutos de seus sofrimentos e anseios pela “paz” na forma de muita prosperidade e ganhos para seu país. (Mercenários pensavam o inverso. Eles tinham em mente o seu próximo contrato).
Além disso, a generosidade é uma virtude frequentemente mais encontrada nas poucas camadas superiores do que entre as massas. Apesar de tudo, é necessário inteligência para suspeitar que a generosidade muitas vezes vale a pena, enquanto o egoísmo não. Fenelon, em um livro brilhante, exortou Dauphin:
Tratados de paz são vazios, sem significado, se você é o mais forte e força seu vizinho a assinar um tratado para evitar um mal maior; então ele assina o tratado do mesmo modo que uma pessoa cede sua bolsa a um ladrão que está apontando uma pistola a sua garganta.[51]
Mesmo assim, já no século XIX, no qual testemunhamos a democratização das monarquias (“constitucionais”), vimos que o aviso de Fenelon foi cada vez mais ignorado. O ímpeto alemão pela unificação e o Risorgimento ofereceram oportunidades para anexar países inteiros e reduzir ricas dinastias à indigência. Nesse aspecto, os italianos foram os que começaram. Os soberanos de Modena, Parma, Toscana e os Bourbons de ambas as Sicílias tiveram de abandonar seus países. Depois da libertação de Schleswig-Holstein da coroa dinamarquesa feita pela aliança dos alemães, os herdeiros legítimos não puderam tomar posse de suas heranças. A situação ficou pior com os resultados da guerra Alemã-Prussiana em 1866,[52] que terminou com a Prússia anexando não apenas Schleswig-Holstein, mas também Hesse-Nassau, a cidade imperial de Frankfurt e o Reino de Hannover.[53] Esta guerra foi parte da política de Bismarck, que havia começado sua vida como um típico prussiano conservador e um devoto cristão luterano, mas que, com o tempo, se tornou um “nacional-liberal” que pouco depois do estabelecimento do Império Alemão (o “Segundo Reich”), iniciou como um “nacionalista progressista” a Kulturkampf contra a Igreja Católica.[54]
Embora a grande ruptura tenha vindo com o início da Primeira Guerra, que, como já dizemos, deixou de ser uma guerra entre nações e passou a ser uma cruzada ideológica “para fazer com que o mundo esteja seguro para a democracia”. Por volta de 1900, a Europa tinha apenas duas repúblicas democráticas (França e Suíça), uma forma de governo até então representada no globo de forma ampla apenas pelas nações “enriquecidas” da América do Sul e Central em 1910 e em 1912 por Portugal e pela China.[55] A grande vitória da democracia na Europa Central — seu triunfo na Rússia durou apenas sete meses — e o desaparecimento de três imperadores — criou uma nova cena. Os democratas esperavam moldar a “paz” democraticamente, isto é, pelo consentimento da maioria dos votantes nas nações vitoriosas. Caso olhemos aos Quatorze Pontos de Woodrow Wilson,[56] os derrotados precisariam ter esperanças de o princípio de autodeterminação ser aplicado até mesmo a eles, mas esse amável documento serviu de mera isca para rendição, como a ridícula farsa que foi do Estatuto do Atlântico. Visto que as vitoriosas foram as democracias, os “tratados” não foram tratados, mas foram ditados que tinham de favorecer os votantes de um país e, já que estes foram ensinados a “odiar o inimigo”, os ditados eram, com efeito, votados (mesmo indiretamente) pelas agitadas massas. Na Inglaterra, tivemos a famosa “Eleição Khaki”, uma orgia de demagogia na qual Lloyd George prometeu arruinar a classe média alemã através de exorbitantes reparações, para fazer a Alemanha pagar “de modo que as sementes germinem” e para “enforcar o Kaiser”.
George F. Kennan tem dito muito bem que quase todos os nossos males têm raiz na Primeira Guerra, não o combate, mas os “resultados”. Eu assumiria esta tese por quatro motivos: a intervenção dos americanos prolongou artificialmente a guerra e preveniu um compromisso com a paz;[57] a combinação do combate nacional com uma cruzada ideológica, a montanhosa ignorância histórica, geográfica, econômica e psicológica por parte dos políticos, que, naturalmente (pensando apenas nas próximas eleições) queriam favorecer os votantes, e o vácuo intelectual das amadas pessoas cujas emoções foram feridas até o enésimo grau.
O mau gosto de Bismarck, que foi quem organizou as celebrações para o estabelecimento do Segundo Reich em Versalhes, estava agora sendo imitado pelos palhaços que preparavam a humilhação do Reich Alemão na Sala dos Espelhos da mesma construção. Lá, tal como nos ditados muito mais importantes de Saint Germain-en-Laye e Trianon, foram deixadas as fundações do Terceiro Reich e da Segunda Guerra com admirável previsão e precisão de detalhes. É desnecessário dizer que o Tratado de Versalhes causou um tremendo dano a Alemanha internamente, e mudou drasticamente o mapa da Europa. Foi a destruição do Império Habsburgo que fez da Alemanha a vencedora geopolítica da Primeira Guerra Mundial. Fazendo fronteira, depois de 1919, com apenas uma grande potência — França —, a Alemanha era agora vizinha tanto direta quanto indireta, no Leste, de estados em parte artificiais e em parte militarmente indefesos. Como Sua Magnificência, o reitor da Universidade de Breslau, Erns Kornemann, apontou em 1926, a hora de tomar vantagem dessa situação vantajosa viria cedo ou tarde. E essa hora chegou. O que Hitler realmente herdou dessas sanguessugas que tinham ditado os tratados Suburbanos de Paris foi não somente uma situação interna caracterizada por uma economia marginalizada e a imposição de uma forma de governo inviável,[58] mas também uma posição geopolítica exclusivamente lucrativa devido à divisão da Áustria-Hungria.[59] Se Hitler tivesse algum senso de humor, ele teria erguido um monumento colossal em honra a Woodrow Wilson.[60]
Voltando a esses acontecimentos, John Maynard Keynes, que auxiliou Lloyd George nessas conferências, poderia ter escrito que
A Paz Cartaginesa não é praticamente certa e possível […]
Não é possível retroceder o Relógio […] sem estabelecer tais estirpes na estrutura europeia e deixar solta tamanha força humana e espiritual que, movendo além das fronteiras e raças, irá esmagar não apenas você e suas “garantias”, mas suas instituições e a ordem existente de sua Sociedade.[61]
Bem, uma dessas “garantias” foi a Liga das Nações, a qual Compton Mackenzie chamou de “um típico sonho do Sacro Império Romano-Germânico” e o qual o Congresso dos Estados Unidos se recusou a se juntar.[62] Todavia, não há dúvida de que a satisfação geral reinou nas nações vitoriosas — não apenas entre os americanos, britânicos, franceses e italianos, mas também entre os sérvios, romenos e tchecos.[63] Entretanto, os polos inteligentes, vendo que seus países estavam espremidos pela Alemanha e União Soviética, continuaram céticos.[64] Contudo a “história”, sempre muito brutal, talvez diria aos derrotados: “Já que vocês foram desleais ao seu Eu melhor, a suas heranças e tradições, vocês não mais servirão a imperadores, mas a exterminadores como escravos miseráveis, servirão a megalomaníacos sem misericórdia, que vos arrastarão para outros massacres!” E, aos vitoriosos, ela diria: “Lucrando de sua superioridade em homens e em riqueza, vocês abusaram de seu triunfo e pagaram caro não apenas com homens, mulheres e crianças, mas também perderam seu prestígio e possessões ao redor do mundo!”
Voltando a Primeira Guerra, o antigo entusiasmo democrático em estender os grandes ideais de Revolução Francesa reaparece,[65] mesmo ao custo de um enorme derramamento de sangue, pois a democracia significa para as pessoas mais simples a “libertação das regras” — tanto por cima quanto por fora. Quando um compromisso de paz estava em jogo, logo depois, os idealistas democráticos entraram em guerra. A “mão esquerda de Wilson” na política externa, George D. Herron, preferiu até mesmo uma vitória prussiana a uma paz compromissada — que, para ele, significava a aristocracia, os barões do Ruhr, a Igreja Católica e os Habsburgos, e “quebrantar o coração de Deus”, enquanto que, até depois do triunfo dos Hohenzollerns, as nações “ainda poderiam acordar depois de uma longa e funesta noite à intimidade cósmica e conhecimento infinito”.[66] Herron era muito admirado por Wilson, que fez dele seu intermediador na Europa durante a guerra e, assim, deu-lhe a oportunidade de torpedear os empenhos para a paz dos austríacos, em fevereiro de 1918, pois, caso houvesse paz, a sobrevivência política dos Habsburgos seria possível.[67] No entanto, se houver algum recrutamento, as vidas dos soldados são de pouco valor — são facilmente substituíveis. o mesmo vale para a rejeição sofrida pelo segredo alemão pouco antes da eclosão da Segunda Guerra Mundial (a conspiração Halder-Beck) e então durante a guerra de seus esforços através do Dr. Bell, o bispo de Chichester, que implorou em vão para ter a cooperação de Winston Churchill.[68]
Os alemães tiveram de assinar o “tratado” em Versalhes porque o bloqueio da fome funcionou como se fossem parafusos apertados com o dedo. A esperança de uma democracia liberal na Rússia foi extinta pelos radicais Sociais-democratas, os chamados bolcheviques, e, assim, a Rússia não mais era um “parceiro adequado para uma liga honrosa”, já que Wilson havia saudado o governo de Alexander Kerensky. (A Nova Rússia, a “Pátria Socialista”, teve, 20 anos depois, a oportunidade maravilhosa de iniciar a Segunda Guerra juntamente aos nazistas).
Teriam os monarcas europeus sequer tentado impor o monarquismo na Segunda ou na Terceira República Francesa, no Brasil após a queda da monarquia, ou em Portugal em 1910? Não, porque não existe “monarquismo”. Democracia, enquanto democratismo, é uma ideologia gnóstica, determinada a “salvar o mundo”.[69] A monarquia é “familiar”. A família é algo natural. Ela não necessita de impulsos filosóficos. Não representa uma religião secular.
No entanto, para fazer as pessoas felizes (à sua própria maneira), é necessário às vezes um pouco, ocasionalmente até muita, pressão. Em fevereiro de 1914, Wilson pensava que os mexicanos seriam muito mais felizes se eles imitassem politicamente os Estados Unidos, que, por sua vez, haviam imitado a França.[70] Isso preocupou Sir Edward Grey, ministro das Relações Exteriores britânico. Um diálogo curioso aconteceu entre Grey e o embaixador americano, Walter Hines Page. O tema foi a relutância mexicana em adotar um modelo pleno de democracia, que os Estados Unidos, afinal, promoveram e incentivaram no México antes mesmo dos dias em que haviam apoiado Benito Juarez, o assassino do Imperador Maximiliano.[71] Assim foi a tal troca de opiniões:
Grey — Suponha que você tenha que intervir, o que então?
Page — Faça com que votem e vivam de acordo com suas decisões.
Grey — Mas, suponha que eles não vão viver assim.
Page — Vamos novamente e os façamos votar novamente.
Grey — E continuar assim por 200 anos?
Page — Sim. Os Estados Unidos estarão aqui por 200 anos e podem muito bem continuar a atirar neles naquele pequeno espaço até que eles aprendam a votar e governar a si mesmos.[72]
Com essa mentalidade pouco sofisticada, as “jovens democracias” foram forçadas a “gozar” do autogoverno, a delirar sobre sua “Nova Liberdade Republicana”.[73] Esta formulação lembra um dos conquistadores napoleônicos do Tirol e o espírito sob o qual os Tratados de subúrbios de Paris foram ditados.[74] A França afogou a Europa em sangue durante o período entre 1795-1815. Ainda no Congresso de Viena, seus convidados foram recebidos com grande honra, a língua das sessões e discussões foi o francês e a França deixou as mesas de conferência — ligeiramente ampliadas.[75] Não havia clamor para que “enforquem o Empereur!” nem havia um “público” cujo desejo animal de vingança precisava ser satisfeito.
VIII
Claro, seria ingênuo pensar que as guerras no verdadeiro período monárquico de nossa história cristã tenha sido um bom passatempo. As guerras não eram raras, e a disciplina entre os mercenários estava miserável. As cidades ocupadas tiveram de pagar contribuições, o saque foi aceito, os soldados saqueadores foram uma praga. Foi apenas no século XVIII que as guerras assumiram um caráter civilizado.[76] O fato de os generais pertencerem a famílias nobres ajudou muito. Eles tinham o direito à educação, e a aristocracia da Europa se relacionava internacionalmente, embora não na extensão das famílias reais e imperiais.[77] Ao julgar o caráter de seus inimigos, eles certamente nunca foram influenciados pela mídia de massa. Não se pode imaginar Marlborough sendo movido pelos editoriais do Londres’s Daily Courant … como foi o presidente Kennedy por David Halberstam do jornal The New York Times.
Os monarcas, no entanto, não eram apenas uma classe internacional, mas também interracial, uma grande vantagem também às nações que eles governaram, porque lhes deram um certo distanciamento de seus súditos e, assim poderiam julgá-los com mais objetividade. Em 1909, as únicas dinastias soberanas genuinamente nativas em seus países, na Europa, foram os Petrovic-Njegos em Montenegro e os Karagjorgjevic na Sérvia, que certamente não eram os mais importantes ou notáveis. A dinastia alemã dos Saxe-Coburg-Gotha governou em Saxe-Coburg, na Grã-Bretanha,[78] na Bélgica, em Portugal e na Bulgária; os Holstein-Gattorps na Rússia (os verdadeiros Romanov morreram com Pedro II da Rússia); os Bourbons governavam na Espanha; os Alemanicos Hohenzollern que governavam não só na Prússia, mas também na Romênia, os Sonderburg-Gluecksburg-Augustenburgs na Dinamarca, Noruega e Grécia; os Nassau na Holanda e em Luxemburgo; os Habsburgos suíço-lotaríngios na Áustria-Hungria; e os Saboias (franceses) na Itália. Todos estes descendiam de ,[79] de Carlos Magno, tinham uma gota de sangue judeu[80] e, ao vermos a linha materna de Maria Teresa, encontra-se príncipes kumanos (turco-tártaros).[81]
É bem verdade que a Reforma criou uma barreira entre as famílias católicas e “protestantes”, mas ela era às vezes quebrada.[82] A despeito das discordâncias, guerras e diferenças denominacionais, até mesmo em 1870, o derrotado Napoleão III jantou como prisioneiro junto a Guilherme I da Prússia e Bismarck no Castelo de Wilhelmshohe, onde o rei prussiano cumprimentou o imperador dos franceses com um “Mon cher monsieur frere!”[83] O autocontrole, boas maneiras e generosidade eram características próprias dos monarcas.
Aqui, temos de ter em mente que a interrelação entre os monarcas foi estreitada no decorrer dos séculos, pois eles não eram totalmente imunes a influência dos desenvolvimentos históricos após 1789, em outras palavras, a democracia, o socialismo,[84] o nacionalismo, tentações “horizontalistas”.[85] É até mesmo duvidoso o fato de ter sido Lloyd George sozinho o responsável por não salvar as vidas da família imperial da Rússia.[86] Os britânicos, em 1917, recusaram conceder asilo a ele.
A Monarquia tinha muitas vantagens. Primeiramente, poder-se-ia esperar de um monarca a capacidade psicológica[87] e intelectual para exercer sua tarefa. Contemplando a preparação intelectual de alguns políticos para exercer suas tarefas, pode-se apenas levantar as mãos em horror — frequentemente é sua “aparência” e seu dom de fala que o levou ao escritório. Uma segunda asserção diz respeito (ou melhor, dizia) às relações internacionais dos monarcas e a ausência de laços locais.[88] Uma outra vantagem é a de os monarcas não deverem suas posições a partido, facção, propriedade; classe ou grupo de interesse algum, mas apenas, como diria Bossuet, ao “doce processo da natureza”.[89] A quarta vantagem é a de que os monarcas têm a chance de agir historicamente. É óbvio que em democracias, onde a preocupação maior é a de ganhar eleições e também onde a instabilidade com agradáveis mudanças espaciais — um tipo de show punch-and-judy — chega a ser motivo de orgulho, uma política estrangeira construtiva é bem perto do impossível.[90] Os monarcas se mantinham em ofício até morrerem e deixarem seu reino a seus filhos ou ao parente mais próximo. Eles poderiam agir historicamente, não politicamente, de uma maneira não limitada pelo tempo. Daí temos os vários “Testamentos Políticos”.
Isso foi habilmente demonstrado pelo Professor Hans-Hermann Hoppe em um ensaio que comparou o processo democrático a uma criancinha desejando ter seus anseios concluídos de forma imediata e protestando em lágrimas se houver alguma demora ou uma reação negativa. Um monarca, enquanto membro de uma dinastia pode fazer planos para um futuro distante, até mesmo por gerações.[91] Ainda sim seria totalmente errôneo acreditar que um retorno à monarquia, até mesmo a uma monarquia cristã, resolveria todos os nossos problemas. Lembremos da saudação que o grande monarquista Charles Maurras concedeu à monarquia: “Le moindre mal. La possibilité du bien” — O mal menor. A possibilidade de algo bom.
Mesmo assim, um monarca enquanto membro de uma dinastia pode elaborar planos para um futuro distante, até mesmo por gerações. Em nossos tempos, com o globo transformado em um cenário extremamente complexo, o abismo entre scita e a scienda, o real conhecimento dos votantes e candidatos comparados com o conhecimento necessário está inevitavelmente ampliando a todo momento. E visto que o conhecimento necessário entre os ativos e passivos no processo democrático é momentâneo, apenas sentimentos, simpatias e antipatias, fatores prazerosos e não prazerosos são eficazes. Portanto, democracias agem como coelhos pulando em todas as direções imagináveis, em guerras indesejadas, em “cruzadas” idealistas e em fatais acordos de paz.[92] Desde a infância, os monarcas eram preparados para suas tarefas. Eles “herdavam” a profissão tal como tradicionalmente faziam os artesãos no passado. O filho de um alfaiate tornava-se alfaiate, e assim por diante. Estes alfaiates produziram roupas aceitáveis, às vezes ruins, ocasionalmente roupas excelentes. O mesmo se aplica aos monarcas. Todavia dentistas, advogados; sapateiros, encanadores e fazendeiros não poderiam produzir roupa alguma, mas apenas puras monstruosidades. Assim, o declínio da Europa, já acontecendo por mais de 200 anos — que também quer dizer que não se deve esquecer o já mencionado fato de as monarquias terem se comprometido com a democracia durante o século XIX e de terem adquirido um papel meramente psicológico no século XX.[93]
As guerras, entretanto, são indesejáveis sob todas as circunstâncias. A solução ideal — que, no presente, não passa de um sonho sem qualquer esperança de se realizar — seria um grêmio de monarquias cristãs, tal como vemos na Malásia,[94] controlando o globo ciente do fato de que as guerras, hoje em dia, graças ao desenvolvimento da tecnologia, química, física e biologia assumiram um caráter suicida.[95] Elas ameaçam a sobrevivência de toda a humanidade, que até agora não tem um denominador espiritual comum. Nem a ONU, nem a União Europeia. Até agora, só se pode recorrer a uma unidade econômica comum para prosperar e uma defesa comum contra inimigos estrangeiros (mas sem movimentações agressivas). Sobre estas circunstâncias, o brasão de armas deveria ser um porco espinho gordo, um animal bem acostumado com seu ambiente natural, mas certamente não é um símbolo que combina com a Europa.
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Notas de Rodapé
[1] Confira Benjamin Disraeli, Coningsby, or The New Generation (Londres: Longmans, 1849), livro 5, cap. 8.
[2] Confira Erik von Kuehnelt-Leddihn, Liberty of Equality? (Front Royal, Va.: Christendom Press, 1993), p. 314, n. 474.
[3] Os aspectos políticos da morte de Sócrates podem ser encontrados na Encyclopaedia Britannica, tanto na versão de 1911 como na edição mais recente. Outros autores são mencionados no livro Leftism Revisited, de Erik von Kuehnelt-Leddihn (Washington, D.C.: Regnery, 1989), p. 349, n. 47. Recentemente I.F. Stone, em seu The Trial of Socrates (New York: Anchor Books, 1989), abordou o mesmo assunto de um ponto de vista esquerdista. Segundo ele, era algum tipo de “fascista”.
[4] Confira Theodor Herzl, “Der Judenstaat,” em Theodor Herzls zionistische Schriften (Charlottenburg: Juedischer Verlag, n.d.), p. 119. Os Romanos investigaram no decorrer do ano 100 se quaisquer descendentes do Rei Davi ainda estariam vivos, mas acharam apenas duas pessoas idosas. É desnecessário dizer que a maioria dos Israelitas viam em não o filho de um pobre oikodomos, mas um príncipe com sangue real e pretendente ao trono de Israel.
[5] Confira Nicolas Gomez Davila, Auf verlorenem Posten (Viena: Karolinger, 1992), p. 259, traduzidos a partir do Nuevos Escolios a un texto implicito (Bogota: Nueva Biblioteca Colombiana, 1986).
[6] Marquês de Sade foi feito prisioneiro na Bastilha, uma prisão um tanto luxuosa para um criminoso da nobreza, até 4 de julho, 1789, por uma lettre de cachet real, a mando de sua madrasta (muito por causa de crueldades cometidas contra sua esposa). Na Bastilha, ele incitou a população dos arredores, com uma chaminé, a libertar “prisioneiros inocentes”. O diretor da prisão implorou a Luís XVI para liberá-lo de seu fardo, quando então Sade foi transferido para Charenton, uma prisão para criminalmente insanos. Dez dias depois, no dia 14 de julho, a Bastilha foi tomada, Sade foi liberado de Charenton e, eventualmente, se tornou o “Cidadão Brutus Sade” comandando de uma Section des Piques (um tipo de SS democrática), foi um revolucionário muito, muito ativo, que se gabava do papel que desempenhou na queda da Bastilha. Sem dúvidas que se tornou uma figura de culto aos estudantes em 1968. (Confira: Gilbert Lely, Vie du Marquis de Sade, 2 vols. [Paris: Gallimard NFR, 1952 and 1957], vol. 1, p. 273).
[7] Confira Reynald Secher, Le genocide franco-français (Paris: Presses Universitaires de France, 1986). O mais inacreditável ocorrido foi numa fábrica em Pont-de-Cle, onde manufaturaram capas de livros e calças a partir das peles de monarquistas mortos.
[8] falou sobre “Phantasten und Charlatane”, sejam eles legisladores ou revolucionários. Confira suas Maximen und Reflexionen, No. 955.
[9] Confira Crane Brinton, The Jacobins (New York: Macmillan, 1930). Em Estrasburgo, preparações já eram feitas para destruir os pináculos da catedral mundialmente famosa. Em alguns vilarejos, o “projeto” já havia sido realizado. Já que os Alsácios “não falavam a língua republicana” (i.e., Francês), planos foram feitos para diminuir a falta de “mesmidade”. As propostas eram (1) tomar suas crianças, (2) dispersar as famílias por toda a França, ou (3) guilhotiná-los todos. Estas asserções de Brinton, um professor de Harvard, parece mais uma descrição do Terceiro Reich.
[10] Nesse sentido, entende-se a colocação de Jorge Louis Borges: “Yo descreo en la democracia porque es un abuso curioso de la estadistica.”
[11] Nas eleições alemãs de 1932, cerca de 98% da população foi votar—tão democrático, mas tão suicida! As potências totalitárias posteriormente “produziram” números aproximando 100%, mas eles ainda amavam convocar “plebiscitos” — muito democráticos.
[12] É incrível que se possa encontrar cristãos bem-educados que acreditam que “somos todos iguais perante Deus”. Se Judas Iscariotes fosse igual a João Batista ou João Evangelista, o Cristianismo poderia desistir. O dominicano R.L. Bruckberger disse com razão que o Novo Testamento é uma mensagem de desigualdade humana (ou poderia alguém imaginar que, no Dia do Julgamento, todas as sentenças poderiam ser idênticas? Que Deus não distinguiria os santos dos pecadores?).
[13] Daqueles condenados à morte pelas “cortes” e, usualmente guilhotinados, apenas 8% pertenciam à nobreza. Os camponeses representavam a maior parte — 32%. Não temos dados exatos sobre o número de mortos nas grandes matanças, sobretudo em Vendée, Bretanha, Lyon, Toulon, Bordeaux e Marseilles. Grandes matanças ocorriam em mosteiros e conventos. As estimativas vão de 120.000 a 250.000.
[14] insistia que a revolução alemã era uma contrapartida à Revolução Francesa. Os soviéticos nomearam os navios de guerras que capturaram do antigo regime de “Danton” e “Marat”.
[15] Houveram precursores às publicações de Secher, Furet, e Schama, autores como Cabanes, Nass e Jacques Cretineau-Joly, que contou a história de como a genitália da princesa de Lamballe foi levada como troféu pelas ruas de paris e como uma aprendiz de cozinheiro, depois da queda das Tulherias, foi coberto em manteiga e assado vivo. O entusiasmo pela igualdade teve consequências assustadoras.
[16] Os defensores da Bastilha eram soldados aposentados e alguns mercenários suíços. Foi prometido a eles liberdade caso se rendessem. Ainda assim a multidão os matou sem piedade, e um jovem açougueiro qui savait faire les viandes foi forçado a cortar a cabeça do governador de Launay. Sete pequenos criminosos foram libertados.
[17] A palavra “pessoa” vem do etrusco phersu, eram máscaras cujos autores tinham de usar, determinando seu papel (intransferível) numa peça. (É interessante que individu, em francês, é um termo para abuso).
[18] Citado em Hoffman Nickerson, The Armed Horde, 1793-1939 (New York: Putnam, 1940).
[19] Bismarck, que era um embaixador prussiano em São Petersburgo, recebeu a oferta, feita por Nicolau I, de uma carreira no Exército Russo, que foi rejeitada. Por outro lado, o embaixador português em Berlim, Conde Joaquim Oriola, foi transferido ao Serviço Civil Prussiano. Era perfeitamente viável escolher por um empregador dentro ou fora de seu próprio país.
[20] Confira Nickerson, Armed Horde. p. 15.
[21] Os irlandeses em Nova Iorque se revoltaram contra esta regulação de recrutamento. A indignação popular se voltou contra eles, referindo-se a eles como incorporações de “Rum, Romanismo e Rebelião.” Ainda assim, em 1935, conheci em Londres um inglês que serviu no Exército Prussiano na Primeira Guerra. Visto que seu pai estava permanentemente internado num sanatório alemão, ele viveu com ele até pouco tempo antes da Primeira Guerra. Seu “sonho” de criança era se tornar ou um ator ou um oficial prussiano. O pai rejeitou ambas as carreiras, mas eles descobriram que um estrangeiro poderia ser aceito pelo Exército da Prússia. Então ele se tornou um oficial prussiano e serviu fervorosamente Guilherme II depois que a guerra eclodiu, mas apenas no Fronte Oriental. Em agosto de 1914, ele fez seu juramento ao exército deu solenemente mais empenho ao exército alemão apesar de sua nacionalidade. No entanto, ele desprezou os nazistas e, com muita dificuldade, ele conseguiu voltar à Grã-Bretanha sem ser julgado por traição.
[22] Na guerra civil espanhola, haviam voluntários idealistas de países estrangeiros nos dois lados — comunistas, socialistas e democratas. Entre os “nacionalistas”, encontrei franceses e irlandeses.
[23] Confira Nickerson, Armed Horde, p. 14.
[24] Durante a celebração do aniversário de 300 anos da Reforma, no Castelo de Wittenberg, os estudantes pangermânicos adicionaram o vermelho da revolução e o adicionaram às cores preto e dourado da Bandeira Imperial. Também o ministro luterano Jan Kollar, um eslovaco na Hungria, concebeu a ideia do Pan-Eslavismo.
[25] Friedrich Ludwig Jahn passou alguns anos numa fortaleza (uma honrosa prisão) como um “demagogo”. Ele visitou Paris em 1814, fantasiado como um “antigo alemão”, e empurrava todos os que passavam por ele nas calçadas, ele escalou o Arco do Triunfo e tentou tirar a tuba das mãos do anjo. Felizmente ele falhou. Miroslav Tyrs (Tiersch) fundou o radicalmente anti-Habsburgo e Anti-alemão movimento dos ginastas de Sokol (Falcon), padronizado depois da Turnerbund de Jahn. As multidões amam ver as massas em movimento.
[26] Nas democracias, onde há a adoração de números, a pequenez é evidentemente uma grande desvantagem. Jacob Burckhardt já dizia, em 1866, que
O desespero em tudo que é pequeno é seriamente um mal em todos os aspectos. Aquele que não pertence a uma nação de trinta milhões chora: “Nos ajude, Ó Senhor, estamos nos afogando!” Os filisteus querem comer de um caldeirão com misturas diabólicas ou ela não tem um gosto muito bom para ele.
Confira Emil Duerr, Freiheit und Macht bei Jacob Burckhardt (Basel: Helbing and Lichtental, 1918). Aqui se encontram algumas das raízes do pangermanismo e do pan-eslavismo.
[27] Mark Twain descreveu a desesperançosa situação no Parlamento Austríaco, ele o visitou em 1897. Sua “recordação de viajante” apareceu na Harper’s Magazine.
[28] John Stuart Mill declarou: “Instituições livres estão próximas do impossível num país feito de diferentes nacionalidades”. Considerations on Representative Government (New York, 1882), p. 310. A Suíça seria uma exceção a essa regra, visto que a lealdade helvética dos suíços estava acima de suas etnias.
[29] Também havia manifestações de ódio correntes entre as pessoas dos Impérios Centrais, como, por exemplo, o poema de ódio de Ernst Lissauer. Slogans como Gott strafe England (Que Deus puna a Inglaterra!) e Serbien muss sterbien! (A Sérvia tem de morrer!) eram frequentemente repetidos, mas ninguém inventou absurdos tais como sauerkraut “o repolho da liberdade” ou pastores alemães “alsácios”. Na Inglaterra, as pessoas chegavam a queimar pianos alemães e escondiam os seus Daschsunde (cachorros salsichas) para preveni-los de serem torturados pelas crianças. Nos Estados Unidos, as pessoas pararam de lecionar alemão. As pessoas que lecionavam alemão tiravam férias e, depois disso, passavam a ensinar espanhol! O meu pai (1879-1952), um tradicional cavalheiro, considerava o ódio entre nacionalidades o zênite da vulgaridade.
[30] Confira Georges Bernanos, La grande peur des bien-pensants (Paris: Grasset, 1949), pp. 414-18. Bernanos, um católico devoto e monarquista, caracterizou a Primeira Guerra (na qual ele participou como um soldado) como: “Aquela famosa e impiedosa guerra dos pacifistas e das democracias humanitárias.
[31] Aviadores ocidentais, que frequentemente engajavam em duelos pessoais no céu, ainda estavam lutando uma guerra de cavalheiros. Fritz Reck Malleczewen (que morreu no campo de concentração de Dachau), descreveu o desespero de um ulano (NT: soldado de cavalaria) alemão perfurando até a morte por um cavaleiro russo com sua lança. Chorando, ele se ajoelhou diante do homem morrendo, que o perdoou. Solzhenitsyn, por outro lado, mencionou cossacos que capturaram um carro com generais alemães sem abusarem dos generais. “Esta guerra foi um acidente, não foi planejada!”, explicaram eles posteriormente. Quando os austríacos reconquistaram Lemberg (Lwow), eles acharam, num apartamento abandonado pelos ocupantes russos, uma lista de objetos danificados e o dinheiro para cobrir o reparo. Isto foi diferente na Segunda Guerra. Naquela época, a maioria dos soldados soviéticos eram letrados, eles “progrediram”, foram “iluminados” e se comportaram pior que gorilas — mais de 2 milhões casos de estupro foram registrados, inclusive em áreas já libertas!
[32] Acerca do tratamento e do conceito de “alienígenas inimigos” (enemy aliens), confira Arnold J. Toynbee, A Study of History (Londres: Oxford University Press, 1939), vol. 4, pp. 160-62. Este tipo de ódio organizado contra “alienígenas inimigos” levou a hostilidade em massa. Assim, o “patriótico” canaille de São Petersburgo ateou fogo na embaixada alemã depois do início da Primeira Guerra, mas mais ou menos as mesmas pessoas, cerca de três anos depois, foram instrumentos essenciais na consolidação da revolução dos Bolcheviques, o “Outubro Vermelho”.
[33] Dos cavalheiros naquela guerra, um bom relato está no filme La grande illusion com Stroheim e Gabin (1937). O título do filme cabe perfeitamente na luz dos eventos que aconteceram depois de 1 de setembro de 1939. Esse filme, mostrando os pilotos franceses sendo abatidos pelos alemães e, depois disso, acolhidos por eles, nos lembra da história de Caulaincourt sobre o Barão Wintzigerode, que, vestido com um capuz bem longo por cima de seu uniforme russo, interrogou um soldado francês que estava de guarda em frente a um campo perto de Moscou em 1812. Ao ser interceptado e prendido por um oficial francês, ele foi levado a , que descobriu que ele era um agente de seu irmão Jerome, rei de Westphalia. O arrogante corsico perdeu seu temperamento, ameaçou Wintzingerode de execução por espionagem, e queria agredir fisicamente o barão, mas os oficiais franceses o seguraram e, envergonhado pelo mau comportamento de seu soberano, convidaram Wintzigerode para um jantar na messe dos oficiais. Confira Memoires du General de Caulaincourt, Duc de Vicence (Paris: Plon, 1933), parte 1, p. 100.
[34] Depois de Ribot, o ministro das relações exteriores da França e, antes de tudo, planejou destruir os esforços pela paz do Imperador Carlos da Áustria, Anatole François colocou: “Um Rei da França, sim, um rei teria pena de nossa pobre população, que sangrava branco, atenuados, no fim de suas forças. Mas a democracia não tem coração, não tem escrúpulos. Um escravo dos poderes do dinheiro, não tem pena e é desumana. Confira Sir Charles Petrie, Twenty Years Armistice and After (Londres: Eyre and Spottiswoode), p. 12. René Schickele, eu seu Die Grenze (Berlin: Rowohlt, 1932), p. 145-46, nos conta que Clemenceau ameaçou prender Anatole François, ele seria preso se ele publicasse uma única linha manifestando suas reações à guerra.
[35] Confira Carey MacWilliams, “Moving the West-Coast Japanese”, em Harper’s Magazine, Setembro de 1942. Suas esposas totalmente “Caucasianas” geralmente eram presas junto deles também. Da parte mais exposta da população havaiana, um terço era japonesa, mas eles não eram “concentrados”, visto que os “Filhos do Ocidente Dourado” não eram ativos naquelas terras. Entretanto, não houve caso de espionagem algum entre os “japoneses americanos”, e o batalhão americano mais condecorado consistiam em “japoneses” havaianos. Que inclusive desfilaram em Nova Iorque.
[36] Confira James Bacque, Other Losses (Toronto: Stoddard, 1989). A Alemanha reclamou que 1.7 milhões de prisioneiros não retornaram depois da guerra. É bem verdade que o Terceiro Reich deixou morrer de fome vários prisioneiros russos. Prisioneiros alemães morreram de fome na Rússia, mas, enquanto estavam voltando a seu país, àqueles que retornaram, comida era implorada pela população faminta.
[37] Em novembro de 1945, pessoas foram entrevistadas em uma avenida de Detroit sobre suas reações aos horrores dos campos de concentração alemães. 90% estava convencida de que todos os filmes acerca dos alemães foram “encenadas” e lembraram os entrevistadores acerca das propagandas falsas na Primeira Guerra—Bebês belgas tendo suas mãos cortadas! Tal como disse em seu De divinatione: “não acreditamos num mentiroso nem se ele disser a verdade.”
[38] O Grão Duque de Hesse não “vendeu” seus próprios súditos numa formação armada aos britânicos durante a Guerra de Independência Americana; esses homens eram mercenários de diversas nações, que se alistaram voluntariamente em seu exército.
[39] O Exército Alemão estava prestes a conquistar Rotterdam e Varsóvia, quando a Luftwaffe atacou estas cidades. O Bombardeio de Coventry foi uma retaliação pelo bombardeio de Berlim. Basil Liddell-Hart insistiu no fato de que os alemães consideraram o proposto (mas rejeitado) pacto aéreo, mas os aliados sempre renovaram seus bombardeios. Confira Basil Liddell-Hart, “War Limited”, em Harper’s Magazine (março de 1946), pp. 198-99. O assistente principal do Ministro das Forças Aéreas defendeu, em duas publicações, a política de destruir a economia inimiga e, acidentalmente, matar setores inteiros da população. Confira J.M. Spaight, The Battle of Britain (Londres: Geoffrey Bles, 1941) e Bombing Vindicated (Londres: Geoffrey Bles, 1944). Churchill, em seu The Second World War, 6 vols. (Boston: HoughtonMifflin, 1948), vol. 2, pp. 565, 567, admitiu ter planos para construir uma enorme força aérea estrangeira além das capacidades alemãs para destruir o Terceiro Reich. Suas perdas humanas no combate aéreo, comparada aos britânicos, foram numa proporção de 1 para 10.
[40] De fato, dois pilotos alemães foram rebaixados porque, nos estágios primários da guerra, eles largaram bombas no extremo leste de Londres e não em alvos militares. A RAF alertou contra o ataque a Berlim e outras cidades alemãs, mas Churchill se opôs a essa ideia. Confira Phillip Knightley, The First Casualty (New York: Harcourt, Brace, 1975), pp. 237-38.
[41] Confira General J.F.C. Fuller, The Second World War, 1935-1945 (New York: Duell, Sloane and Pearce, 1949), pp. 22-23.
[42] Confira David Irving, The Destruction of Dresden (Londres: William Kimber, 1963). A cidade estava completamente chocada com os refugiados do Leste. A questão interessante é a quantidade de não alemães que trabalhavam como escravos, os cidadãos dos países Aliados, eles foram mortos naquele ataque, certamente ao menos 5000 mortos. Ordenado por Churchill, talvez para espantar os russos em Yalta. Em Fevereiro de 1945, a guerra estava praticamente perdida pera os alemães.
[43] Nagasaki sofreu ainda mais com os bombardeios do que Hiroshima. Foi o berço da Igreja Católica no Japão, e tinha a maior catedral do Extremo Oriente. A catedral estava cheia de pessoas em adoração naquele dia, quando a “Fat Boy” foi jogada, algumas jardas da catedral, matou cerca de 8% da população católica do Japão no subúrbio de Urakami. Eles haviam sobrevivido por 265 anos na “clandestinidade” até serem dizimados pelos lacaios de Harry S. Truman.
[44] Confira Ann O’Hare McCormick em The New York Times, 9 de Outubro de 1944. Mais de 1.500 pessoas forma também feridas ou permanentemente mutiladas — um verdadeiro massacre.
[45] Confira o artigo “Dahomey” na edição de 1911 (11ª) da Encyclopaedia Britannica, e Henry Kyemba, State of Blood (Londres: Corgi Books, 1977). Idi Amin também “deu palestras” na ONU em Nova York, mas praticou a “democracia gastronômica”, convencido de que a carne humana tinha um “saboroso gosto salgado”. (Kyemba era um de seus ex-ministros).
[46] O chofer do meu sogro serviu como soldado alemão em Montecassino e me disse que ele e seus companheiros pensaram que os americanos tinham enlouquecido. Não havia um único soldado alemão no prédio. Os escombros eram ideais para defesa. O Exército americano também não conseguiu lutar na Guerra do Vietnã de maneira puramente militar, mas muitas vezes teve de agir em sincronia com uma opinião pública fabricada. (Estive lá cinco vezes, hospedado pelo Exército Americano, e sei do que estou falando).
[47] Os dois socialismos tentaram em conjunto exterminar os poloneses das camadas mais altas. Os russos admitiram terem esquartejado 15000 em Katyn e em outros lugares. Em Auschwitz, encontramos, conforme andamos de barraca em barraca, fotos de vítimas polonesas. O campo foi primeiramente designado para exterminar poloneses, a massa judaica veio em sua maior força apenas por volta de 1941.
[48] O mesmo vale para a batalha pelo Gueto de Varsóvia. Não houve paz ou armistício entre a Alemanha e a Polônia, nem uma guerra declarada entre a Alemanha e a Tchecoslováquia.
[49] De acordo com the Goebbels Diaries (New York: Doubleday, 1948) a cooperação entre a indústria tcheca e a classe trabalhadora com os ocupantes foi perfeita. Os alemães caminharam em direção a armadilha deixada pelo Governo Tcheco que estava exilado, o qual organizou o assassinato de Heydrich, e eles retaliaram com a destruição de Lidice. Depois da guerra, os alemães da Boêmia-Morávia, mesmo antes de terem sido expulsos, sofreram de forma atroz — mais frequentemente do que se não estivessem nas mãos de seus colaboradores que agora provaram o seu “patriotismo” torturando civis indefesos. Aqueles que possuem qualquer ilusão acerca do caráter humano deveriam reler Josué 8:21.
[50] Na Primeira Guerra Mundial, os ocupantes austro-húngaros tiveram muitos problemas com os franco-atiradores (erroneamente chamados de komitadjis). Na Segunda Guerra, a selvageria e a crueldade não tinham limite — croatas lutaram ao lado dos alemães e com os sérvios; sérvios lutaram contra croatas, alemães, italianos e outros sérvios de uma maneira asiática. Churchill apoiou os bolcheviques, pois (como ele contou a Fitzroy MacLean), eles eram “melhores em matar alemães” do que seus aliados originais sobre o Coronel Draza Mihajlovic, que foi covardemente traído pelo Ocidente e executado pelos titoístas.
[51] Confira François Fenelon de la Mothe, “Direction pour la conscience d’un roi”, em Oeuvres (Paris, 1787), vol. 25, p. 489.
[52] Esta foi a guerra da Liga Alemã contra a aliança Prussiano-Italiana. Chamá-la de “Guerra Austro-Prussiana” é um equívoco.
[53] Teria Guilherme I aprovado a guerra contra a Liga Alemã? Sua rainha deixou Berlim ostensivamente bem no início da guerra.
[54] Bismarck foi a força que moveu e decidiu. Guilherme I da Prússia tinha certa relutância em se tornar imperador alemão — imperador da Alemanha. Um país com esse nome existe oficialmente apenas desde 1949. É preciso lembrar que os Habsburgos governaram as “Germanies” por mais de 600 anos, os Hohenzollerns apenas por 47 anos, e que o predecessor de Wilhelm, seu irmão, Frederico Guilherme IV, havia declarado que ficaria muito feliz se, na coroação de um Habsburgo como imperador alemão, ele pudesse segurar a bacia da cerimônia.
[55] Não mencionamos a Polônia que, desde 1572, era uma monarquia eletiva governada pela nobreza e era chamada de república (rzeczpospolita). Este era o país mais tolerante da Europa, mas deixou de existir em 1795.
[56] Os “Quatorze Pontos” na verdade foram escritos por Walter Lippmann. Que mencionou o “desenvolvimento autônomo” das nacionalidades da Áustria-Hungria. A palavra “autônomo” não é clara em inglês. Pode significar separação total, mas também direitos e privilégios locais. Lippmann, um homem admirável, e me disse que tinha em mente o segundo significado de “autônomo”.
[57] Em uma entrevista ao New York Enquirer, Churchill repreendeu, em junho de 1936, os Estados Unidos por terem se juntado aos Aliados em 1917. Estes haviam secretamente tentado chegar a um acordo de paz que teria salvado inúmeras vidas humanas e certamente teria evitado a ascensão do nacional-socialismo e, provavelmente, até do comunismo na Rússia. Sua entrevista foi lida em voz alta por um “isolacionista” perante o Congresso em setembro de 1939. No entanto, tal compromisso com a paz não teria realizado o sonho de Wilson de tornar o mundo inseguro para a democracia.
[58] Jacques Bainville temia a ideia de uma República Alemã (reivindicada pelo socialista Alemão Karl Liebknecht). Ele tinha certeza de que conseguiria imitar os Jacobinos e, em nome de uma Alemanha “una e indivisível” tornou-se um nacionalista violento. (ler esse artigo em Action Francaise, 29 de setembro de 1914). Como ele estava certo! viu no Nacional Socialismo Alemão uma imagem próxima a Revolução Francesa e se gabava de que seu partido representava a “esquerda alemã” (Em Der Angriff, 6 de dezembro de 1931).
[59] Para o amplo público nas democracias ocidentais, a Alemanha e “o Kaiser” eram Os Inimigos, mas não tanto entre os principais políticos, que eram unidos por uma aversão protestante de esquerda contra a monarquia do Danúbio da qual se encontra ampla documentação em meus livros. detestava tanto os Habsburgos que, quando os alemães se aproximaram de Paris em agosto de 1914, ele apenas criticou a Áustria. (Veja a surpresa de Poincaré em seus diário). Lloyd George adorava Hitler, mas atacou Franco “porque sempre me alinho contra os padres”, conforme ele explicou a Virginia Cowley. Sir Denis Brogan e Raymond Aron chamaram muito corretamente a Primeira Guerra Mundial de “Segunda Guerra da Sucessão Austríaca”. A Segunda Guerra Mundial foi, sem dúvida, a Terceira Guerra nessa série.
[60] O social-democrata Paul Loebe, presidente do Reichstag, embora tenha sido duas vezes encarcerado pelos nacional-socialistas, recebeu uma pensão do Terceiro Reich por causa de seus méritos na substituição da monarquia por uma república na Alemanha.
[61] Confira John Maynard Keynes, The Economic Consequences of the Peace (Londres: Harcourt, Brace, 1920), pp. 4-5.
[62] Como uma desculpa para Wilson, deve-se mencionar que, em 1896, ele havia sofrido seu primeiro derrame, e um segundo derrame massivo em 1906, que o cegou de um olho e o forçou a escrever com a mão esquerda. Esta ruína de um homem ganhou as eleições de 1912 graças às travessuras de Theodore Roosevelt. Nas conferências de paz de Paris, Wilson foi torturado por duas graves doenças e sofreu, em Setembro de 1919, um terceiro derrame, que posteriormente resultou em sua esposa dirigindo a Casa Branca. Consulte Edwin W. Weinstein, Woodrow Wilson: A Medical and Psychological Biography (Princeton, N.J.: Princeton University Press, 1981). Tão importante e assustador é o livro que Sigmund Freud escreveu juntamente com William C. Bullitt, Thomas Woodrow Wilson: A Psychological Study (Boston: Houghton Mifflin, 1967). Freud disse a Max Eastman que Wilson foi “o tolo mais idiota de todo o século e também um criminoso sem perceber”. (Desnecessário dizer que Freud não era um homem de esquerda e nunca quis que suas teorias fossem usadas pela profissão médica).
[63] O dia 28 de junho, dia do assassinato do sultão Murad, um sérvio, em 1389, foi exatamente 525 anos depois do assassinato duplo de Sarajevo. Foi habilmente selecionado para a assinatura do Tratado de Versalhes, subscrito em 28 de junho de 1919, também pelo “Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos”, que, em 1929, foi denominado “Iugoslávia”. No mesmo dia, uma reunião de ministros da “Tchecoslováquia” decidiu enviar um telegrama de felicitações por esse crime ao novo estado dos Bálcãs, expressando “a esperança de novos feitos heroicos”. Massacrando um casal! Aí vemos a herança sangrenta da Revolução Francesa.
[64] A Polónia era ardentemente odiada por Lloyd George, e ele fez questão que uma parte polonesa da Silésia fosse dada à Tchecoslováquia. Quando soube do avanço do Exército Vermelho em Varsóvia, em 1920, ele dançou alegremente. Quanto ao personagem, confira a biografia de seu filho, o conde Lloyd George de Dwyfor, My Father Lloyd George (Nova York: Crown Publishers, 1960).
[65] A “democracia” é, antes de tudo, um problema teológico. O Estado é o resultado do Pecado Original. A democracia incorpora a ilusão de que a “auto regência” significa realmente governar a si mesmo sem ninguém mais envolvido, ao passo que é simplesmente a regra da maioria sobre a minoria. Sir Henry Campbell-Bannerman nos disse que “o autogoverno é melhor que o bom governo”. Assim, da próxima vez que tivermos uma doença grave, deveríamos praticar o charlatanismo em nós mesmos e dispensar a profissão médica.
[66] Confira George D. Herron, The Menace of Peace (Londres: Allen e Unwin, 1917), pp. 9-10. Wilson se viu aparentemente compreendido apenas por este ministro destituído (por ter cometido adultério), um ex-socialista e pacifista que, após seu divórcio, casou-se com a filha da riquíssima Sra. Rand, fundadora da Rand School of Social Science em Nova Iorque.
[67] A ruína intencional de Herron do esforço de paz austríaco, em fevereiro 1918, é muito bem descrito por seu “assistente” eslovaco, Stefan Osusky, em George D. Herron: Dovernik Wilsonov pocas vojny (Pressburg: Naklad Prudov, 1925). Aliás, foi uma ideia de Herron ter a sede da Liga das Nações localizada em Genebra, a cidade de Calvino e Rousseau. Os “Herron Papers” estão guardados no Hoover Institution, Stanford, Califórnia, e estão disponíveis em 13 volumes ordenadamente digitados.
[68] Conheci o bispo de Chichester depois da guerra, em Nova York. Ele me garantiu que Churchill não havia lido o material que ele lhe deu. (Com uma garrafa de uísque todos os dias, ele obviamente não tinha tempo). Anthony Eden temia irritar os soviéticos caso contratos fossem firmados com generais alemães. Eden foi também o homem que entregou os anticomunistas russos, croatas e eslovenos aos soviéticos e a Tito. Foram massacrados em massa.
[69] O caráter gnóstico da democracia também era óbvio a Eric Voegelin, Science, Politics and Gnosticism (Chicago: Regnery, 1968).
[70] Tive o grande prazer em perguntar ao público americano onde na Declaração da Independência e/ou na Constituição se encontram substantivos como “democracia” e “república”. A surpresa deles é grande quando descobrem que esses termos não aparecem em nenhum dos documentos, e quando eu digo a eles que, de acordo com Charles Beard, os Pais Fundadores odiavam a democracia mais do que o Pecado Original, eles ficaram surpresos. Tampouco ficaram maravilhados quando lhes digo que, depois de 1828, seu país se esvaiu na Escola Francesa.
[71] O Duce recebeu seu primeiro nome espanhol de seu pai anarquista. Foi Benito (em vez de Benedetto), em homenagem a Benito Juarez, quem mandou executar um monarca. Os fasces, devemos lembrar, são um símbolo republicano e o Fascismo encontrou sua plena realização apenas na Repubblica Sociale Italiana, com sede em Salo.
[72] Confira Burton J. Hendrick, The Life and Letters of Walter H. Page (Garden City, N.Y.: Doubleday, 1925), vol. 1, p. 188.
[73] Quanta influência feminina americana estava até então ativa no cenário político? Masaryk, que persuadiu Wilson de que a Áustria tinha mais culpa que a Alemanha na guerra, Wilson tinha uma esposa americana, assim como . Churchill então desempenhou um papel menor, mas sua mãe era americana. Sonnino, a mãe do ministro das Relações Exteriores italiano, no entanto, não era americana, mas britânica, e se tornou anglicano.
[74] Quando o exército francês durante as Guerras Napoleônicas invadiu o Tirol, eles declararam solenemente: “Nós trazemos liberdade, quer você queira isso ou não!” Divertido quando se percebe que desde o final do século XIV os tiroleses tinham um Landtag onde todas as quatro propriedades de terra foram representadas e todos eles tinham igual poder.
[75] A França recebeu, entre 1814-15 o enclave papal de Avignon e também se juntou à Santa Aliança. (A Grã-Bretanha logo depois saiu).
[76] Em Lucerna, pode-se admirar o “Leão Moribundo” de Thorvaldsen, erguido em memória dos mercenários suíços que morreram lealmente a serviço de Luís XVI nas Tulherias. Eles foram massacrados até o último homem.
[77] A rendição de Breda, pintada por , pode ser vista no Prado de Madrid. A pintura mostra “Cavalheiros a Moda Antiga” em uma cerimônia belíssima. Essa “Moda Antiga” ainda existia na Primeira Guerra. O filho daquele grande traidor, Thomas G. Masaryk, serviu no Exército austro-húngaro até o fim da guerra como capitão hussardo, que havia dito ao coronel que nem ele nem seus colegas oficiais sequer mencionaram as conhecidas atividades de seu pai. “Estava muitas vezes na ponta da língua”, respondeu o coronel, “mas, é claro, nós nunca fizemos isso”. Isso foi relatado por Indro Montanelli. Alguém poderia imaginar algo semelhante em um exército ocidental? (“Culpado por associação” é um termo totalmente desconhecido em uma civilização personalista).
[78] Quando a Casa Real Britânica mudou seu nome de Saxe-Coburg-Gotha para Windsor para agradar o querido povo, Guilherme II comentou: “Crianças, da próxima vez que formos ao teatro veremos as ‘Alegres Mulheres de Saxe-Coburg-Gotha’”. O príncipe Charles é membro de facto da Casa de Sonderburg-Gluecksburg-Augustenburg, também conhecida como Windsor. Afinal, seu pai nasceu príncipe grego — sem uma gota de sangue grego.
[79]Afonso IV, rei de Castela, casou-se com a filha de um príncipe marroquino que estava preso, do qual descendem todas as casas soberanas da Europa. Correspondendo a membros das dinastias europeias, o rei Hassan II de Marrocos e seus amigos o chamam de “primo querido”.
[80] O ancestral hebreu é Pierleone, irmão do antipapa Anacleto II, o “papa do gueto”.
[81] Por Otto Forst de Battaglia, Das Geheimnis des Blutes (Viena: Reinhold, 1932), pp. 45-46, temos a informação de que Guilherme II e George V da Grã-Bretanha também tinham Genghis-Khan como ancestral comum.
[82] Elena da Espanha, esposa de Afonso XIII e neta da Rainha Vitória, era originalmente anglicana; Astrid, a esposa de Leopoldo III da Bélgica, uma princesa luterana da Suécia; a atual rainha da Espanha é bisneta de Guilherme II.
[83] Napoleão III ficou ofendido, pois Nicolau I havia o tratado apenas como “Querido primo”. Naquela reunião em Kassel, Bismarck falava um francês impecável, enquanto Napoleão III tinha sotaque alemão, tendo passado sua juventude e anos de estudante no exílio alemão. (Eu falava francês com sotaque italiano).
[84] Na disputa entre Guilherme II e Bismarck, que levou à demissão deste último, a “questão social” desempenhou um papel importante. O imperador foi enfim mais empático com a ideia do Estado Provedor, favorecendo uma legislação mais social.
[85] A invasão do etnicismo no sentimento dos monarcas ficou evidente quando, em 1916, a Imperatriz Alexandra recebeu em audiência uma jovem condessa austríaca, Kinsky, enviada pela Cruz Vermelha para inspecionar campos de prisioneiros russos. Pensando que sua visitante (devido ao seu nome) se sentia uma tcheca, ela perguntou-lhe: “Você gosta mesmo desses alemães, minha filha?” Mas a condessa se enrijeceu e respondeu: “Estes são nossos aliados, Majestade!” Em seguida, a imperatriz imediatamente se desculpou por seu faux pas. Confira, Nora Graefin Kinsky, Russisches Tagebuch (Stuttgart: Seewald, 1976), p. 87.
[86] Não está claro se a culpa por não salvar Nicolau II e sua família é de Lloyd George ou de George V, ou de ambos. Eles ainda viam nele, sabendo de seus esforços para a paz, um “traidor”. Guilherme II estava desesperado por não poder fazer nada por eles. Quando a ala “bolchevique” dos social-democratas assumiu o controle, o destino da família imperial já havia sido selado.
[87] Os monarcas geralmente percebiam que, se tivessem nascido a algumas quadras do palácio real ou imperial, nunca teriam sido soberanos. Eles também não podiam alegar que seu cargo se devia à sua inteligência, coragem, intuições ou qualidades superiores. Daí a megalomania muito mais desenvolvida dos líderes populares, especialmente se eles não fossem religiosos. (O ditado de , “O poder tende a corromper, o poder absoluto corrompe absolutamente”, só é válido para pessoas não religiosas. Carlos V, em cujo reino o sol nunca se punha, era um verdadeiro santo em comparação com Rufino Barrios, o tirano ateu da Guatemala, ou com Lenin, Stalin, Mao ou Hitler).
[88] Hoje, os monarcas têm valor meramente simbólico, seus casamentos não desempenham mais um papel político e perderam parcialmente seu caráter internacional. Ainda assim, é significativo que a realeza sueca tenha permissão para casar com não-realezas, desde que o parceiro seja estrangeiro. No entanto, a presente lei de sucessão é claramente “antidinástica”: uma filha pode preceder um herdeiro homem. Assim, o nome da dinastia torna-se fictício, como o dos “Windsor”.
[89] Na Idade Média, os monarcas europeus estavam muito sujeitos às Constituições. Havia o princípio do rex sub lege. Ver Fritz Kern, Gottesgnadentum und Widerstandsrecht im fruehen Mittelalter (Leipzig: Koehler, 1914). O direito à rebelião sobreviveu na Europa pós-reforma. O jesuíta Juan de Mariana ensinava: Justum est necare reges impios (Justo é negar o governo dos ímpios). Para Calvino, um monarca monstruoso era: un ire de Dieu, a quem se devia sofrer com paciência. Lutero ensinou da mesma maneira. De acordo com Fernando d’Antonio, Tomás de Aquino considerava o tiranicídio no curso de uma rebelião geral (ver seu Il tirannicidio nel pensiero del Acquinate, 1939). Quanto à “graça de Deus” — tudo o que somos é devido à graça de Deus.
[90] Quanto à impossibilidade de uma política externa sólida em uma era democracia, confira meu artigo “Foreign Policy and Popular Will”, Chronicles (junho de 1998). As democracias são meros carrosséis.
[91] Confira, Hans-Hermann Hoppe, “Time Preference, Government and the Process of De-Civilization: From Monarchy to Democracy,” in The Costs of War: America’s Pyrrhic Victories, editado por John V. Denson (New Brunswick, N.J.: Transaction Publishers, 1997).
[92] Todas as guerras dos Estados Unidos após 1945 foram profundamente afetadas pelo processo democrático — na Coréia, no Vietnã e até no Golfo Pérsico. O mais surpreendente foi o caso do Vietnã. Confira Leslie Gelb, The Irony of Vietnam: The System Worked (Washington, D.C.: Brookings Institute, 1978). A mensagem deste livro, de um autor de esquerda, é revelada pelo título: a ironia está no fato de essa vitória do comunismo ter sido ao mesmo tempo uma vitória da democracia, e o sistema funcionou porque a opinião majoritária forçou a Casa Branca, o Pentágono, e o Congresso a “desistir”. Assim, 56.000 homens morreram totalmente em vão. Que a vitória poderia ter sido conquistada é provada no livro do dissidente vietcongue coronel Bui-Tin, Following Ho Chi Minh: Memoirs of a North Vietnamese Colonel (Londres: Hurst, 1995). Tudo devido a erros do topo? Lembremos do capítulo oito, volume I do The American Commonwealth, de James Bryce, intitulado: “Why a great man cannot be elected President of the United States”. Isso se deve apenas em parte à pirâmide invertida, uma vez que os meio-educados quase alcançaram o topo original.
[93] Tenhamos em mente o fato de que as democracias se gabam de sua instabilidade e de sua aversão por especialidades. O verdadeiro “herói” no folclore democrático é sempre o “amador de sucesso”, não o especialista, o que prova que o conhecimento e a experiência não têm valor.
[94] Os sultões da Malásia elegem um homem entre eles, durante os próximos cinco anos, o “Yang di-Pertuan Agong” ao poder. Ele é chamado de “Sua Majestade”, o título e a posição da pessoa que dirige. Em um belo dia, a União Europeia será um enigma.
[95] Monarcas europeus ainda são para-raios psicológicos, evitando que “líderes populares” assumam o poder absoluto. Isso funcionou até no caso da Itália, onde um rei, em uma grande emergência, conseguiu colocar um ditador em uma ambulância e despachá-lo para o topo de uma montanha. Ainda assim, até onde vão os problemas de uma “monarquia constitucional” foi mostrado na Bélgica, onde um rei abdicou temporariamente para não assinar uma lei fundamentalmente imoral. Ele foi então chamado de volta pelo parlamento.